Page 14 - Revista da Armada
P. 14

vai desde o código  Morse ao ASCII – Ame-  cia das duas guerras mundiais onde se co-
         rican Standard Code of Information Inter-  nhecem diversos casos de criptogramas te-
         change, utilizado nos modernos computa-  rem sido violados.
         dores. Lembremos aqui que nem o código   Como referimos estes sistemas subsisti-
         Morse nem o ASCII são “códigos criptográ-  ram até à II guerra mundial. A comprová-
         ficos”, mas sim sistemas de trasncrição que   -lo existe um exemplar deste género no Nú-
         servem para passar o alfabeto normal para  cleo Museológico de Material Criptográfico   Fig. 7 “Cilindro de Bazeries”
         alfabetos apropriados para máquinas. Nes-  sediado na Escola de Comunicações o qual
         tas, os caracteres são convertidos num “al-  constituiu o  1º trabalho do Serviço de Cifra  data de finais do séc. XVIII, sendo seu in-
         fabeto binário” composto apenas por dois  do Estado-Maior Naval (1942). Destinava-  ventor Thomas Jefferson (mais tarde presi-
         símbolos (ou bits): 0 e 1.. Quando agrupados   -se a permitir a troca de correspondência  dente dos EUA).
         ordenadamente, estes símbolos dão origem  entre determinados sectores do Ministério   Quase um século mais tarde (1890), um
         a palavras que a “máquina” entende e con-  da Marinha. Considera-se como tendo sido  francês de nome Étienne Bazeries reinventou
         segue permutar com outra semelhante, es-  a 1ª tentativa de integração nos “modernos”  esta máquina. A sua concepção era simples,
         tabelecendo assim um diálogo “máquina”.   princípios criptográficos de então. No qua-  consistindo num cilindro constituído por 20
         Em meados do século XIX, longe ainda da  dro 1 observamos elementos extraídos des-  discos iguais rodando livremente. Na perife-
         descoberta do código ASCII, mas bem perto  se documento:              ria de cada disco eram escritas as 26 letras do
         do inovador método de comunicar à distân-                             alfabeto com uma ordem aleatória e diferen-
         cia, dá-se conta de um bem sucedido método                            tes de disco para disco. Num dos extremos
         criptográfico recorrendo àquilo a que pode-  AACC – A                  existia outro disco numerado de 1 a 20 e era
         mos chamar uma verdadeira chave. A adopção                            a escolha de um destes números que deter-
         de um cartão apropriadamente perfurado,   AACD – a                    minava a chave do sistema. A mensagem em
         chamado “grade”  e previamente acordado   AACK – às                   claro era dividida em blocos de 20 caracteres;
         entre originador e destinatário da mensa-                             numa linha de referência, os discos eram ro-
         gem, permitia descodificar a mesma, a qual   AAOX – Abater             dados,  correspondendo a cada um uma le-
         podia sem precauções de maior, ser trans-  FDDX – comunicar           tra de cada bloco, ficando este perfeitamente
         mitida em claro via telégrafo ou circular por                         legível nessa linha. O criptograma desse blo-
         mensageiro. Evidentemente que o recurso a   Quadro 1. “Extracto da 1ª lista do Serviço de Cifra do   co ia ser lido na linha correspondente à chave
         alguns “adereços” não era colocado de lado,   EMN (1942)”             escolhida e assim sucessivamente até final de
         como a substituição por números das pala-                             todos os blocos.
         vras e frases mais comuns e ainda o recurso   CRIPTOGRAFIA MECÂNICA     Eram máquinas de baixa segurança, o que
         à disposição invertida das mesmas.                                    não impediu a sua utilização para além da II
                                              A Revolução Industrial criou no Homem  Guerra Mundial.
         LISTAS                             a paixão pelas máquinas e foi esta espécie de   Foi neste conflito que ficou conhecida uma
                                            postura filosófica que, aliada aos ditames prá-  das mais famosas máquinas de cifra: a Enig-
            Acompanhando a celeridade crescen-  ticos de uma sociedade em transformação e  ma. A grande inovação desta máquina foi a
         te nas formas de comunicar, a criptografia  inebriada pelo sucesso imediato da invenção  associação eléctrica com a mecânica. O mo-
         continuava a querer disso tirar partido, ten-  do telégrafo eléctrico, impulsionou o desen-  vimento electromecânico exercia-se concen-
         do surgido entretanto uma nova forma de  volvimento de outras áreas da comunicação,  tricamente sobre vários rotores dispostos so-
         conversão da linguagem em claro: as  listas,   tendo estas importância decisiva nas técnicas  bre um eixo como nos cilindros de Jefferson e
         também conhecidas por repertórios  ou  dicio-  da guerra. Uma guerra que vindo ela a ser
         nários. Com efeito, estas listas não eram mais  igualmente mecânica com o desenrolar das
         do que sistemas criptográficos utilizando o  operações a ser controlado à distância, exi-
         método simples da substituição( já nosso co-  gia que a história da criptografia decorresse
         nhecido), com a diferença de que  o que estes  agora paralelamente à história das conquis-
         sistemas propunham era a substituição de  tas técnicas no campo das telecomunicações
         palavras inteiras por conjuntos de caracteres  (comunicações à distância).
         inventados, criando  assim um criptograma   A Revolução Industrial interveio na crip-
         numa  correspondência directa de palavras  tografia através da mecanização dos siste-
         em linguagem clara para palavras secretas,  mas criptográficos bem como na agilidade
         desta forma mais fácil de ser transmitido.  da transmissão dos criptogramas devido à
           Como facilmente se imagina, estes dicio-  mecanização dos equipamentos de trans-
         nários, a exemplo dos nossos dicionários de  missão de Morse.
         conversão de uma língua para outra e vice-
         versa, pressupunham a elaboração de listas   O ROTOR
         simples ou de listas duplas.
           Às vantagens conhecidas acrescentam -se   O elemento típico das máquinas de cifra
         alguns inconvenientes, como o volume que  construídas até à década de 60 foi o rotor e
         ocupavam, a dificuldade em se-
         rem ocultadas e transportadas,
         bem como a extrema morosida-
         de na sua substituição, um por-
         menor importantíssimo ao tra-
         tar-se de ambientes militares e
         situações de conflito quando a
         criptoanálise está em plena acti-
         vidade. A sua vulnerabilidade foi
         comprovadamente verificada em
         várias ocasiões durante a ocorrên-  Quadro 2 “ Esquema sequencial de três rotores”  Fig. 8 “Enigma”

         12  JANEIRO 2004 U REVISTA DA ARMADA
   9   10   11   12   13   14   15   16   17   18   19