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REVISTA DA ARMADA | 526
SAÚDE PARA TODOS 52
A QUÍMICA DO AMOR
“Dopamina, norepinefrina, serotonina… Somos uma fábrica de drogas naturais quando nos apaixonamos.”
-Helen Fisher-
lbert Einstein disse que tentar explicar o que senƟ mos por tema, propôs a existência de 3 fases no amor, cada uma delas
Auma pessoa especial e o moƟ vo pelo qual nos apaixonamos, com as suas caracterísƟ cas emocionais e os seus compostos quí-
sob os termos estritos da química do amor, é subtrair a magia micos próprios.
do assunto. Eu gosto de magia. Mas é minha função informar os FASE 1 – FASE DO DESEJO: o desejo sexual é despertado pela
leitores que, apesar de ser agradável pensarmos que seguimos o circulação das hormonas sexuais, a testosterona nos homens e
nosso coração, a ciência tem explicações menos poéƟ cas para os o estrogénio nas mulheres. A circulação destas hormonas, que
caminhos românƟ cos que atravessamos na vida. levam o nosso cérebro a interessar-se por parceiros sexuais,
“Os homens devem saber que do cérebro, e só do cérebro, deri- começa na adolescência.
vam o prazer, a alegria, o riso e o diverƟ mento, assim como a FASE 2 – FASE DA PAIXÃO: esta é a fase da atração e do enamora-
tristeza, a pena, a dor e o medo”, disse Hipócrates (460-377 a.C.), mento, quando se perde o apeƟ te e o sono, só se consegue pensar
o médico grego considerado o pai da Medicina. na pessoa amada, as nossas mãos suam e a respiração torna-se diİ -
O amor resulta de uma complexa cadeia de reações químicas cil. Nesta fase os três compostos químicos que atuam sobremaneira
cerebrais e acredita-se que existe apenas com o objeƟ vo de pro- no nosso cérebro são a norepinefrina, também chamada noradre-
pagar a nossa espécie. Por outras palavras, nós amamos porque nalina, a serotonina e a dopamina. A norepinefrina está associada
somos o resultado de um processo evoluƟ vo bem sucedido: ao à exaltação, euforia, falta de sono e de apeƟ te. A serotonina leva-
entrarmos numa relação estável, a probabilidade de criarmos -nos à fi xação no ser amado, ou seja, torna-nos obcecados (a Prof.
com sucesso os nossos descendentes são muito maiores. Para Donatella MarazziƟ , nos seus estudos com doentes que sofriam de
poupar energia e tempo no processo da corte, fomos também perturbação obsessiva compulsiva, descobriu que os baixos níveis
selecionados para concentrar a nossa atenção numa só pessoa. de serotonina de quem se apaixona se aproximam dos níveis carac-
terísƟ cos dessa doença mental) – portanto o amor deixa-nos loucos
de verdade! A dopamina é fundamental no mecanismo de desejo
ESCOLHA DO PARCEIRO
e recompensa (faz-nos senƟ r felizes só com um sorriso ou olhar) e
A escolha de um parceiro parece não ser aleatória. Neste pro- os seus efeitos no cérebro são análogos aos da cocaína – podemos
cesso inconsciente sabe-se que os mamíferos fêmeas tendem dizer, então, que o amor é uma “droga”.☺ É interessante referir
a procurar um macho que garanta o sustento dos fi lhos (tem de que estes 3 compostos químicos (chamados de neurotransmisso-
transpirar sucesso e segurança!), enquanto os machos procuram res, dado que intervêm nas transmissões do sistema nervoso) são
fêmeas com boa capacidade de reprodução (ex: com anca larga). controlados por um outro, chamado fenileƟ lamina. Como a própria
Ambos os sexos “andam à caça” de alguém com um sistema palavra indica, estamos diante de um composto orgânico que tem
imunológico diferente do seu, dado que a variabilidade genéƟ ca muitas semelhanças com as anfetaminas e que, combinado com a
garante o sucesso da espécie e evita as anomalias do cruzamento dopamina e a serotonina, sinteƟ za a receita perfeita para um fi lme
entre familiares. Nesta parte assume um papel crucial o chamado de amor. “A fenileƟ lamina é como o açúcar numa bebida ou o verniz
Complexo de HistocompaƟ bilidade Principal (MHC), relacionado que se coloca numa tela: tudo se torna mais intenso”. A fenileƟ la-
com as defesas imunitárias dos indivíduos. Aparentemente, são mina está presente em vários alimentos, mas é no chocolate que ela
as proteínas que consƟ tuem os genes deste Complexo, muito é degradada mais rapidamente, tendo um efeito quase imediato...
diferentes de pessoa para pessoa, que libertam um “odor” – as daí que os bombons são uma prenda muito apreciada entre namo-
chamadas feromonas. Pelo menos esta é a conclusão do teste das rados... e é também por isso que o chocolate é viciante.
camisolas suadas, realizado em 1995 pelo biólogo Claus Wedekind FASE 3 – FASE DO AMOR: porque ninguém consegue manter-se
e sua equipa. Nesta invesƟ gação, um grupo de mulheres foi con- eternamente na fase esgotante da paixão surge a úlƟ ma fase, a fase
vidada a cheirar camisolas usadas por diferentes homens durante da ligação e do amor românƟ co, em que surgem os laços para que
dois dias, manifestando depois a sua preferência. A preferência os parceiros permaneçam juntos. Nesta fase estão presentes, em
foi sempre pelos homens com perfi s MHC bastante disƟ ntos dos maior quanƟ dade, a oxitocina (a chamada hormona do carinho,
próprios, ou seja, pelos parceiros mais adequados geneƟ camente. que é a responsável pela criação de vínculo) e a vasopressina (indis-
pensável para garanƟ r a fi delidade dos parceiros sexuais). Ambas
as hormonas se libertam durante o orgasmo, o que parece indicar
FASES DO AMOR
que quanto mais relações sexuais um casal Ɵ ver maior é a ligação
Quando duas pessoas estão apaixonadas existe mesmo química química entre eles. A Drª Fisher chega a sugerir que a melhor forma
entre elas: várias invesƟ gações já encontraram relações diretas de uma pessoa se reapaixonar pelo seu parceiro, na fase em que a
entre os compostos químicos que circulam no nosso sangue e relação já arrefeceu, é fazer amor com ele!
atuam sobre o nosso cérebro, e os nossos comportamentos nas
diversas fases do amor. Ana CrisƟ na Pratas
A Dr ª Helen Fisher, uma das principais especialistas mundiais da 1TEN MN
biologia do amor e da atração, autora de vários livros sobre este www.facebook.com/parƟ cipanosaudeparatodos
32 FEVEREIRO 2018