Page 266 - Revista da Armada
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capturado, era já tu cá tu lá, amigo Sebastião que se entitulava N guer_
rilheiro", mas pouco ... segundo nos segredou que por várias vezes
não tinhamos sido atacados pelos "guerrilheiros" porque, quando
viam um agrupamento progredindo com grandes intervalos entre
homens, era sinal de experiência de tropa perigosa e evitavam-na em
detrimento dos Hmaçaricos", novatos acabados de chegar, que
andavam agrupados muito juntos, inexperientes e ainda nervosos,
como seria de esperar.
Durante toda esta actividade operacional nasceu um confronto tác-
tico na organização de combate dos "páras" e dos Nfuzos", aqueles
com as suas "esquadras" estes com as suas ·'equipas". O confronto,
teórico como é evidente, pois a camaradagem entre Npáras" e "fuzos"
foi sempre excelente, foi mesmo elogiado pelos altos Comandos
ainda NParafuso Grande", que dias após o assalto ao "quartel turra" de como exemplo. Começou logo a primeira operação conjunta, a de S.
Magina se deu um episódio curioso. Salvador, e veio a aumentar com a continuidade. Os "páras" usavam
O referido quartel era atravessado por um rio, afluente do as suas esquadras de quatro ou cinco elementos, os fuzos contra-
M'Bridege, com cerca de dois ou três metros de largura, profundidade punham com as equipas de 3 elementos.
média de um metro e margens de cerca de um metro acima do nível Os páraquedistas argumentam que as esquadras tinham duas van-
das águas. Devido a estas caraderísticas, quanckl do assalto ao quartel, tagens: a primeira era a adaptação à lotação dos transportes Heli. A
muitos dos elementos "turras", no meio da grande confusão gerada, segunda seria a possibilidade duma vigilãncia e observação do ter-
tentaram abrigar-se dentro de água e na protecção dos taludes da reno numa amplitude de 360°. Os fuzileiros com as equipas de 3
margem, mas tal não resultou e acabaram !XX ser abatidos. homens teriam uma adaptação correcta aos ootes, pois mais de 3
Ao alvorecer do sexto dia da operação "Parafuso Grande", como homens atrapalhavam-se uns aos outros, tornando a acção de fogo
continuava a chamar·se, na sanzala da Magina onde acantonávamos, perigosa para os elementos de vante da sua guarnição. Por outro
situada num pequeno planalto a cerca de 150 metros do quartel lado, em terra as acções de "fogo e movimento" são de difícil sin-
destruído, fomos sobressaltados por várias rajadas de G3 vindas cronização, devido à dificuldade de comando de três elementos
daquela direcção. Corremos de imediato para lá, e deparámos com os (equipa) quanto mais de cinco (esquadra). Quanto à progressão no
nomens da equipa de fuzos e da esquadra de páras, de vigilância noc-
turna à zona, gritando com ar admirado: "eles estavam vivos, eles
estavam vivos, eu vi-os respirarem". Que se passara afinal?
Quanckl os "turras~ foram abatidos, alguns ficaram com a cabeça
mergulhada na água e ao fim de uns dias os gases da decomposição
orgânica interior começaram a libertar umas oolhinhas de ar pelas
bocas e narinas mergulhadas e foram estas que, num ambiente um
pouco tétrico, tanto impressionaram aquele pessoal para quem os "tur-
ras" morreram duas vezes ou ainda, como dizia "a maha~; os "turras"
foram remortos.
Além das missões conjuntas e de rotina do Plano Ferrolho, efectua-
ram-se diversos reconhecimentos e batidas, tendo-se verificado um
encontro com elementos inimigos nas ilhas do BULlCOCO e dos
H!POPOT AMOS, do qual resultaram algumas baixas entre os terroris-
Operaç.lo de limpeza ii um i1GJnlp.lmenlo lN
tas, depois de um ataque que fizeram com armas automáticas a um
bote de borracha que se atrasara numa muBa. Foi nesta operação que terreno as equipas de 3 desvinculadas da rectaguarda são muito mais
o "célebre" chapéu verde tirolês, que ficara a flutuar, passou da agressivas e ofensivas, o que era afinal o objectivo (não podia, de
cabeça dum chefe dum lado para o comandante do outro, que pas· forma alguma, haver preocupações defensivas, tendo este sido um
sou a usá-lo sempre que actuava naquela área. dos temas mais importantes do curso).
Nesta altura recebemos da metrópole umas caixinhas cromadas, Fundamentalmente, as grandes diferenças (e vantagens) das equipas
individuais, com excelente apresentação e jXluco maiores do que um sobre as esquadras 5..10 duas: a primeira de âmbito orgânico -a equipa
maço de cigarros. Tratava-se de soro anti-ofídio. - com as sua mais simples composição, facilita a chefia e sobretudo o
Na primeira operação que se seguiu, após o briefing habitual, o controlo de 2/3 homens em movimento ofensivo, comparada com a
Destacamento formou e as caixinhas foram distribuídas por tooos, tremenda dificuldade de o fazer com 4/5 elementos; e mais se acentua
para grande gozo geral; o cromado não era de todo indicado para o tal diferença, quanto menor for o seu nível profissional. A segunda é o
mato, mas seria um tom agradável e oonito no Terreiro do Paço ou facto de o curso ter como objectivo principal a criação da unidade
em Santa Clara, onde o reflexo do sol nas belas caixinhas não colo- operacional -o Destacamento -que era estruturado antes do início do
caria estas vidas em perigo. curso, sendo o indivíduo combatente tratado como elemento do con-
Pouco depois de iniciarmos a progressão no mato verificámos que, junto_ O fado de se lidar com militares profissionais, o nosso caso,
ao contrário do costume, o pessoal não tirava os olhos do chão, constitui também uma vantagem dos "fuzos".
como também não progredia com o habitual à vontade, já tão carac- Entretanto, esta organização experimentada e provada foi alterada
terístico do D1 FE. a partir do quarto ou quinto ano de Guerra do Ultramar, individua-
Não foi difícil resolvermos o problema: eram as cobras, só se pen- lizando o curso que deixa de preparar unidades para o fazer ao indi-
sava nelas! Principalmente as cuspideiras, de que já houvera uma víduo, ao contrário do que ainda hoje acontece nos "Comandos" das
desagradável experiência numa das primeiras operações "Parafuso", várias Marinhas. Qual a real razão desta mudança? Não sabemos
(jXlr acaso a estas, a oonita caixinha não se aplicava!). Era a lógica do mas palpita-nos.
desconhecido e, como para grandes males grandes remédios, a No entanto, nas operações que realizámos na ZIN, intervaladas com
solução foi simples: recolheram-se as caixinhas. Como por magia, as as do Zaire, fomos sempre fiéis à orgânica característica das "Troops"
cobras desapareceram ... das cabeças dos fuzos e se calhar do mato ... e sempre resultou. O
Pelo menos, nunca mais ninguém as viu e tudo voltou à rotina nor" (ConlinUillIO próximo número)
mal e isso era fundamental para a nossa segurança. Henrique C. Metzener
Como viemos a confirmar por um prisioneiro que, horas depois de CMGREF
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