Page 73 - Revista da Armada
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Património Cultural da Marinha
Património Cultural da Marinha
Peças para Recordar
13. OHIDROAVIÃO FBA–UMA RELÍQUIA AERONÁUTICA
O Museu de Marinha possui uma relíquia aeronáutica, certamente a aeronave mais antiga existente
em Portugal. Trata-se de um hidroavião concebido, em conjunto, por franceses e ingleses antes da
Grande Guerra, e daí a designação F.B.A. – French British Aviation. Deverão restar somente três exem-
plares deste tipo de avião.
É um hidroavião de coque central, biplano, de madeira e lona, equipado com um motor em estrela
rotativo da marca “Gnome”, 100 CV de potência.
A Aviação Naval Francesa utilizou diversos aviões deste tipo em patrulha no Canal da Mancha, no
início daquela Guerra.
Durante a estadia de Sacadura Cabral em França, em 1916, após a obtenção do seu “brevet”, efec-
tuou um estágio em hidroaviões, tendo sugerido ao Ministério da Marinha a aquisição de dois aviões
deste tipo à Marinha Francesa, o que foi autorizado. Vieram encaixotados para Portugal, chegando no
início de 1917.
Uma vez desembarcados, foram expedidos para Vila Nova da Rainha, onde nessa altura foi esta-
belecida a Escola de Aeronáutica Militar, de que Sacadura Cabral foi o director do primeiro curso de pi-
lotagem. Foram então ali montados os dois hidroaviões F.B.A., que tinham os números de fábrica - 202
e 203. Em Vila Nova da Rainha os hidroaviões utilizavam o Rio Tejo para a sua operação, recebendo o
apoio logístico da Escola de Aeronáutica Militar. Sacadura Cabral levou a voar num desses aviões, em
Março de 1917, o Comandante Azevedo Coutinho, então Ministro da Marinha, o qual terá ficado entu-
siasmado com as possibilidades que as aeronaves ofereciam.
Quando foi decidido, após a criação da Aviação da Armada (Decreto nº 3.395. de 28SET1917),
instalar na Doca do Bom Sucesso o Centro de Aviação Naval de Lisboa, os dois hidroaviões F.B.A.,
pilotados pelos tenentes Azeredo e Vasconcelos e Pedro Rosado, descolaram de Vila Nova da Rainha e
vieram amarar no Tejo, em Belém, e entrar naquela doca, que passou a ser a sua base. Foi a 14 de
Dezembro de 1917, que pode ser considerada como a data do início real da Aviação Naval.
Os dois F.B.A.’s iniciaram de imediato a patrulha aérea das zonas de aproximação da Barra de
Lisboa, nas áreas em que se receavam o aparecimento de minas de superfície e de submarinos alemães.
Os hidroaviões colaboravam também com os submarinos nacionais. Porém, como os aviões não dis-
punham de TSF, as comunicações só se efectuavam após amaragem no mar ou após a chegada ao
Centro. Para suprir tal deficiência terá sido montado no F.B.A. 203 um transmissor de rádio.
Foi num desses aviões que Sacadura Cabral teve um acidente ao amarar, em Abril de 1918, sem
consequências para o piloto e o observador, ficando, no entanto, o avião bastante danificado. Terá sido
na sequência desse acidente, que, em Julho de 1918, com os recursos das oficinas do Centro, se re-
constituiu um avião híbrido, com a coque do 203 (2) e as asas do 202 (1), o qual ficou com o número 2
pintado na coque.
Com o fim da guerra e a chegada de novos aviões, o F.B.A. deixou de voar e, por felicidade, foi
mantido no hangar do Bom Sucesso. Participou, com o “Santa Cruz”, na Exposição Internacional de
Aeronáutica, de 1935, passando depois a pertencer ao património do Museu de Marinha, até que final-
mente pôde ser recolhido, em 1962, no Pavilhão das Galeotas, onde se conserva.
O valor deste avião em termos de construção aeronáutica é idêntico, se não superior ao do “Santa
Cruz”, e tem o mérito de ser o primeiro aparelho da Aviação Naval e, actualmente, como disse acima a
aeronave mais antiga existente em Portugal.
Felizmente o Museu de Marinha, na sequência do excelente trabalho de restauro do “Santa Cruz”,
empreendeu também o restauro do F.B.A., devolvendo-lhe a sua integridade, ameaçada pela decrepi-
tude da sua proveta idade de oitenta e três anos.
Museu de Marinha
(Texto – A. Cruz Júnior, VALM)