Page 298 - Revista da Armada
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Na actualidade é impossível prever o desen-  - O caos estratégico conjuntural que permi-  para que as suas forças cumpram da melhor
         volvimento do conflito para o qual nos prepa-  tiu a relevância das operações de paz é um  forma a respectiva missão, os estrategas ter-
         ramos. O objectivo, o meio, o tempo, a intensi-  fenómeno efémero, que esconde um sistema  restres necessitam de garantir o controlo das
         dade, o rumo e o contexto geral de qualquer  político internacional emergente, nítido  forças aéreas e navais, tarefa facilitada quando
         conflito são assuntos esbatidos e incertos. Daí  provavelmente nos próximos 15 a 20 anos,  assumem os cargos de comandantes conjun-
         que o planeamento estratégico deva ser flexível  onde a relação de forças entre os principais  tos. Os estrategas navais normalmente reagem
         ao ponto de contemplar um leque amplo de  actores será diferente da actual e os conflitos  mal àquele esforço, porque consideram a
         possibilidades que viabilizem a conduta de  retomarão, muito provavelmente, o seu ca-  acção das forças navais muito menos depen-
         guerra, isto é: a gestão de múltiplas situações  rácter clássico;     dente da ajuda exterior. Nesse contexto afir-
         estratégicas futuras. Para esse efeito, a generali-  - As forças terrestres dificilmente cumprem  mam, com algum radicalismo, que é possível
         dade dos países aliados adoptou como referen-  a sua missão por si sós. Cingido-nos  ao com-  conceber e empregar os meios navais sem a
         cial de planeamento estratégico, um conjunto  bate verificamos que: as forças aéreas travam  interferência dos outros ramos. Sustentam a
         básico de capacidades militares que enformam  duelos no ar e bombardeiam os seus alvos; as  sua argumentação dizendo que, desta forma,
         os seus sistemas de forças, definindo as suas  forças navais combatem no mar e podem  as respectivas forças  sempre cumpriram  bem
         características e dimensão em função dos inte-  estender a sua acção sobre terra, tirando par-  as missões atribuídas. Quando adoptam esta
         resses estratégicos (ambições e responsabili-  tido do armamento dos navios, dos meios  postura esquecem que a estratégia naval, co-
         dades) e das disponibilidades financeiras do  aéreos orgânicos e dos fuzileiros; as forças ter-  mo a terrestre e a aérea, são meios e não fins
         Estado. A partir dessas capacidades militares e,  restres, sendo essenciais ao desfecho do con-  da acção estratégica do Estado na prossecu-
         em presença de determinado desafio, é possí-  flito, necessitam não só de protecção dos flan-  ção dos fins fixados pela política.
         vel encontrar configurações concretas relativas  cos e da retaguarda mas, também, de infor-  A dicotomia entre os pensamentos estra-
         às necessidades operacionais e logísticas e, até  mações sobre a frente  e de apoio de com-  tégico terrestre e naval muitas vezes é referen-
         conceber as circunstâncias em que a probabili-  bate, tarefas onde as forças  aéreas e navais  ciada com alguma carga negativa entre os mi-
         dade ou o azar constituem a base de cada  são indispensáveis.         litares. Contudo, em nossa opinião, afigura-se
         plano de contingência para o emprego concre-  A anterior chamada de atenção para a  vantajosa porque estimula o pensamento e
         to da força militar. Prova evidente de que esta é  dependência das forças terrestres relativa-  permite assim ao Estado alimentar-se com os
         a aproximação possível ao planeamento  mente às  forças aéreas e às forças navais,  benefícios que a discussão proporciona. Na
         estratégico numa época de completa reestrutu-  sendo deliberadamente ostensiva, por um  realidade, nada parece  mais perigoso nem
         ração da ordem internacional, são as reformas  lado, contribui  para evidenciar a importância  duvidoso do que a receptividade pacífica de
         levadas a cabo nos países aliados em meados  da acção conjunta e, por outro lado, serve  ideias ou a prevalência de uma determinada
         da corrente década, sendo a mais publicitada a  para  clarificar o esforço contínuo que as es-  doutrina estratégica sobre as restantes.
         “Bottom up review” dos EUA.        colas de pensamento estratégico terrestre de-
           Para além do exposto, a argumentação dita  senvolvem no intuito de influenciar a organi-
         de base “clausewitsiana” também não tem em  zação militar dos Estados. A explicação é sim-  António Silva Ribeiro
         conta os seguintes factos:         ples: tendo como objectivo criar condições                        CFR
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