Page 21 - Revista da Armada
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NOS 180 ANOS DO HOSPITAL DA MARINHA

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             Acontece com frequência, o pessoal pertencente à Armada
          interrogar-se quanto às origens do nosso Hospital.  Depois de
          realizar um  trabalho de  pesquisa, penso ter encontrado dados
          que possam, de certo modo, satisfazer lal curiosidade.
             Tanto quanto se sabe, o Hospital da Marinha, até 1806, ocu-
          pou umas velhas casas existentes na Rua do Olival a Alcântara,
          próximo do Hospital da Corte.  Mais tarde foi  transferido para
          o Desterro, para um velho convento pertencente aos frades Ber-
          nardos, convento este que foi secularizado por ordem do mar·
          quês de Pombal. Estas instalações eram muito precárias.
             Apesar da precaridade das supracitadas instalações, aI per-
          maneceu até 1806, data em que nos aparece o primeiro tItulo de
          baixa ao Hospital Real.
             O decreto que manda edificar O Hospital data de 1797, e a
          sua fundação faz parte dum plano de reorganização geral da Ma-
          rinha, efeclUada nos fins do século XVIII, e que em grande parte
          se ficou a dever ao então secretário de Estado de  D.  Maria I,
          D.  Rodrigo Domingues António de Sousa Coutinho, conde de
          Linhares.
             Segundo investigações levadas a efeito, sabe-se que no local
          ocupado pelo actual edifício existia o convento de S.  Francisco
          Xavier, fundado pelos jesuítas, o qual, depois da sua expulsão
          do reino pelo marquês de Pombal (decreto de3 de Setembro de
          1759), foi adaptado a asilo de mulheres, designado por Recolhi-
          mento do Castelo e conhecido também por Hospício dos Jesuí-
          tas.
             Este hospfcio, ao Paraíso, era uma construção de dois anda-
          res, um dos quais parcialmente subterrãneo, com as janelas à al-
          tura da rua, embora ocupasse uma área relativamente grande.
          As instalações, porém, deviam ser reduzidas, já que existia ao
          longo do edifício, a leste, uma igreja, todo o centro era ocupado
          por um pátio, e os terrenos virados para o Tejo davam lugar a
          uma horta, donde as mulheres, aí asiladas, recolhiam produtos
          hortícolas que contribuíam para o seu sustento.
             Aqui estiveram até 1797, sob administração do conhecido in-
          tendente-gerai da Polícia de D. Maria I, D. Diogo Inácio de Pina   Um dos painéis de azulejos (o OUlro é reproduzido na capa) ais/en/e no
          Manique. Por ordem do ministro Sousa Coutinho, de 6 de Julho   d/rio da entrada principal do Hospi/al da  Marinha,  onde se vi o dr.  Btr-
          desse mesmo ano, tiveram de abandonar o edifício e  procurar   nardinoAnl6nio Gomes (Filho), prtsiden/tdo ConselhodtSaríde Naval
          outras instalações, para que fosse executada a nova construção   t  director do  Hospital, a assinar O dtspacho que organiza o Serviço dt
          e nascesse o Hospital Real da Marinha, sólido, cómodo e sadio   SarídedaArmadat Ultramar(1833/47).
          (segundo o autor desconhecido do projecto), para a época ... cla-
          ro!
             A ordem do ministro foi  rapidamente executada e o edifício   este empréstimo isento do pagamento de décima ou qualquer
          foi entregue poucos meses depois.                   outro imposto.
             A rainha D.  Maria I, por alvará de 27 de Setembro de 1797,   Dois anos mais tarde, em 12 de Janeiro de 1800, devido a di-
          mas assinado pelo seu  filho , príncipe  D.  João, destinou  para   ficuldades  do tesouro, as obras do  Hospital  foram  mandadas
          Hospital Real da Marinha o citado hospício, o qual viria a ser   suspender, e só graças à grande influência do secretário de Esta-
          incorporado na  nova construção.  Este facto histórico pode ser   do, Sousa Coutinho, junto do príncipe regente, elas prossegui-
          observado num  dos medalhões de azulejos existentes à di reita   ram, verificando-se no decurso da construção que, pelo progres-
          de quem entra na sala do Príncipe, o qual daria um belo motivo   so da obra do referido Hospital, era evidente que aquele capital
          para a capa de uma futura «Revista da Annada». Detenninava   era insuficiente para ombrear com a sua despesa. Por tal motivo,
          este decreto que no sitio se erija um edifldo com to(ÚJs as acomo-  foi o empréstimo primitivo ampliado para 215 mil cruzados, por
          dações para o mesmo fim e com as que são necessárias para o es-  alvará de 2 de Setembro de 1801. Supõe-se que as obras do edifi-
          tabeledmenlo de um Laboratório Chimico e Despensório Forma-  cio tenham tenninado em 1806, ano em que começou a funcio-
          clutico de que possam aprevisionar-se não só o mesmo Hospital,   nar.
          mas a sua Armada Real e ati os Hospitais Reais dos seus domi-  Facto curioso é que o Hospital da Marinha era o único cons-
          nios Ultramarinos.                                  truido para esse fim, pois todos os outros não eram mais que
             Já na época, a situação financeira do reino não era famosa.   adaptações de antigos conventos -  é o caso de S.  José, Capu-
          Por tal motivo, mandou o então príncipe regente, D. João, con-  chos, Arroios, etc.
          trair um empréstimo de 150 mil cruzados ao juro de 5 por cento,   O edifício, visto do Largo Dr. Bernardino António Gomes
          que foi  rapidamente coberto por seis comerciantes da praça de   (Pai), ainda hoje se mostra majestoso e imponente. Daí podem
          Lisboa:  Jacinto  Fernandes  Bandeira, José  Pinheiro  Salgado,   admirar-se o seu frontão triangular. ladeado de dois pináculos
          Manuel Joaquim Jorge, José Caetano Monteiro, João António   encimados por pinhas; no ângulo superior, pode ver-se um belo
          de Amorim  Viana e Miguel Lourenço Peres.  Para pagamento   escudo real sobreposto a duas âncoras cruzadas com as respecti-
          deste juro e amortização do capital, determinava que ficassem   vas amarras, e suspensa, uma cruz de Cristo. O escudo é orna-
          cativos 15 mil cruzados da renda da Alfândega de Lisboa. Por   mentado com palmas, ramagens e floreados, denunciando o es-
          tal gesto ser considerado um benefício para a fazenda real, era   tilo barroco que imperava na época.

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