Page 30 - Revista da Armada
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NOVAS HISTÓRIAS DA BOTICA (7)
Os Submarinos e Portugal
Estive, por honroso convite, na desenvolvimento a que Portugal se Outros dos ícones (desconheci-
cerimónia de transferência “sujeitou”, e que, nos últimos anos, dos) deste tempo actual são os ma-
de comando da Unidade que se revelou apenas dependente dos rinheiros dos submarinos, cujas his-
representa os submarinos na nos- dinheiros que de fora vinham. Esses tórias sempre me impressionaram.
sa Marinha e em Portugal. Estava “proventos” foram usados para um Impressionou-me sempre a dureza
um dia bonito, extraordinariamen- desenvolvimento fictício, porque da actividade a que estão sujeitos e a
te quente, para o mês de Outubro. não sustentado, que agora está a ser solidão, apertada, a que sujeitam…
Enquanto ouvia os discursos – que cobrado…com juros…Para além de De alguma forma apresentam hoje
valorizavam a importância daque- agradar aos nossos credores, pou- a ousadia dos marinheiros antigos.
la arma e o valor dos homens que a cos discursos são escritos de molde Homens afoitos que se aventuravam
serviam − um pensamento ganhou a abrir horizontes claros à grande por mares longínquos, sem certezas
forma. Na verdade, de algum modo, maioria dos portugueses – entretan- ou garantias…Também eles repre-
os submarinos e os
homens que neles to mergulhados num horizonte ne- sentam sem igual a
navegam são, neste gro, sem esperança à vista, excepto especificidade e os
período socioeconó- a de um incessante incremento nos custos de uma pro-
mico que Portugal impostos… fissão que – mesmo
atravessa, um ícone em tempo de paz –
simbólico, que me- Aqui e agora deveria entrar o mar. implica sacrifícios
rece aqui destaque Tornou-se-me claro naquela manhã que poucos ousa-
por duas ordens de que Portugal, país pequeno e periféri- riam de boa vonta-
razão. A demons- co para a Europa do Norte, que agora de enfrentar…
tração dessas razões nos conduz, foi nos momentos grandes
vai certamente pa- do seu desenvolvimento, sempre um Ocorreu-me en-
recer óbvia à maior país voltado para o Atlântico (atlan- tão com clareza – ao
parte dos leitores, tista, dizem mesmo muitos autores). final daquele dia
certamente mais Esse desiderato parece agora mais real – que o país pode
versada e conhece- e palpável, uma vez que se antevê o discutir se precisa
dora do tema, ainda alargamento do mar português, aber- ou não de submari-
assim ousei humil- to à exploração económica e científica. nos, mas nessa dis-
demente avançar. Os submarinos constituem – pareceu- cussão deveríamos
-me com clareza naquele dia – o vértice aceitar que Portugal
A primeira razão, daquela vontade soberana, quer pela se veja amputado
como outros expli- capacidade militar, quer pela potencial da sua soberania.
caram vezes e vezes sem conta (de tal utilização civil, que já se terá iniciado… Pode Portugal dis-
modo que até um simples clínico in- cutir, também, se as despesas com
culto percebeu), é que a palavra sub- “os funcionários públicos militares”
marino é, ou devia ser, sinónima de serão exageradas, mas não se pode
soberania. Soberania é precisamente esconder que os militares estão su-
o tema menos discutido, mas mais jeitos a sacrifícios pouco habituais
importante na actual crise. Na verda- num tempo em que a entrega e o
de, para além dos pormenores eco- brio são valores que se vêm, global-
nómicos que preenchem as notícias e mente, desvanecendo…
os discursos políticos, é de soberania Eu e muitos desejaríamos viver
(ou melhor da falta dela), que devía- num país com a visão e a paixão de ou-
mos estar a discutir a vários níveis. tros tempos, não nesta espécie de “Por-
Portugal afirma ser um estado sobe- tugal dos Pequeninos”, esperando que
rano, mas actualmente a maior parte os adultos do Norte nos indiquem, por
das decisões, que interessam ao quo- benemérita compaixão, o caminho…
tidiano dos portugueses (principal- Finalmente e visto que só sei que só sei
mente aos mais pobres) provêm do escrever sobre emoções, termino aqui
exterior. com a emoção principal que senti na-
quele dia. Essa foi de orgulho, por tam-
O que deveria estar a ser decidi- bém estar fardado…
do, afigura-se ao português anó-
nimo, tem a ver com o modelo de Doc.
30 NOVEMBRO 2011 • REVISTA DA ARMADA