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REVISTA DA ARMADA | 510

NOVAS HISTÓRIAS DA BOTICA                                        55

PENA QUE O FUTEBOL
NÃO SEJA TODOS OS DIAS

  […] Bem sei que podem perseguir-me, arrancar-me os olhos, torcer-me as orelhas, transformar-me em lagarto, em morcego, em
aranha, em lacrau! Mas juro que não serei infeliz PORQUE NÃO QUERO….

  In As Aventuras de João Sem Medo, de José Gomes Ferreira

Hoje, em quatro de julho, ainda não se percebeu em               que talvez seja esta a fábula que fica deste campeonato, no que
     que lugar ficará a nossa seleção. Sabe-se que atin-         toca ao nosso país: ser feliz apesar de tudo. Talvez valha a pena
giu as meias-finais, sem ganhar qualquer jogo no tem-            adotá-la noutras circunstâncias….
po regulamentar. Sabe-se que tem valores individuais de
grande valia, embora algumas destas estrelas tendam a              Que Portugal ganhe sempre.
brilhar preferencialmente nos seus clubes e menos na
seleção…                                                                                                                                                  Doc

   Contudo esta seleção já ganhou. Como sempre, uniu
os portugueses. Sim, disse-o bem, todos os portugueses.
Gordos, magros, do Norte, do Sul, da Esquerda, da Direi-
ta, todos, todos, todos… Aí é que está o mistério do fu-
tebol. Moramos num país onde raramente existe união,
equidistância. Contudo a evidência é avassaladora, no
futebol, puxamos todos para o mesmo lado.

   Imagine agora o leitor este mesmo fenómeno trans-
plantado para outras áreas da nossa vida, do nosso país.
Imagine se concordássemos sobre as principais orienta-
ções económicas, se fosse possível – nem que fora por
algum tempo – conciliar as nossas divergências políticas.
Se a transparência, o combate à pobreza, a civilidade,
etc., etc., tivessem igual apoio popular, igual suporte so-
cial….

   Ouso dizer que seria uma loucura. Talvez até fôssemos
celebrar para o Marquês de Pombal e para a Avenida dos
Aliados, em simultâneo, talvez até conseguíssemos acei-
tar que, para o bem comum são necessários sacrifícios
partilhados por todos, como agora acontece. Tal é o caso
dos milhões geralmente auferidos por jogadores, aqui e
fora. Os jogadores são pessoas que teríamos dificulda-
de em confiar noutras circunstâncias, dada a ocasional
imaturidade e ineficácia reveladas (sempre atribuídas a
uma “falta de forma”, dificilmente tolerável noutras pro-
fissões, mesmo naquelas que dependem exclusivamente
do talento).

   Deste modo, e entrando no mundo mágico do futuro,
afirmo daqui: que vá ganhando Portugal. A novidade este ano, e
seguindo as orientações do meu herói de sempre, o “João Sem
Medo” citado acima, é que, apesar de exibições mais ou menos
boas, recusamo-nos a desistir e acreditamos até ao fim…

   Ora eu que gosto de futebol, especialmente pela beleza do
jogo, e sou de um clube que é famoso por perder muito, acredito

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