Page 311 - Revista da Armada
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de Guerra”. Da neutralidade colaborante e rocega de minas durante o estado de guerra,
o país passa a ter uma participação activa. atendendo também à forma verdadeiramente
Mais vigilância da costa é exercida pela digna de menção como ele comandou a referida
Divisão Naval da Defesa que dois meses Divisão Naval, bem como os serviços prestados
depois da declaração da guerra foi apre- na defesa submarina poupando vidas e mate-
sentada ao Chefe do Estado, ao Governo rial garantido a navegação nas costas e portos
e às missões estrangeiras. É nessa ocasião portugueses. O governo inglês entrega-lhe
que Leotte do Rego, na sua qualidade de as insígnias de Ordem Militar do Banho, o
comandante-chefe, dirigindo-se ao então de França as da Cruz de Oficial de Legião
Presidente da Republica, Dr. Bernardino de Honra e o rei dos Belgas a grã-cruz de
Machado, profirá uma frase que ficou Ordem Militar da Coroa da Bélgica.
para a História: “ Senhor Presidente. A A Justiça tinha sido feita. Mais vale tar-
Marinha está pronta para o combate!” de que nunca!
Neste limitado apontamento não se A estabilidade politica estava longe de
torna possível descrever a notável acção ser conseguida facto que aliado ao modo
da Marinha durante a I Guerra Mundial, como tinha ficado concluído o processo
(vidé a “Revista da Armada” nºs 283 e referente à revolta chefiada por Sidónio
284 de Janeiro e Fevereiro de 1996), no Pais, o chamado Dezembrismo, desgostou
entanto não é demais destacar a actuação de tal modo Leotte do Rego que este re-
do comandante-chefe da Divisão Naval Leotte do Rego, Comandante da Divisão Naval de Defesa. quereu a demissão de oficial da Armada
de Defesa, a qual será mais tarde publi- ao Ministro da Marinha que exara o se-
camente reconhecida. surto no Tejo. Seguirá para Gibraltar e poste- guinte despacho: Indefiro por assim ser conve-
Leotte do Rego depois de ter treinado in- riormente fixará residência em Paris. niente para a Pátria, a República e a Marinha.
tensamente a sua força naval apresentou, nos O Sidonismo durará cerca de um ano, perío- A nova Câmara de Deputados aprova em
meses que se seguiram à entrada de Portugal do em que Leotte do Rego no exílio se deba- Novembro de 1919 a sua promoção a contra-
no conflito, um elevado número de propostas te com grandes dificuldades financeiras. Em -almirante por distinção. Oficial general ape-
versando aspectos operacionais, logísticos e Portugal o Governo é acusado de germanófilo nas com 52 anos de idade, um facto excepcio-
de pessoal, iniciativas estas que, na genera- e efectivamente a participação activa junto aos nal para a época mas que lhe impossibilita o
lidade, foram superiormente aceites e con- Aliados diminui. A 9 de Abril sucede a Bata- serviço embarcado, somente lhe restavam as
cretizadas, contribuindo decisivamente para lha de La Lys que provocará enormes perdas actividades do âmbito político para defender
eficácia da Marinha. Dessa variada documen- no Corpo Expedicionário Português, e a 11 de a sua Marinha. As intervenções no Parlamen-
tação saliente-se uma sua carta, datada de 27 Novembro desse ano é assinado o Armistício to como deputado independente ficaram cé-
de Abril de 1916, dirigida ao Major-General que põe termo ao Conflito Mundial. Em De- lebres não só em prol da Corporação que co-
da Armada, Contra-Almirante Costa Ferrei- zembro Sidónio Pais é assassinado e um novo mandara no mar durante os anos de guerra,
ra, que relativamente a problemas inerentes capítulo abre-se na política nacional. como também por chamar continuamente a
à gestão do pessoal, área que Leotte do Rego Leotte do Rego regressa à Pátria em Março atenção para a imperiosa necessidade de se
sempre dedicou a maior atenção, escreve este de 1919 e logo nesse mesmo mês é-lhe concedi- estabelecer um entendimento entre os vários
lapidar principio: do o grau de comendador da Ordem da Torre partidos políticos que viviam em permanen-
Este comando porém e por cousa alguma deixa- e Espada a que se junta ao de cavaleiro ganho te confrontação.
rá de cumprir o seu dever e o seu dever é tomar a em 1892. Por Portaria de Junho é louvado pelos Foi durante o exercício da sua actividade
liberdade de recordar sempre que para se exigir dos valiosos e relevantes serviços prestados à República e politica, em 25 de Julho de 1923, que no inter-
subordinados tudo quanto eles devem dar, para que ao País, na organização da Divisão Naval de Defesa valo de uma sessão da Câmara de Deputados
eles possam produzir nas horas graves o máximo e na montagem e direcção de patrulhas, barragens sofreu um colapso cardíaco que provocaria o
esforço que o ideal supremo da Pátria exige, é seu falecimento no dia seguinte.
mister que os chefes cuidem dos seus direitos Desaparecia do mundo dos vivos o
e justas recompensas. Contra-almirante Jayme Daniel Leotte
A frontalidade foi uma constante da do Rego, heróico combatente das cam-
sua vida, virtude que havia de lhe tra- panhas de Moçambique, esclarecido go-
zer alguns dissabores, nomeadamente vernador ultramarino, chefe militar in-
na política, mas que reforçava a sua in- signe que brilhantemente comandou as
delével estatura de chefe militar. forças navais na I Guerra Mundial, par-
Devido fundamentalmente ao facto de lamentar integro e acima de tudo um ser
ser comandada por um oficial de tão ele- honrado, detentor das mais belas quali-
vada craveira a Divisão Naval de Defesa dades humanas que serviu a Monarquia e
irá cumprir com êxito as missões que lhe a República mas sempre tendo em mente
serão atribuídas na I Guerra Mundial. o engrandecimento da Marinha.
Apesar da guerra as convulsões in- Z
ternas abalavam o país minando a sua José Luís Leiria Pinto
credibilidade externa e eis que se dá o 5 CALM
de Dezembro de 1917. O antigo ministro
da legação portuguesa em Berlim, ma- Bibliografia
jor Sidónio Pais, chefia uma revolta, as- - Biblioteca Central da Marinha / Arquivo
Histórico:
sume as funções de Chefe do Estado e U Documentação avulsa: Cx 770 (1890-1910)
provoca a demissão do Governo. Leotte e Cx 1419A (1911-1927)
do Rego é exonerado do seu comando e U Livros mestres: C/99, D/87, E/102/140/
juntamente com o Ministro de Guerra, 160/187, F/28/113/122, G/15, H/114 e I/177.
- Museu de Marinha / Arquivo Fotográfico
major Norton de Matos, solicita o asilo - Anais do Clube Militar Naval
político, que lhes é prontamente concedi- O Almirante Leotte do Rego com Afonso Costa em Paris nos fune- - Revista de Marinha
do, a bordo de um navio de guerra inglês rais dos Soldados Desconhecidos. - “Boletim oficial” de São Tomé e Príncipe
REVISTA DA ARMADA U SETEMBRO/OUTUBRO 2004 21