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A Presença Portuguesa nos Mares do
A Presença Portuguesa nos Mares do
Norte de África dos Séculos XV a XIX
Norte de África dos Séculos XV a XIX
o passado dia 3 de Dezembro, na Biblioteca Central foi apre- Portugueses em Marrocos e a guerra no mar no princípio do século XVI” (Mestre
sentado o livro “A Guerra Naval no Norte de África (Sécu- Vasco Resende), são particularmente elucidativos desta situação, sendo evidente
Nlos XV-XIX) ”. A Comissão Cultural, segundo palavras do o especial papel de Ceuta, que sempre se revelou impraticável para o lançamento
seu presidente, promove pela primeira vez uma colectânea de estudos que de expedições contra Marrocos, dadas as características dos terrenos circundan-
se reportam à presença portuguesa nos mares iniciais da Expansão, um dos tes. “A Armada do Estreito de Gibraltar no século XVI” (Mestre Rui Godinho)
temas menos trabalhados neste âmbito, da autoria de um conjunto de notá- e Vasco Fernandes César, capitão da Armada do Estreito” (Mestre Virgílio Pis-
veis investigadores históricos, uns no início de carreira académica outros já sarra) complementam o que é evidente nos anteriores, na medida em que abordam
consagrados no meio universitário. a política específica seguida na primeira parte do século XVI, e especialmente a
Referiu-se depois o partir de 1520, quando é cria-
CALM Leiria Pinto, da oficialmente esta Armada
muito resumidamente, e entregue o seu comando a
às notas biográficas de Vasco Fernandes César. “A
cada um dos historia- expedição portuguesa de au-
dores que participaram xílio ao rei de Velez e 1552:
na obra, destacando as o relato oficial versus o teste-
respectivas produções munho de um participante”
bibliográficas e felici- (Professor Contente Domin-
tando-os vivamente pela gues) não se debruça sobre a
excelência do trabalho temática dos artigos referi-
agora apresentado. dos mas complementa-a ao
Seguidamente, um dos registar uma operação es-
dois coordenadores da pecífica em que participou o
obra, o Professor Con- padre Fernando Oliveira, e da
tente Domingues, escla- qual fala com o tom crítico e
receu os presentes sobre directo que lhe é conhecido.
o modo como tinha nas- “Memórias navais na cor-
cido este projecto, tendo te portuguesa de D. João II
afirmado: Depois do primeiro passo da expansão ultramarina portuguesa, a a D. Sebastião” (Professor Ber-
conquista de Ceuta em 1415, a ligação naval entre a metrópole e as praças con- nardo Sá Nogueira) tem um pa-
quistadas tornou-se vital para a sua sobrevivência. Também por isso, a guerra pel semelhante ao anterior (e deve
naval foi endémica nos séculos XV e XVI, prolongando e intensificando o que ser visto em paralelo com ele), na
se passara ao tempo dos ataques costeiros e das investidas da pirataria, que na- medida em que um conjunto de
turalmente continuaram, fazendo do mar um palco de confrontos constantes. escritos (retirados de Ditos Por-
Todavia conhece-se melhor o que se passou em terra, as conquistas e os cercos tugueses dignos de Memória) em
da praças, as venturas e desventuras das campanhas militares, das grandes vi- que a linguagem é simples e direc-
tórias a grandes derrotas, como Mamora e Alcácer-Quibir. Esta aparente con- ta, mais virada para o comporta-
tradição entre a importância dos aspectos navais militares e o nível actual dos mento quotidiano e o verdadeiro
nossos conhecimentos levou os coordenadores deste volume a gizar a realização carácter dos personagens parti-
de um conjunto de estudos que pudesse lançar algumas pistas para o aprofun- cipantes nos acontecimentos. “A
damento destas questões. Enquadrados num projecto de investigação dirigido Marinha de Guerra Portuguesa
pelo Prof. Doutor António Dias Farinha (Tecido Social e Redes de Poder: os e o Magrebe: os cativos, o corso
Portugueses e o Magrebe dos séculos XV a XIX. Estudo prosopográfico), foi e a importância do poder naval
possível contar com a colaboração de outros investigadores cujo trabalho esta- na definição da política externa
va próximo da temática. do reino” (Mestre Jorge Afonso)
O segundo coordenador, a quem também se deve o Intróito, repor- debruça-se sobre uma época completamente diferente da que é considerada nos
tando-se aos estudos que compõe a colectânea e citando os respectivos restantes trabalhos e vale por isso mesmo: pela forma como permite a verificação
autores, sublinhou que a existência da ligação e da harmonia entre os de constantes estratégicas e problemas que não estavam resolvidos plenamente à
temas abordados possibilitam considerar o elevado valor para Portugal entrada do século XIX. Finalmente, “Os condicionalismos físicos da navegação
dos mares do Norte de África. Assim, o CFR Semedo de Matos decla- no espaço Atlântico Oriental e no Mediterrâneo Ocidental” (1TEN António
rou que: Dos oito trabalhos publicados nesta obra, seis dizem especificamente Manuel Gonçalves) como estudo náutico sobre a região considerada, apresentado
respeito à actuação de forças navais na região norte, onde se impõem as con- como um roteiro dessa mesma região, constitui o instrumento indispensável para
dições estratégicas decorrentes da proximidade do estreito de Gibraltar, mos- a compreensão das limitações da navegação à vela, nesta área.
trando como as posições portuguesas mantidas nesse sector (com um especial Terminando, apresentou a seguinte conclusão: O conjunto dos tra-
relevo para Ceuta e Tânger) tiveram um papel muito mais decisivo no apoio a balhos apresenta assim uma coerência que resulta da complementaridade dos
operações no mar, do que como “testas de ponte” para uma conquista de todo o temas abordados, permitindo a análise de uma época alargada, onde o espa-
Norte de África, como é vulgar ver-se na historiografia tradicional sobre a pre- ço marítimo envolvente do estreito de Gibraltar teve uma clara importância
sença portuguesa no Norte de África. para Portugal fora de qualquer contexto de conquista territorial do reino
Referindo-se depois a cada um dos artigos e indicando os respectivos africano de Marrocos.
autores, disse: “A guerra de corso e a pirataria no Mediterrâneo Ocidental ao Z
tempo de do conde D. Pedro de Meneses” (Mestre Abel dos Santos Cruz) e “Os (Colaboração da Comissão Cultural da Marinha)
24 FEVEREIRO 2004 U REVISTA DA ARMADA