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REVISTA DA ARMADA | 506 21

Stratεgia

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“O ciberespaço é o campo de batalha do futuro”, Leon Panetta, Secretário da Defesa dos EUA (2014)

INTRODUÇÃO tação armada tradicional entre dois Estados (o que não tinha
acontecido no caso da Estónia). Estes ataques tiveram a parti-
Otermo ciberespaço só apareceu em 1982 e, embo- cularidade de serem combinados com a invasão física do terri-
ra ainda não possua uma definição universalmente tório, precedendo-a para tornar as entidades da Geórgia “cegas
aceite, a NATO já o define como o domínio global criado e surdas” neste novo domínio do conflito. Embora tenham sido
pelos sistemas de comunicação, sistemas de informação atribuídos maioritariamente a civis, concretamente nacionalistas
e outros sistemas eletrónicos, bem como pela sua intera- russos, a novidade é que eles ocorreram como parte de um con-
ção e pela informação que neles é guardada, processada flito que envolveu operações militares clássicas. Quem ainda não
ou transmitida. O ciberespaço é, pois, um domínio essen- tivesse percebido, percebeu nessa altura que todos os conflitos
cialmente virtual, concebido pelo ser humano, mas que armados se passariam a jogar também no ciberespaço!
depende de um suporte físico.
Em 2010, a sofisticação dos ciberataques atingiu um novo pata-
A importância do ciberespaço para a sociedade em mar, com a sabotagem das centrifugadoras de Natanz, usadas no
geral tem aumentado exponencialmente. Em finais de programa nuclear do Irão. Estes ataques foram concretizados com
2015, os utilizadores da internet já constituíam quase o malware2 Stuxnet, que fez com que as centrifugadoras usadas
metade da população mundial (concretamente 46,4%). para enriquecer urânio começassem a funcionar erraticamente,
Este número está associado a uma grande mudança de até se autodestruírem, apesar de os instrumentos de monitori-
comportamentos, em que a conectividade ao ciberes- zação indicarem estar tudo bem. Aparentemente, o Stuxnet foi
paço é hoje, para muitas pessoas e organizações, uma degradando as centrifugadoras durante cerca de um ano, até fi-
necessidade básica. Até já houve quem propusesse, com nalmente ser detetado pelas autoridades iranianas. Embora sem
alguma dose de humor, uma alteração à pirâmide de Maslow1, provas desse envolvimento, os EUA e Israel foram acusados de es-
acrescentando na base a ligação à internet… tarem na origem deste ciberataque. A grande novidade deste caso
foi ter tido origem numa das impressoras de rede da infraestrutura
O ciberespaço tornou-se, assim, o sistema nervoso central do de Natanz (que não estava ligada a qualquer rede externa), onde
mundo globalizado, podendo a sua perturbação afetar gravemente previamente foi inserido o software malicioso, tendo-se consegui-
o bem-estar e a prosperidade das populações. Não é, por isso, de do afetar uma infraestrutura física, o que nunca tinha acontecido
estranhar que se registem cada vez mais ataques cibernéticos, com até essa altura.
crescente sofisticação, como os três que recordamos de seguida.

CIBERATAQUES

O primeiro ciberataque de grande impacto mediático teve por
alvo a Estónia, em 2007, tendo marcado o momento a partir do
qual estes ataques começaram a ser percebidos como uma amea-
ça significativa à segurança global com efeitos transversais a todas
as áreas de uma sociedade. Com efeito, em abril desse ano, na
sequência da mudança de localização de uma estátua da era sovié-
tica, do centro de Talin para os arredores da cidade, numerosos ha-
ckers desencadearam ataques contra servidores da infraestrutura
nacional de internet, sites das autoridades políticas, bancos e com-
panhias de telecomunicações. Esses ataques, que as autoridades
estónias atribuíram ao governo russo, duraram cerca de 22 dias.
Apesar de não muito sofisticados, provocaram enormes prejuízos,
tendo sido a primeira vez que ataques cibernéticos ameaçaram a
segurança de um Estado.

No verão de 2008, o conflito entre a Geórgia e a Rússia eviden-
ciou o primeiro caso de ciberataques no âmbito de uma confron-

4 ABRIL 2016