Page 6 - Revista da Armada
P. 6
REVISTA DA ARMADA | 568
67
A 4.ª REVOLUÇÃO INDUSTRIAL
E A INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL
“Nenhum homem tem o privilégio de entender o futuro, a não ser que esteja preparado para o criar”
Fernando Pessoa
o longo da História, a Humanidade tem evoluído continua- trial rondará os 59%, correspondentes a cerca de 4,6 mil milhões
Amente, com a ocorrência pontual de mudanças radicais, que de pessoas, em todo o Mundo, que usam a internet.
alteram profundamente os sistemas vigentes, como por exemplo Contudo, nas sociedades mais desenvolvidas, já se vive o advento
a revolução agrícola (que implantou a sociedade agrária) ou a re- da 4.ª revolução industrial, caracterizada pela integração do mun-
volução industrial (que deu lugar à sociedade industrial). Neste do cibernético com o mundo real. Efetivamente, segundo Schwab,
entendimento, parece consensual que a Humanidade vive, desde na viragem para o novo século, iniciou-se uma nova revolução in-
meados do século passado (nomeadamente desde a invenção do dustrial – a quarta – que assenta nos desenvolvimentos das déca-
computador), uma nova época de transformações radicais, a que das anteriores e que se caracteriza por uma internet omnipresente,
se tem convencionado chamar a revolução da informação. Em por sensores mais pequenos, mais poderosos e mais baratos.
1955, o físico britânico Sir George Thomson (laureado com o Pré- A 4.ª revolução industrial distingue-se pela confluência de es-
mio Nobel em 1937) antecipava mesmo, no seu livro The Forese- pantosos avanços tecnológicos, cobrindo uma vasta gama de
eable Future, que o melhor paralelo histórico com a revolução da
informação não era a revolução industrial, mas sim a revolução áreas, como Inteligência Artificial (IA), robótica, internet das coi-
agrícola, no Neolítico – uma tese corroborada por muitos ana- sas, veículos autónomos, impressão em 3D, nanotecnologia, bio-
listas contemporâneos, como por exemplo James Arbib e Tony tecnologia, ciência de materiais, armazenamento de energia ou
Seba, num estudo de 2020, intitulado Rethinking Humanity. computação quântica. Segundo Schwab, a 4.ª revolução indus-
Entretanto, alguns pensadores, liderados pelo Presidente do trial está a criar um mundo em que os sistemas virtuais e físicos
Fórum Económico Mundial, Klaus Schwab, consideram, mesmo, cooperam de forma flexível. É a fusão dessas tecnologias e a sua
que já se entrou numa nova fase pós-idade da informação. Efe- interação transversal nos domínios físico, digital e biológico que
tivamente, Schwab identifica quatro períodos de grandes trans- tornam a 4.ª revolução industrial fundamentalmente diferente
formações sociais, económicas e tecnológicas, que designa como das anteriores revoluções.
revoluções industriais (Ver tabela). A idade da informação está, portanto, a dar lugar a uma nova
era, conhecida como a idade da super-inteligência ou idade da IA,
MODELO DAS REVOLUÇÕES INDUSTRIAIS uma vez que a IA é a tecnologia central de toda a revolução em
curso. Justifica-se, pois, abordá-la de forma breve.
O modelo de Schwab começa na revolução industrial propria-
mente dita, ocorrida entre 1760 e 1840, que foi marcada pela INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL
invenção da máquina a vapor.
No final do século XIX / princípio do século XX, iniciou-se, segun- O conceito de IA apareceu pela primeira vez em 1955. Na altu-
do Schwab, a 2.ª revolução industrial, determinada pelo advento ra, parecia que a construção de máquinas com inteligência seme-
da eletricidade e da linha de montagem, que tornaram possível a lhante à humana levaria poucos anos – eventualmente uma ou
produção em massa. duas décadas. No entanto, essas expetativas não se cumpriram,
Entretanto, nos anos 60 começou um novo período de trans- essencialmente porque a capacidade dos computadores da épo-
formações profundas, que Schwab designa como a 3.ª revolução ca ainda era muito limitada. Isso levou a algum desencanto com
industrial. Estas transformações foram induzidas pelo desenvol- as capacidades da IA. Todavia, a partir da década de 80, deu-se
vimento de semicondutores (década de 60), de computadores uma nova vaga de desenvolvimentos na IA, muito assente no au-
pessoais (décadas de 70/80) e da internet (década de 90). mento da capacidade computacional. Recentemente, a IA teve
Naturalmente, cerca de 13% da população mundial ainda não um novo impulso, beneficiando – além da crescente capacidade
chegou sequer à 2.ª revolução industrial, por não ter acesso a dos computadores – das extraordinárias quantidades de dados,
eletricidade, e há mais cerca de 28% da população global que não que potenciam algumas técnicas da IA, como o saber profundo
beneficia da 3.ª revolução industrial, pois, embora disponha de (deep learning) ou os megadados (big data).
eletricidade, não tem acesso à internet. Neste quadro, a percen- De facto, a IA mostrou todas as suas potencialidades em 2016,
tagem de população que já estará a viver a 3.ª revolução indus- quando o sistema AlphaGo, da Alphabet, derrotou o campeão do
6 DEZEMBRO 2021