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REVISTA DA ARMADA | 575
10 DE JUNHO
sem a arraia-miúda de que falava Fernão Lopes, não teria havido com unidade territorial, com um sentimento de pertença a uma
o Portugal que temos, porque foi esse povo quem morreu, aos nova pátria, no sacrifício de heróis como lendário Tiradentes.
milhares na conquista do território. Partiu em cascas de noz, Celebramos, este ano, dois séculos do começo do fim do nosso
pelos oceanos para o desconhecido. Ficou espalhado um pouco império colonial. Partilhando o júbilo dos nossos irmãos do
por todo o universo e deixou língua, alma e saudade das raízes. outro lado do Atlântico, como outro passo do nosso povo que se
E ainda esteve, nos momentos decisivos, para podermos vir a ser desdobrou em dois: o povo brasileiro e o povo português. Com a
o que somos, desde os combates no século XIV e XVII pela nossa naturalidade do que era inevitável e portador de futuro, criando
independência e pela nossa restauração. reencontros fraternos, como foi a nossa emigração e tanta ida,
Portugueses e que ano este, de 2022, para evocarmos o nosso aqui do Minho, no final do século XIX para o Brasil ou no começo
povo – o povo português – já não apenas da história antiga, na do século XX ou agora, nos anos 70 do mesmo século XX e mais
história de anteontem, mas na história de ontem e de hoje. Há tarde, a imparável imigração brasileira dos anos 90, até hoje.
duzentos anos, em 1822, a soberania nacional, que antecedeu Cento e oitenta anos mais tarde, em 2002, renascia como Estado
a soberania popular, passava a ser a fonte do poder do Estado independente Timor-Leste, depois de mais de um quarto de século
português. de combate heroico, no qual o povo português esteve todo, mas
Portugal continuava a ser monarquia, uma monarquia à mesmo todo, a 100%, não a 70, a 80, a 90 ou 95 porcento. Esteve a
qual devíamos séculos e séculos da nossa pátria, mas a nossa 100 porcento unido ao povo timorense, apoiando na diplomacia,
monarquia, em que o rei passava a basear o seu poder na na política, nas instituições sociais, mas também chorando no
soberania da nação. E uma Constituição escrita, votada por massacre do cemitério de Santa Cruz, vibrando com o referendo,
eleitos de uma parte dessa nação, limitava os poderes do rei, cruzando mares com o Lusitânia Expresso, rezando, conduzindo
consagrava direitos pessoais e políticos, começava uma nova ações não religiosas ou confessionais, vestindo-se branco por
idade na nossa vida coletiva. Celebramos, este ano, dois séculos todo o país, dando-se as mãos nas ruas de Portugal.
desse passo fundamental para o reconhecimento do nosso povo, Celebramos este ano duas décadas desse triunfo, mais perto do que
do seu papel nacional. nunca dos irmãos timorenses e novamente, o nosso povo presente a
Em 1822, também, proclamava a pátria irmã do Brasil, a sua viver esses momentos redentores no que foi o fim, do fim do Império.
independência, pela voz do filho mais velho do rei de Portugal, Sortilégio do destino celebrado no mesmo ano em que se celebra o
nomeado regente em nome da sua pátria de origem e que começo do fim do Império com a independência do Brasil.
assumiu a luta libertadora inscrita em raízes anteriores a 1500, Portugueses, a unir tudo isto, sempre o povo. O povo português!
mas, sobretudo, na vontade de passar a ser um Estado soberano, Porque já o lembrei em 25 de abril, a nossa pátria é história,
6 JULHO 2022