Page 16 - Revista da Armada
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Almirante Armando Ferraz
Almirante Armando Ferraz
Um Marinheiro Presente Nos Dois Conflitos Mundiais do Séc. XX
m dos mais distintos oficiais da Ma- de água e 4 remos
rinha Portuguesa na primeira metade para uma dezena
Udo século passado, Manuel Arman- de homens extrema- Foto Museu de Marinha
do Ferraz, nasceu em Lisboa em 19 de Abril mente diminuídos
de 1897 (1). fisicamente, consti-
Iniciou a sua carreira naval por ocasião da tuem a demonstra-
entrada de Portugal na I Guerra Mundial e logo ção do excepcional
em guarda-marinha foi louvado por ter perten- comportamento do
cido à guarnição do cruzador auxiliar “Gil Ea- jovem oficial.
nes” e posteriormente à do contra-torpedeiro Terminada a guer-
“Tejo”, durante o período de guerra (de Setem- ra e após breve perí-
bro de 1917 a Setembro de 1918) percorreu odo como oficial ás
zonas perigosas bloqueadas por submarinos ordens do Presiden-
inimigos dando comboios ao cruzador auxi- te da República, Al-
liar “Pedro Nunes” e a vários navios mercantes, mirante Canto e
serviço que foi desempenhado com o melhor Castro, foi prestar
resultado, pelo zelo, competência e disciplina serviço na Estação Na popa do “Augusto de Castilho”, o bote do navio, com sobreviventes do combate,
manifestados. Naval de Macau de largando para a sua viagem de 200 milhas. À direita o submarino alemão.
Seria cerca de um mês antes do fim do con- 1919 a 1925, tendo
flito que iria participar numa das páginas mais sido comandante da lancha “Macau” e, já colaboração prestada ao governo da colónia
marcantes da História da Marinha, ao notabili- como 1.º tenente, da canhoneira “Pátria”. de S. Tomé e Príncipe na adopção de medidas
zar-se pela bravura e energia com que condu- Regressado à Europa é comandante do que permitiram o rápido estabelecimento da
ziu o combate, que no dia 14 de Outubro de torpedeiro “Mondego” e posteriormente do tranquilidade no Príncipe sem perturbações
1918 teve lugar entre o caça minas “Augusto agrupamento de torpedeiros. Tinham apenas graves nem repressões violentas (aconteci-
Castilho“ do qual era imediato e o submarino passado dois anos da sua estadia no Extremo- mentos ocorridos de Abril a Junho 1932).
alemão que pretendia afundar o paquete “S. Mi- -Oriente e segue outra vez para o Ultramar, de Promovido a capitão-tenente, em 1933, no-
guel“ que aquele comboiava, não só auxilian- 1928 a 1930, desempenhando o cargo de Ca- vamente um comando no mar, o aviso de 2.ª
do o seu comandante na direcção do combate pitão do Porto de Moçambique. classe “Republica”, exercendo em acumulação
como depois da morte deste, tendo sido obriga- As suas permanências em terra são curtas, de Fevereiro a Setembro de 1935 funções de
do a abandonar o navio por falta de munições, volta aos navios, será comandante da canho- comandante da Estação Naval de Angola.
revelou inexcedíveis qualidades de comando, neira “Quanza” nos dois anos seguintes, cargo Desembarca em 1937 para ser chefe do
vastos conhecimentos e competências, conse- onde é louvado pela inteligência, valiosa e leal Departamento Marítimo de Angola. Serão
guindo conduzir a porto de salvamento, quatro anos de intenso e eficaz traba-
apesar de ferido e durante uma viagem lho, sendo louvado pelas qualidades de
de cerca de 200 milhas, numa peque- Foto Escola Naval trabalho inteligência e correcção revela-
na embarcação arrombada em que se dos e pela superior e valiosa colabora-
alojaram 12 sobreviventes quase todos ção que deu na execução do plano de
feridos, sem instrumentos náuticos, sem farolagem da costa e outras missões de
velas, quase sem mantimentos e água, as- serviço que foi chamado a desempenhar,
sumindo com o seu exemplo de energia e tendo-se tornado um prestigioso colabo-
trabalho constante, durante seis dias e seis rador deste Governo Geral e condecora-
noites, sem nunca esmorecer, a tripulação do com a Medalha de Ouro de Serviços
daquele frágil barco. no Ultramar.
Foi na ocasião promovido a 2.º Tenente Entretanto a II Guerra Mundial está no
sem prejuízo de antiguidade e condeco- auge e o capitão-de-fragata Ferraz, volta
rado com o 3.º grau da Ordem de Torre e aos navios. Será comandante do aviso
Espada, a Cruz de Guerra de 1.ª Classe e de 2.ª classe “Gonçalo Velho” até 1944
a Medalha de Ouro de Coragem, Abnega- e, após a promoção a capitão-de -mar-
ção e Humanidade. O soberano britânico -e-guerra do aviso de 1.ª classe “Barto-
agraciou-o também com a Distinguished lomeu Dias”, funções que exerceu até
Service Cross, uma das mais valiosas con- Abril de 1947.
decorações inglesas. Tinha começado a sua carreira no mar
É impressionante o relatório do guar- durante a I Guerra Mundial e está tam-
da-marinha Ferraz, (2), após a pequena bém no mar no Segundo Conflito Mun-
embarcação arrombada ter aportado em dial, exercendo o comando do Grupo de
20 de Outubro, à Ponta do Arnel, na ilha Navios que no Extremo-Oriente, além do
açoriana de São Miguel. Os pormenores seu “Bartolomeu Dias” integrou o “Afon-
do combate naval e a odisseia que se se- so Albuquerque” e o “Gonçalves Zarco”,
guiu, em que a bordo apenas dispunha constituiu as denominadas Forças Navais
de uma caixa de bolachas, uns pães, uma O Comandante Ferraz como Director da Escola Naval exortando de Recuperação da Soberania Portugue-
lata de atum, uma ancoreta com 15 litros os cadetes. sa em Timor, as quais aportadas a Díli em
14 JANEIRO 2004 U REVISTA DA ARMADA