Page 276 - Revista da Armada
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Vista do Obs~TVCII6rio dI! Grunwich, urro dI! 1676. Gral'UfQ ais/ente do Must!u Maritimo tU G"t!""'d!.
o primeiro meridiano
á alguns anos atrás, estávamos a prestar serviço no Este episódio serviu-nos para relembrar, se bem que re-
Museu de Marinha, quando nos ap.a{ttW um velejador sumidamente, a longa e apaixonante história do chamado
H solitário que estava empenhado em dar a volta âo . primeiro meridiano ou meridiano lera.
mundo. Um navegador solitário é um homem que pasSa dias, Deve-se a Eratóstenes (276- 196 AC) a base do sistema de
semanas, mesmo meses, encapado numa pequena embarcação, coordenadas que hoje se usa e que permite dermir um lugar
dividindo-se entre a cana de leme e algumas horas de descanso. na superfície do globo, por uma latitude e uma longitude. A
Não admira, pois, que quando chega a um porto, procure primeira foi sempre uma coordenada pacífica, sem problemas.
alguém para conviver ou, pelo menos, para trocar algumas A sua contagem fez-se sempre a partir do equador e até, o
palavras. Este navegador solitário não fugia à regra. seu cálculo, recorrendo ao sol e a outras estrelas, nunca
Ouvimos uma longa e ponnenorizada descrição da avaria ofereceu dificuldades. A longitude, pelo contrário, ponou-se
que o tinha obrigado a arribar a Lisboa. Depois, o nosso sempre com rebeldia. Só no século XVII com o advento do
interlocutor desenrolou uma carta náutica, que denunciava, cronómetro de bordo e dos instrumentos de dupla reflexão.
pelo seu aspecto, uma longa permanência a bordo, e referi~ foi possível determinar, no mar, esta coordenada com rigor
um hábito que existe entre os velejadores de longo curso. (2). No que respeita ao primeiro meridiano, só no século XX
Quando se encontram num pono e, em seguida vão largar em se iria conseguir, como vamos ver, uma solução a nível
direcções diferentes, tTOCam as canas de navegação que já mundial.
usaram por aquelas que lhes poderão ser úteis nas jornadas Eratóstenes escolheu, para início de contagem da longitu-
seguintes. Depois, chamou-nos a atenção para o facto de de, o meridiano que passava por Alexandria. Ptolomeu
naquela, as longitudes estarem erradas, em relação às canas (c.96-<:.168), autor da Geografia que, traduzida para inúmeras
que costumava utilizar. Eram mais de dois graus de diferença. Unguas, a panir da segunda metade do século XV, foi uma •
. Islo não é um perigo?», perguntava o navegador solitário, obra fundamental, para a época, usou como primeiro meri-
muito indignado. E era! diano o que passava a dois graus oeste das llhas Canárias,
Efectivamente, a vetusta cana que tínhamos à nossa frente, porque julgava que estas eram o extremo ocidental do mundo.
estava datada do princípio do século e, nela, as longitudes eram Deste modo, utiJizar-se-iam apenas longitudes leste, o que
contadas a partir do meridiano de Paris. É obvio que esta evitava, eventuais confusões, ao contrário do que poderia
circunstância poderá ter graves consequências para a navega- acontecer quando estas se usavam nos dois sentidos.
ção, se um piloto, pouco experiente ou inadvertidamente, No tempo dos Descobrimentos, foi também meridiano
transferiu , para uma cana referida a Greenwich, o ponto do zero. o que passava pela ilha de Ferro, a mais ocidental do
navio, sem contar com a diferença de longitude entre os dois arquipélago das Canárias, e, também o que resultou do célebre
meridianos de referência (I). tratado de Tordesilhas, a 370 léguas a oeste de Cabo Verde,
(I) Paris t!s/d a 2.- 20' 14" a ft!I/t! dt! Gru nK'ich. "1) Em It rro. a fQtlgitudt fQfculal'(l-$t ptla grodt!sia.
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