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REVISTA DA ARMADA | 510

Strategia                                                           24

A2/AD em versão russa

Atentativa de negar o acesso e de dificultar a liberdade de         Sukhoi SU-24 sobrevoando o destroyer Donald Cook em 12 de abril de 2016 (Foto: US Navy).
     ação de (eventuais) contendores tem sido uma medida es-
tratégica adotada frequentemente ao longo da História, nos mais     Sistema de defesa costeira Bastion.
diversos conflitos militares e contextos estratégicos. Olhando
para Portugal, podem-se referir, como exemplos desta modalida-      da NATO, General Breedlove, a referir-se ao Báltico e ao Mar Ne-
de de ação, a construção de fortes como os de S. Julião da Barra    gro como “bolhas de A2/AD”. Com efeito, vários incidentes recen-
e do Bugio, para controlar e defender o acesso à barra do porto     tes evidenciam a postura da Rússia, de procurar condicionar for-
de Lisboa, e a edificação das Linhas de Torres, para evitar que as  temente a liberdade de ação de outros atores internacionais (com
tropas invasoras francesas atingissem a capital portuguesa.         destaque para os EUA e a NATO) nessas áreas. Assim e a título de
                                                                    exemplo, em maio e junho de 2015, caças Sukhoi-24 russos so-
  No início da década passada, analistas militares norte-ameri-     brevoaram, em repetidas ocasiões, o destroyer norte-americano
canos começaram a designar estas modalidades de ação como           USS Ross (DDG-71) quando este navegava no Mar Negro, ao largo
Anti-access e Area Denial (que se podem traduzir por Anti-acesso    da costa da Crimeia. Entretanto, já este ano, a 12 de abril, dois
e Negação de Área). A primeira publicação oficial a referir esses   Sukhoi-24 russos fizeram voos rasantes sobre o destroyer Donald
novos conceitos de maneira explícita, foi a Quadrennial Defense     Cook (DDG-75), no Báltico, a cerca de 70 milhas de Kaliningrado.
Review de 2001. Entretanto, em 2003, um relatório do think-tank     Segundo os relatos e as imagens da US Navy, um deles chegou
norte-americano Center for Strategic and Budgetary Assess-          mesmo a passar a cerca de 10 m do navio (ver fotografia).
ments (CSBA), intitulado “Meeting the Anti-access and Area De-
nial Challenge”, introduziu pela primeira vez o acrónimo A2/AD,       Cabe aqui referir que o Báltico e o Mar Negro, além de possuí-
cujo emprego rapidamente se disseminou.                             rem importantes bases navais e aéreas (destacando-se as bases de
                                                                    Kaliningrado, onde está sedeada a Frota Russa do Báltico, e de Se-
  De acordo com as definições constantes na documentação            bastopol, onde está localizada a Frota Russa do Mar Negro), têm
estruturante americana, o Anti-access (A2) consiste nas ações e     recebido modernos mísseis balísticos e de cruzeiro, que consti-
capacidades, normalmente de longo alcance, concebidas para          tuem uma muito eficaz arma de A2/AD. A intervenção na Síria
evitar que uma força opositora entre numa área de operações
ou para atrasar essa entrada. O foco do A2 é, pois, afetar o mo-
vimento para uma área de operações. Já o Area Denial (AD) con-
siste nas ações e capacidades, normalmente de curto alcance,
concebidas não para manter uma força opositora afastada, mas
para limitar a sua liberdade de ação numa área de operações. O
foco do AD é, assim, afetar a manobra dentro de uma área de
operações. As semelhanças entre muitas das ações e das capaci-
dades de Anti-access e de Area Denial levam a que os dois con-
ceitos apareçam normalmente juntos – o mesmo se aplicando
aos seus acrónimos.

  A introdução dos conceitos de A2 e de AD, há cerca de década
e meia, procurou enquadrar a postura estratégica da China, mui-
to virada para a negação do acesso e da liberdade de atuação de
potenciais contendores no mar do Sul da China. Com o passar do
tempo, esses conceitos começaram a ser também ligados ao Irão
e à Coreia do Norte. Entretanto, nos tempos mais recentes, o A2/
/AD começou a ser associado à Rússia, por esta ter vindo a ado-
tar, no espaço que entende como a sua esfera de influência, um
conjunto de medidas que aumentam significativamente os riscos
e os custos de uma eventual intervenção externa nesse espaço.
Essas medidas têm incidido em especial em duas áreas geográfi-
cas: o Báltico (beneficiando da localização do enclave de Kalinin-
grado, entre a Polónia e a Lituânia) e o Mar Negro (tirando par-
tido da posição estratégica da Crimeia, anexada em 2014). Isso
levou o anterior Comandante Supremo Aliado para as Operações

4 AGOSTO 2016
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