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A Certeza do Natal
                   A Certeza do Natal






              elebrar o Natal é encarnar Jesus Cristo nas nossas vidas. “Paz  Amor ao Próximo e à solidariedade para com o Irmão. De facto, na
              na terra aos homens que Deus ama”. É este o grito dos Anjos  actualidade é mesmo um problema de cultura e, consequentemente,
         Chá  dois mil anos em Belém.                         uma tarefa pastoral da Igreja.
           Preocupa-me a desmoralização, a marginalidade, os abusos da li-  Há cerca de um ano, li numa revista de actualidade religiosa que a
         berdade, os drogados, as crianças da rua, os idosos, a desresponsabi-  Esperança que inunda este tempo de Advento/Natal não é um
         lização, o abandono dos idosos, reformados, o desencanto perante a  sonho. Bem pelo contrário, “... é um estilo de vida, é um exercício do
         vida. Dir-se-ia que o futuro parece pouco riso-                     coração, porque se constrói no dia-a-dia,
         nho. Vivemos, para recorrer à famosa expres-                        enraízando e edificando a nossa vida na vida
         são de Weber, num mundo “desencantado”.                             de Jesus”.
           Só que Jesus nasceu. Numa manjedoura,                               Aproxima-se o NATAL.. O primeiro Natal
         mas nasceu e trouxe-nos a salvação, o céu a                         foi numa gruta na maior pobreza, sem luxo
         todos, mesmo aos que O rejeitam.                                    algum...
           A paz, a alegria, a libertação do pecado e do                       Natal será para todos quando quiserem. Jo-
         egoísmo são também o acolhimento de quem                            vens e adultos, adolescentes e crianças só terão
         tem uma cultura diferente, o dar oportunida-                        Natal quando deixarem nascer Jesus no seu
         des, o tomar partido pelo mais fraco, pelo mais                     íntimo, pobre, humilde, amigo, sábio, ombro
         pobre, pelo mais oprimido.                                          onde  se chora, bordão em que nos apoiamos,
           Aproxima-se o Natal. Todos os anos, nesta                         mendigo que ajudamos, doente que acari-
         altura, nos sentimos um pouco diferentes.                           nhamos, descrente que aceitamos, ignorado
         Crentes ou não crentes, começamos a preparar                        que descobrimos, mãe que revemos em nosso
         a noite mágica: para uns, celebração do nasci-                      nascimento, pai que aceitamos num dia dife-
         mento do Salvador, Deus feito homem, meni-                          rente, filhos cujas dificuldades e capacidades
         no, tão mais próximo de nós; para outros, qua-                      que entendemos, avós que veneramos...
         se tudo se resume à preocupação das prendas                           Natal será sempre que quisermos deixar o
         que há a comprar, de uma lista de obrigações;                       Menino balbuciar dentro de nós a Boa Nova de
         para quase todos, a consoada em família. É a                        Belém: Nasceu o Salvador.
         festa da família, diz-se. Que família? Para os                        Jesus também nasce hoje. ONDE ?
         mais afortunados, continua a ser o dia, por                           Olha à tua volta e procura... na tua casa, no
         vezes único no ano, em que verdadeiramente                          teu país, em Angola, em Timor, na Bósnia...
         se reúne a família: pais, irmãos, filhos, sobri-                      Por isso, chamar a atenção dos homens para
         nhos, primos, netos, avós. Certamente é uma                         as suas próprias limitações e incapacidades é
         reunião sob a luz da lareira, na aldeia. Na cida-                   hoje tarefa de quem se preocupa com o sentido
         de é mais difícil, não cabem todos, nem no Na-                      da esperança.
         tal, nem, muitas vezes, no resto do ano. Casas                        Se com o exemplo e a palavra aproximamos
         pequenas, famílias pequenas, melhor, parcelas                       os outros de Cristo, não permaneceremos
         de famílias, em que não há lugar para todos,                        indiferentes às suas necessidades corporais:
         muito menos para os idosos. Se não ficaram na                       tanta ignorância, tanta miséria, tanta solidão...!
         aldeia, tornaram-se itinerantes, passando de                        O Natal  do Senhor Jesus cumulará cada vez
         casa em casa, tipo “time-sharing” ao contrário,                     mais o nosso coração de misericórdia e de
         ou estão num “lar”, certamente porque já não têm lugar no nosso,  generosidade para compartilhar o muito ou o pouco que tenhamos.
         no seu LAR.                                          Se não estiver nas nossas mãos alcançar o remédio para os males que
           Natal para muitos,  é pois um Natal feito de subsídios, de árvores  afligem tantas pessoas à nossa volta, ao menos far-lhes-emos sentir o
         iluminadas e de algumas festas para as crianças. É assim, um Natal  calor da nossa amizade, do nosso empenho em ajudá-las. Em qual-
         frio, consumista e voltado sobretudo para os mais pequenos. Como  quer caso, juntemos os nossos esforços aos de outros cristãos e aos
         torná-lo diferente? Com gestos e atitudes mais significativas e pro-  dos homens de boa vontade, superando as posições partidárias que
         fundas. Porque o Natal sugere  valores importantes para a vida das  separam ou levam ao confronto.
         pessoas: amor, família, solidariedade, alegria, justiça. Como torná-lo  Todos nós vamos pelo mar da vida em direcção ao porto do nosso
         assim no mundo Militar? Remunerando com justiça, tratando com  destino. Aproveitemos o tempo presente para esquecer os agravos,
         amor, favorecendo a família e desenvolvendo laços de solidariedade.  os rancores, por pequenos que sejam, enquanto nos resta uma parte
         Numa palavra, fazendo Natal todo o ano. Nesta quadra, porque  da rota por percorrer. Descubramos os sinais que nos indicam a pre-
         estão todos mais sensibilizados, podem desencadear-se processos de  sença de Deus na nossa vida.
         solidariedade que mobilizem todos e se atenda a situações mais difí-  Natal é convite a descobrir o sentido profundo do tempo, pois é
         ceis e urgentes da vida de algum dos camaradas. O menino Deus  possível que ainda tenhamos pequenas dívidas pendentes: dívidas
         nascerá assim também na Família Naval...             de gratidão, de perdão, até de justiça.
           É preciso haver Natal para que a nossa esperança não seja vã.   Se o lavrador conhece bem a evolução do tempo, nós marinheiros,
           Vivemos sem a transcendência que a Encarnação do Verbo trouxe  temos de saber descobrir Jesus, Senhor da História, presente no mar
         à nossa carne.                                       da vida, no meio das grandes tempestades e no mar chão dos dias
           Cristo ao nascer trouxe-nos a grande lição da fraternidade e do  sem singradura.
         amor. Façamos dela a grande inspiração para a nossa maneira de  Então estaremos a fazer Natal... “é que o novo mundo alimenta-se
         estar no mundo, para a aproximação que teremos de fazer a quem  de mudanças concretas”.
         sofre, sobretudo às crianças e aos idosos.                                   CMG GRAD. Manuel da Costa Amorim
           O Natal, festa do nascimento do Filho de Deus, apelo veemente ao                                 Capelão

         4 DEZEMBRO 99 • REVISTA DA ARMADA
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