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“História da Marinha Portuguesa”
(Homens, Doutrinas e Organização 1824-1974)
Professor António José Telo faz, conhecer, ou a reconhecer, a esta-
O neste volume da “História da belecer a relação de causa a efeito.
Marinha Portuguesa”, uma abor- Ora isto fica bem, torna-se mesmo
dagem de desenvolvimento que, para necessário, é uma achega de alto
o comum do leitor, é a um tempo ali- valor, ser revelado na História da
ciante e surpreendente. Marinha, e aqui o deixamos expresso
como mérito, muito mérito, neste
Para quem está habituado a his- volume da autoria do Professor
tórias da História, onde quase sem- Doutor António José Telo.
pre se vai ao que é considerado es- O presente volume é apenas o 1º
sencial (numa História da Marinha, Tomo da parte de “Política e Estatís-
por exemplo, o essencial seria a lista tica” na área temática “Homens,
mais ou menos extensiva e pormeno- Doutrinas e Organização”, deixan-
rizada dos combates ou grandes fei- do-se para 2º Tomo, dentro da mes-
tos dessa Marinha), o Prof. José Telo, ma área, a “Dimensão Naval Portu-
neste (volumoso) volume não aborda guesa na Época Contemporânea”, a
sequer tal vertente, e, contudo, faz “Organização”, a “Legislação” e as
história. A História do como e do “Biografias”.
porquê, a História em que muitos
provavelmente nem cogitam, mas A “História da Marinha Portuguesa”
que explica muita coisa, quase tudo avança assim, no caminho notável
aquilo em que os muitos não tinham de dar à luz obras de mérito, que ne-
pensado. nhuma tentativa anterior ousara co-
São, com efeito, abordados factos meter. Está de parabéns a Academia
reais de feitos náuticos, de feitos da vida civil, política, li- de Marinha, que com esta obra nos valoriza e se valoriza.
terária, de ideias, de condução de um país em época de evo-
lução social acentuada, onde, em vez de combates, a Mari- Sousa Machado
nha, (ou os seus homens – vale o mesmo-) tiveram interferên- CMG REF
cia importante e... histórica.
Enquanto outros povos se iam dedicando a lutas pelo
domínio dos mares, Portugal que, por circunstâncias expli-
cadas, já não intervinha, como tinha intervindo, nas grandes
decisões de âmbito planetário, dedicava-se à consolidação
dos (seus) espaços, marítimos ou terrestres, à estabilização dos
(seus) governos, à preparação dos seus (nossos) valores in-
telectuais, e tantas outras tarefas que acabaram por dar à Ma-
rinha uma oportunidade de intervenção e de revelação de
capacidades que, apenas após tais estudos, se tem de con-
siderar como construtora de História.
Foi este jeito de análise, de estudo e observação que, abor-
dado, sistematizado, demonstrado ser tarefa histórica, ca-
bendo por isso inteiramente e com o maior rigor, na História
da Marinha, o Professor António José Telo colocou neste vo-
lume que, em boa hora, lhe foi confiado.
Tudo nele é metódica e rigorosamente explicado, com um
objectivismo perfeitamente histórico, isento de dialécticas ar-
tificiais ou especulativas, de arquitecturas conjunturais, feito
de teses, não de hipóteses. É, sem dúvida, um livro de mérito
fora do comum, que vem ajudar a esclarecer uma época sobre
a qual se avolumavam dúvidas e incertezas que iam sendo
transmitindas assim mesmo, entre autores e leitores.
A construção do Portugal contemporâneo, segundo agora se
revela, deve muito à Marinha, ainda que os combates navais
tenham escasseado. Era dado assente que após a independên-
cia do Brasil a nossa epopeia marítima tinha-se desvanecido
como fruto que desaparece aos poucos, mais podre que
maduro. E contudo, a Marinha permaneceu viva e actuante,
muito tendo a ver com o progresso que o País experimentou,
e ali, no livro, vem demonstrado.
Não significa isto que a Armada em si mesma possa registar
desenvolvimento e actuação em termos de feitos, que
excedam os da fiscalização da costa, da pesca, e da represen-
tação diplomática. Mas os seus homens, sim. Ficam-se-lhe a
dever muitas actividades de alto mérito que o livro nos dá a
REVISTA DA ARMADA • FEVEREIRO 2000 33