Page 77 - Revista da Armada
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Nota de Abertura
Tamanha nau, tamanha tormenta
ortugal comemora os Descobrimen- não iam enjoados, claro, um magnifico espec-
tos ... uma história verdadeira que mais táculo. pelo bailado que fazíamos sobre as va-
P parece um conto de fadas! gas, deixando à vista à medida que elas iam
Numa época em que se acreditava ser o passando, alternadamente a metade do casco
mar povoado de monstros, assolado por per- de vante e de ré, neste último caso com os hé-
manentes e terríveis temporais, contendo lices a rodar em secol E acrescentou, a termí-
cada onda o seu mistério. tudo conjugado nar. que o patrulha JIlais parecia um golfinho
para sepultar DOS seus abismos os que nele se executando as suas costumadas acrobacias e
aventuravam, os Portugueses, de tanto o brincadeiras aquáticas ...
olharem como a única via para a sua expansão
e desenvolvimento. perderam-lhe o respeito e *
meteram-se por ele adentro.
E, pouco a pouco, e indo cada vez mais lon- E cheguei ao ponto que desejava.
ge, constataram que. com coragem, muitos O nosso navio, construído em aço, era pra-
sacrifícios e fé em Deus. eram capazes de o ticamente inafundável, estava equipado com
dominar. E aprenderam. também que ele não a mais modema aparelhagem de navegação
era s6 o papão que se julgava, mas também -radar, agulha girosc6pica, sonda eléctrica,
o camjnho para estabelecer contactos e con- radiogoniómetro, etc. -. tinha dois motores
vivência com os outros povos da Terra. de alta potência, câmaras frigoríficas. ventila-
ção interior, eficiente serviço de comunica-
* ções e de segurança ...
E tudo isto nos faz pensar, com orgulho, e
A minha prática de mar ensinou-me mui- admiração, nos tais marinheiros dos Desco-
tas coisas e, entre elas, que os temporais são brimentos.
maiores ou menores conforme os navios em Em frágeis e pequenas embarcações de
que os afrontamos. Nos pequenos, como são madeira -as caravelas tinham aproximada-
em geral os da nossa Armada, ondas que mente as dimensões das antigas fragatas do
parecem verdadeiras montanhas de água, Tejo-, usando métodos de navegação mais
tomam proporções mais reduzidas quando que rudimentares, vivendo a monte em aloja-
vistas de bordo de navios grandes. mentos pouco arejados e sem o mínimo con-
Um dia. navegava dos Açores para Lisboa, forto, comendo alimentos rançosos e com bi-
num pequeno patrulha e debaixo de mau chos e bebendo água choca, racionados ainda
tempo. A certa altura apareceu pela proa e por cima, com perigosas fainas de velas, dia
navegando a rumo contrário um navio mer- e noite. contraindo doenças que os dizima-
eante que, não sendo grande, tinha, mesmo vam, sem saber o que iam encontrar no cami-
assim. mais de dez vezes a tonelagem do nos- nho. esperando sempre opior ...
so. Cruzáma-nos, reduzindo ambos a veloci- Que Grandes Homens e que Grandes Ma-
dade para nos saudarmos como companhei- rinheiros!
ros do mar. Depois, lentamente, foi ficando Curvemo-nos, todos os portugueses, ma-
para trás e desapareceu no horizonte. rinheiros ou não, perante a sua memória e
Dias passados, já em Lisboa, encontrei o reconhecidamente agradeçamos o muito que
respectivo comandante, um homem simpáti- fizeram por esta nossa Pátria, tão amada.
co que tinha muitos amigos na Armada, e fa-
lámos sobre o nosso encontro no alto mar.
Disse-me então que nós tínhamos proporcio-
nado aos passageiros do seu navio, os que
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