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REVISTA DA ARMADA | 558
ESTÓRIAS 65
Autor: STEN TSN-ARQ Paulo Guedes
AS TTP na GUINÉ
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s destacamentos de fuzileiros que conheci na Guiné eram perigosos, porque o IN, se se Ɵ vesse apercebido da nossa pre-
Opoderosas máquinas de guerra e Ɵ nham uma forma de operar sença, começaria a procurar e montava emboscadas em locais
que produzia, quase sempre, resultados. Em Ganturé, entre outras, onde previa que o destacamento estava ou iria passar. O IN Ɵ nha
Ɵ nham como missão patrulhar o Rio Cacheu e os seus afl uentes, quase sempre a vantagem de conhecer o tereno e de surpreender.
para impedir a “cambança” do rio pelo IN e onde desenvolviam Ultrapassada esta fase delicada, o destacamento embrenhava-
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intensa aƟ vidade operacional, difi cultando ao máximo a sua infi l- -se na mata. Progrediam lentamente, em fi la indiana, separados
tração e circulação. Ocorriam com frequência combates intensos por três, quatro, cinco metros de distância uns dos outros, armas
no chamado “Corredor do Sambuiá” e nas zonas do “Olossato”, engaƟ lhadas, prontas a disparar ao menor sinal, todos os senƟ dos
do “Churo-Caboiana”. Eram curtos e violentos, ao ponto de, mui- em alerta máximo. Não andavam em picadas ou trilhos, porque
tas vezes, esgotarem as munições e terem de ser reabastecidos de sabiam que estes podiam estar armadilhados com minas e outros
helicóptero. artefactos explosivos. Preferiam andar a corta-mato e nas orlas das
Os guerrilheiros do PAIGC estavam bem armados, treinados e matas. Era mais seguro.
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organizados militarmente, os chamados “Bi-Grupos”, com cerca de Sempre que encontravam um trilho paravam, viam se estava
sessenta a oitenta homens comandados por chefes experientes, armadilhado e emboscavam. Com o tempo, iam ganhando expe-
alguns dos quais fi caram famosos pela sagacidade e inteligência. riência, aprendendo a conhecer o terreno e as manhas do IN, os
Os Fuzileiros Ɵ nham, como princípio de atuação, a furƟ vidade. seus pontos fracos e fortes. Mas, por vezes, durante os comba-
Normalmente, grupos de quarenta e cinco a sessenta homens tes, ocorriam baixas, o que era uma situação terrível de controlar.
eram transportados numa LDM e desembarcavam num deter- Como fazer? Haveria comunicações para pedir a evacuação? Os
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minado ponto da margem dos rios pelas 02:00H/03:00H, aprovei- helicópteros poderiam aterrar?
tando a escuridão da noite africana. A guerra não é um tempo agradável, é dura e impiedosa, onde o
O desembarque era o mais silencioso possível, durante o qual, homem se confronta com os seus próprios limites, onde se mata e
era absolutamente proibido falar e fazer barulho. Para barulho se morre. Durante um combate, se abdicávamos de disparar con-
bastava o ruído dos corações que baƟ am intensamente naqueles tra o inimigo, com a intenção de o ferir ou matar, arriscávamo-nos
momentos de tensão! Caminhavam lentamente, muitas vezes de a morrer de seguida; hesitar consƟ tuía um risco tremendo…
mãos-dadas com os parceiros da frente e de trás para não se que-
brar a coluna, tal era a escuridão. Miguel Carmo Soares, 14.º CFORN
Ultrapassada a orla e a vegetação junto ao rio, progrediam cem, In Crónicas Intemporais da Guerra e da Fraternidade, 2019
duzentos, trezentos metros até encontrarem a mata e aí paravam e
esperavam que o dia nascesse. Por vezes, o desembarque dava-se
com água pela cintura ou mesmo pelo peito e, assim encharcados, Notas
Ɵ nham de permanecer durante a noite. A roupa secaria no corpo, 1 2 Acrónimo de Técnicas, TáƟ cas e Procedimentos.
ao longo do dia seguinte! 3 Abreviatura de inimigo.
Acrónimo de ParƟ do Africano Para a Independência da Guiné e Cabo Verde.
Quando os primeiros raios de luz começavam a aparecer, o des- 4 Acrónimo de Lancha de Desembarque Média.
tacamento começava a circular. Eram momentos parƟ cularmente
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