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REVISTA DA ARMADA | 555


              SAÚDE PARA TODOS                                                                                  79



              MUCORMICOSE



              A mucormicose é  uma infeção por fungos, da ordem Mucorales, que surge maioritariamente em doentes diabéƟ cos. Geralmente tem
              como ponto de parƟ da a mucosa nasal e os seios perinasais apresentando-se como uma sinusite aguda invasiva. É rapidamente pro-
              gressiva e, muitas vezes, fatal.


              FISIOPATOLOGIA                                                                                       DR
                 s fungos da ordem Mucorales são ubíquos na natureza. Dentre
              Oestes, os mais frequentemente associados à doença mucor-
              micose são os do género Rhizopus, Mucor e Cunnigamella. São
              fungos saprófi tas (alimentam-se absorvendo substâncias orgâni-
              cas), de crescimento Ɵ picamente rápido e angioinvasivos (as hifas
              proliferam pelos vasos sanguíneos), levando a isquemia e necrose
              (morte) dos tecidos envolvidos.
               A infeção pode ser adquirida por via inalatória, ingestão ou ino-
              culação subcutânea, sendo a causa mais comum a inalação de
              esporos dispersos no meio ambiente. Não há transmissão pessoa
              a pessoa.
               A forma de longe mais comum de mucormicose é a rinocerebral,
              que abordaremos neste arƟ go, mas também existe mucormicose
              pulmonar, cutânea, gastrintesƟ nal ou disseminada.
               Embora estes fungos possam ser encontrados nas fossas nasais
              de pacientes saudáveis, eles causam quase sempre doença apenas
              nos doentes imunodeprimidos. São fatores de risco conhecidos a   DIAGNÓSTICO
              diabetes mellitus mal controlada (36-88% dos casos), transplante
              de órgãos prévio, neoplasias malignas hematológicas, síndrome de   A suspeita de mucormicose deve ser levantada em qualquer
              imunodefi ciência humana adquirida, trauma penetrante, queima-  paciente imunodeprimido que desenvolva sinusopaƟ a, especial-
              duras graves, desnutrição, doença renal e tratamento prolongado   mente se aƟ ngir vários seios perinasais (pansinusite). A tomografi a
              com corƟ coides ou desferroxamina.                  computorizada (TC) da face e crânio, e se possível a ressonância
               A mucormicose rinocerebral inicia-se, portanto, com a coloniza-  magnéƟ ca (RMN), são importantes para avaliar a destruição óssea
              ç ã o da mucosa nasal. Quando as pessoas não apresentam resposta   e a progressão da invasão. A confi rmação diagnósƟ ca faz-se por
              imune adequada, ocorre a germinação. As hifas dos Mucorales têm   exame histopatológico de uma amostra de tecido afetado pela
              especial preferência por artérias e pelo sistema linfáƟ co. Também   doença, em que se visualizam as hifas não septadas.
              podem invadir nervos, tecido gordo e ossos. A angioinvasã o pelas
              hifas produz uma reação  fi brinó ide, que leva à  produç ã o de um   TRATAMENTO
              rolhã o de fi brina e fungos conhecido por “mucor thrombi”. Este é
              responsável pela oclusão das artérias, levando à  isquemia, enfarte e   O tratamento desta situação tem de ser rápido e agressivo. Pre-
              consequente formação do tecido preto necróƟ co, que recobre pele   coniza-se o tratamento da causa subjacente (ex: controle da dia-
              e mucosas e que é  caraterísƟ co desta doença. A infecç ã o dissemina-  betes, reversão da imunossupressão quando possível ou suspen-
              -se rapidamente aos seios perinasais e à  órbita, podendo conƟ nuar   são da desferroxamina), medicação anƟ fúngica (anfotericina B) e
              através do osso etmó ide e dos vasos orbitários até  ao crânio.  desbridamento cirúrgico extenso do tecido necróƟ co (que pode
                                                                  envolver remoção do conteúdo orbitário, incluindo globo ocular).
              EPIDEMIOLOGIA                                         Outra modalidade de tratamento em estudo é a oxigenotera-
                                                                  pia hiperbá rica que parece apresentar beneİ cio quando usada
               A incidência de mucormicose na população é esƟ mada  em   concomitantemente ao anƟ fúngico e desbridamento cirúrgico.
              0.5-1,2 casos por milhão de pessoas.                O aumento da pressão de oxigénio obƟ do com a oxigenoterapia
                                                                  hiperbárica melhora a aƟ vidade dos neutrófi los e os efeitos oxi-
              MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS                              daƟ vos anƟ micóƟ cos, além de que foi relatado que altas concen-
                                                                  trações de oxigênio inibem o crescimento dos fungos Mucorales
               Esta doença manifesta-se inicialmente com febre, dor Ɵ po moi-  in vitro e melhoraram a taxa de cicatrização de feridas.
              nha na região dos seios perinasais e, por vezes, congestão nasal e   O prognósƟ co desta doença é  mau e cerca de 50% dos casos são
              secreções nasais (que podem conter sangue). Poucos dias depois   fatais. Este número aumenta para 90% quando o sistema nervoso
              surge edema periorbitá rio, proptose, oŌ almoplegia, alterações da   central é aƟ ngido.
              visão (incluindo cegueira) e lesões necróƟ cas da pele e mucosas
              aƟ ngidas (placa preta a nível do nariz, órbita e palato, do lado afe-                    Ana CrisƟ na Pratas
              tado pela doença). Se a extensão progressiva da necrose envolver                                CTEN MN
              o cérebro pode causar convulsões, coma e morte.                            www.facebook.com/parƟ cipanosaudeparatodos


              32   SETEMBRO/OUTUBRO 2020
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