Page 304 - Revista da Armada
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cessar na dIagonal da camarinha,
de um t1ngulo para o outro, com as
unhas a tinir no oleado que cobria
o chão.
O caso não deixava dúvidas.
Por um extremo de faro, a mãe da
/UJlenina·tiglb havia, decerto, se·
guido o rasto da cria até.4 testa da
ponte e desapontada na busca exa·
lava o seu lamento maternal ao
mesmo tempo que manifestava a
sua fúria de fera bravia.
AM ao romper do dia ninguém
mais dormiu a bordo. Os remadores
negros contavam, baixinho, histó·
rias assombrosas da força, da astú'
cia a da ferocidade dos leopardos
da região. Os brancos deixavam-se
sugestionar, Visto nlo haver outro
navio no porto, todos se conven-
ciam que a mie da «menina·tigrall
sabia que esta estava a bordo da
llMarracuene •. E esgazeavam os
olhos sobre a água, entre o navio e
a terra, imaginando que ela se dei·
taria a nado e receando a todo o ins-
tante ver a canhoneira tomada de
abordagem pela fera . Para os soe&-
gar, o comandante fingiu nlo ver
que tinha vindo para cima quatro
carabinas carregadas. E assim se
passou o quarto da modorra, qua·
se em postos de combate, entre os
rugidos do animal em terra e o ti· mais . A ranenina·tigra», que duran· mandante tirou-a do pé do muJeque
quetique das unhas da cria sobre o te todo o dia estivera muito quieti- e levantando·a no ar deu·lhe dois
oleado. nha, sempre a dormitar na cesta, autênticos piparotes, lev[ssimos,
De volta das compras o cozi· logo que apitou a silêncio voltou a um em cada bochecha. Sob o ultra-
nheiro trouxe noticias de sensaçlo. portar·se mal, recomeçando o seu je, a «menina·tigraJJ teve um aces-
Durante a noite um leopardo passeio na diagonal da camarinha, so de fúria, terr[vel. Jogou as garras
havia saltado de salto prodigioso a tiquetique, com as unhitas a tinir para a frente na esperança de ferir.
paliçada forUssima que cercava o no oleado, somente socegando ao Mesmo no ar, bastando-lhe como
quintal da feitoria alemll e tinha da· romper da alvorada. apoio a mIJo que a suspendia, BT-
do morte a tudo quanto nlo encon· mou o salto, dentuça arreganhada.
trara sob invanc/vel protecçl.o: E como o comandante da lIMarra·
galinhas, patos, perus, a cadela e Passaram-se algumas semanas. cusne. a largasse, manifestou to-
um macaco. E na areia da praia A lII1lenina'ôgt8Jfjá estava do ta- dos os sintomas de ataque
viam'se, n/tidas, as pegadas, desde manho de um gatarr4o, só lambia epil6tico.
a feitoria .4 ponte. Não tinha pois o leite como pitéu e exif1Ja, como re- Nenhum dos remédios adopta-
havido alucinaçl.o a bordo da lIMar· feição sólida, carne fresca. dos lhe valeu: nem os borrifos de
racuenell. O leopardo. na verdade. Um dia o muJeque Amadi ser· água na cara, nem o amonfaco nas
viera da floresta de MaJatane no via o almoço a coxear, com um cal· ventas.
taSCO das crias, sucessjvamente a canhar cortado fundo na ostre1l8 da Uma última convulsão e que-
ambos os s/tios por onde elas ti· ilha de Ma/amede . d(jziua Soltanl dou·se mteiriçada - morta de fúria:
nham sido distribui das, Na felton'a, Hassani», como lhe chamavam os de tal raça era aquela I(menina·
escalara e matara. Na ponte..aais, árabes. ·tigralJ.
impotente, rugira. E todos entraram De repente a bicheza saltou no A guarnição não quis mais bi·
em perguntar a si próprios que negro e com assombrosa certeza da cheza a bordo.
mais viria a acontecer. golpe fincou as garras de ambas 8S
Passado o sol·posto ninguám mãos em cada um dos lábios de fe· (ln ~EsCOJII de MousinhC)jJ, de Eduardo Lupi).
quis ir a terra, nem mesmo o co- rjda ao mesmo tempo que com a
mandante. Mas na testa da ponte· lfngua ch upav8 o sangue .
..aais não se renovou a ária, nem Era preciso intervir. Deitando· Silva Braga,
naquela noite nem em nenhuma ·lhe a mão a pele do cachaço o CO° v/alm
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