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REVISTA DA ARMADA | 558


              SAÚDE PARA TODOS                                                                                  82



              EXTEROGESTAÇÃO




              Após o parto o bebé passa a ser chamado de recém-nascido e a mulher de puérpera. As semanas seguintes são de adaptação a uma
              nova realidade. Há quem defenda que os primeiros três meses de vida de um bebé são a conƟ nuação da sua gestação, mas fora
              do útero, e que recriando para o bebé um ambiente com elementos sobreponíveis à sua vida uterina, a sua adaptação ao mundo
              exterior seria gradual e serena.

                 bebé humano é, de entre todos os mamíferos, dos que nasce   num ambiente sereno, e que a comunicação não verbal do bebé
              O  mais imaturo. Uma explicação possível poderá ser o facto de   – choro – seja atendida pois manifesta desconforto. É essencial
              que, para caber no canal de parto, o feto não pode terminar o   neste período a capacidade de interpretar a linguagem do bebé
              seu desenvolvimento neurológico in útero, levando a que o cres-  – e isso faz-se de forma intuiƟ va, e não racional.
              cimento do cérebro e sua maturação ocorra principalmente após   Baseadas na tese de Montagu sobre o 4º trimestre de gesta-
              o nascimento.                                                                  ção, surgiram técnicas para
               A mudança que o bebé tem                                                  DR  acalmar recém-nascidos que
              após o parto é imensa: tem                                                     passam pela recriação do
              de aprender a respirar, regular                                                ambiente que o bebé expe-
              a sua temperatura corporal,                                                    rienciou enquanto viveu no
              alimentar-se, adaptar-se aos                                                   útero. Acredita-se que a repli-
              barulhos e movimentos do                                                       cação desse ambiente trará
              mundo exterior, ao toque na                                                    uma adaptação mais suave
              sua pele, entre outros. Essa                                                   do bebé ao mundo exterior.
              intensa adaptação ao mundo                                                     Algumas das técnicas mais uƟ -
              exterior não é feita sem a ajuda                                               lizadas são o contato pele com
              dos pais, ou de quem desem-                                                    pele com os progenitores, a
              penhar esse papel. Em vez                                                      sucção (se possível, através
              do útero, é o colo que passa                                                   da amamentação em livre
              a simular o ambiente quente                                                    demanda, pois além do ato
              e seguro, necessário para o                                                    de alimentar é também um
              desenvolvimento da criança.                                                    ato de acalmar e de criar vín-
              Inúmeros estudos comprovam                                                     culo: é um ato de amor), mas
              essa teoria: os recém-nascidos                                                 também o ser transportado
              que mais receberam colo dos                                                    ao colo e senƟ r o movimento
              pais sofreram alterações posi-                                                 (como quando andava dentro
              Ɵ vas no ADN, especialmente                                                    da barriga da mãe), ser acon-
              em genes relacionados ao sis-                                                  chegado numa manta/ninho
              tema imunológico, bem como                                                     (ao invés de sozinho num
              Ɵ veram um desenvolvimento                                                     berço onde ele não senƟ rá
              emocional mais robusto.                                                        os limites, o oposto ao que
               Durante os primeiros meses                                                    acontecia quando esƟ cava os
              de vida extrauterina o recém-                                                  braços/pernas na barriga da
              -nascido necessita, portanto,                                                  mãe), ouvir ruídos constantes
              de apoio permanente para                                                       e suaves (que simulam o fl uxo
              poder sobreviver. A depen-                                                     sanguíneo que ele ouvia no
              dência para com os seus cui-                                                   útero) e não haver mudanças
              dadores é tão intensa que o antropólogo inglês Montagu defen-  bruscas de temperatura.
              deu a tese que se iniciava uma nova gestação após o parto, como   Persistem ainda vários locais no mundo onde os hábitos dos
              se de um 4º trimestre de gestação se tratasse, e chamou a estes   antepassados passaram de geração em geração e, como tal, o
              primeiros 3 meses de vida do recém-nascido exterogestação. Há   período de exterogestação não sofreu modernização. Os pais
              até países que celebram o primeiro aniversário de vida no fi nal   estão sempre com os fi lhos, carregam-nos num contato pele a
              desta fase, pois é nesta altura que o bebé completa 1 ano após   pele constante, bem embrulhados contra o peito ou às costas.
              a fecundação.                                       E, assim, balanceados pelos movimentos do seu cuidador e
               Também os pais sofrem mudanças bruscas após o nascimento   ouvindo o som da sua voz, da qual se lembram desde sempre,
              do bebé, seja pelas mudanças hormonais e anatómicas na mãe,   estão serenos, sem choros ensurdecedores, sem “cólicas”. Vivem
              pelo ajuste a um novo quoƟ diano, ou por terem de se adaptar a   o 4º trimestre da gestação em paz.
              cuidar de um novo ser humano, e criar vínculo com o mesmo. É um
              tempo de ajustes – de muitas alegrias, mas também de desafi os.                            Ana CrisƟ na Pratas
               Não há receitas perfeitas para este período pós-parto. É reco-                                 CTEN MN
              mendável que seja um período vivido apenas em família nuclear,             www.facebook.com/parƟ cipanosaudeparatodos


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