Page 163 - Revista da Armada
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As conchas marinhas




                                      Ex-/ibris dos Oceanos





          Desde tempos imemoriais que os moluscos
          tem um papel significativo no quotidiano
          dos povos. Desde logo, naluralmente, como
          recurso alimentar, património que ainda
          hoje gostosamente disfrutamos. Por outro
          lado as, "conchas" que os protegem, sempre
          fascinaram o Homem que ao longo de
          sucessivas gerações as utilizou largamente
          na satisfação das suas necessidades básicas
          e culturais. Usadas como ferramenta ou
          adorno, matéria prima de artesãos e
          indústrias, foram também fonte de
          inspiração artística, simbolo de cultos
          religiosos, tema de coleccionismo, moeda
          de troca e até, na Grécia Clássica, serviram
          como "boletim de voto". Assim, pelas
          potencialidades evidenciadas, as "conchas"
          marinhas são natural ex-libris dos Oceanos
          na sua ancestral relação com o Homem.

                coleccionismo de con·  os primeiros estudos zoológi-
                chas surgiu  na  infân-  cos da  2'  metade de Setecen-
          Ocia  das civilizações e  tos com  Adanson, Rumphius,
          tem  registos  históricos  remo-  Martini, Poli e outros.
                                                                figurII l
          tos: já  no séç.  l[ AC. Lac1ius e   Na  origem dessas  magnifi-  Canchos p 6ticos: do Mediterrâneo 00 Mor de TimIK
          Seipio,  cônsules  romanos,  cas colecções esteve o trinó-
                                                                1 - Bn/III primlm5 (GmelinJ. Nmnçãu dt Pim, Purtugal.; 2 - Harpa doris (&di"g).
          colecionavam conchas exóti-  mio  coleccionador comer-
                                                                Umlldn. AlIgma; J  • MOrlllll dtnnisoni (RMY).  krift, BrllSil.; 4 - Eglisia 5pilll/11
          cas,  passatempo  ii  que atri-                       /Sowrrhy).  Golfo da  Gllinf.; .i  - Cyprlltlt fui/Dili  /SoU'trhy).  Inhamhllnr,
          buiam um  notável efeito anH-                         Ml1ÇIllllbique.; 6 - Eulhru rolan; (roll Cosd) Sta.lJciz, Caro Vtrdt; 7 - PlroroplOC/l
          stress.                                               pi~iclI (RtM>r).  Gaa.  CoslIl  do  Mlilllbar.; S - HarptOlll  KuroidQi (Ka-.l.'Jlmura).
           No séc. XVI os  Descobriml'll-                       Maow, MIIr da Chillll; 9 - T trrmIflhia duprtyat (EmmonJ. MIIT dt Timur.
          tos  Marftimos  Portl/gueses  e
          subsequente expansão Ibérica.                       ciante-natu ralista  amador,   A  nomenclatura zoo-botã-
          viabilizaram  o contacto direc-                     representado  por  homens  nica  até à adopção da  siste-
          lo entre povos e culturas dis-                      como Johan  de la  Faille  e  mática  Lineana  era  uma
          tantes que se irá ampliar com                       Albert  Seba.  O  último,  ao  "Torre de Babel".  Nomes de
          os  impérios comerciais  da                         ~er\'i ço da  Companhia  das  raíz popular ou erudita sobre-
          Holanda e Inglaterra. O gosto                       lndias  Holandesas,  realizou  punham-se conforme o idio-
          pelo exótico invade a Europa.                       várias  viagens  ao Oriente  ma  ou  as tradições locais, na
         Surgem  numerosos "Gabine-                           onde adquiriu fortuna  e con-  designaçáo da  mesma  enti-
          tes de Curiosidades Naturais"                       tactos  que  lhe  permitiram  dade. Devemos ao naturalista
         onde, entre corais,  bezoares,                       reunir a mais célebre colecção  Carl  von  Linné, com  a sua
         minerais e dentes de tubarão,                        de conchas da época. Em 1734  obra "Systema  naturae", em
         figuram em  destaque as  dis-                        iniciou  a publicação da  des-  meados do séc.  XVIII, a cri-
         putadas conchas marinhas.   figura 2                 crição e iconografia  das  rari-  ação das bases da  sistemática
          Nesta  fase  pré-científica  do                     dades nela  existentes.  O 3~  modema.
         coleccionismo  naturalista so-  COIJUS ctJU/Hllli LiI/fll  1767. - Es/a   volume com 116 belas gra-  Cada  "espécie"  referência-
                                     ·CUr/(ha",  orill llda  das  "fI/dias
         bress.1i  a preocupação estética   Ckidtll/ais· gv:mll,  1111  1)«11, fama   vuras trata das conchas e out-  da  terá  um  " B.I."  em  que
         e a ostentação do  "status"   dr  illuudirr/ rllridadr.  D. Jooo  V,   ros anima is  marinhos.  Esta  consta, além  do "apelido e
         conferido pela  posse de tais   (III  1731, adqlllrju  pr/II fllhllloslI   obra,  "um  dos clássicos da  nome", a identidade de quem
         raridades.                  somll dt  1010  Ji/tr1l5 frllllCtsi/5  11111   conquiliologia"  foi, anos mais  fez  a descrição e respectiva
                                     tl'tnll>illr da tlll'Itrt rolrrção df fCJIIIIII
           É contudo no recheio da-  dt III Faillr (Haia).    tarde, utilizado por Lineu nos  data.  Por ex.:  COUIIS cedo11l/11i
         queles gabinetes que incidem                         seus estudos.             Lil1el/; 1767 (Fig. 2)   ,
                                                                                          REVISTA OAARMADA •  MAIO 96  1 7
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