Page 10 - Revista da Armada
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de  Noronha  preferiu  não correr  riscos   todos. apinhados. a maior parte sem ar-  aquela que tomara  a Melique Saca.
           escusados. Como, entretanto. anoitecera.   mas, na mais completa confusão. Nessa   Satisfeitíssimo com o valioso troféu
           resolveu deixar para odia seguinte a tras-  altura,  sublevaram*se  os  remadores da   que lhe caía do céu,  mandou este colo-
            fega da carga da nau.  E, para evitar que   galé, que eram quase todos .. mouros_, e   car a nossa galé em terra, debaixo dum
           ela se pudesse escapar a coberto da escu-  começaram a agredir os portugueses que   telheiro,  para  mostrar  ao  povo  e  aos
           ridão.  mandou passar um cabo da proa   estavam debaixo do toldo com as pedras   visitantes.  como prova de que afinal'OS
           da galé  para  a  popa da  nau.    e  os  zargunhos  de  que  havia  grande   Frangues  (os  Portugueses)  não  eram
              Feito  isto  e  montada  a  vigilância.   quantidade  espalhados  pelo  fundo  da   invencrveis. E a partir daí cresceu o atre*
           encostaram-se os portugueses para dor-  galé.                        viOlento das fustas de Diu em relação aos
           mir um )X>Uco,  à excepção. naturalmen-  Houve ainda um português corajoso   nossos  navios.
           te. do pessoal encarregado da vigilância.   que, à custa da própria vida.  foi  à proa   Completamente  ignorante  de  todos
           De resto. a situação da galé parecia bas-  cortar O cabo que estava passado para a   estes acontecimentos. D. Duarte de Me-
           tante  segura.  Estando  muito  perto  da   nau.  Mas, como é evidente, o seu sacri*   neses.  quando chegou às  proximidades
           nau ,  não  corria  perigo  de  ser atingida   fício  para  nada  serviu  porque  a  galé   de  Diu,  deixou-se  por ali  ficar durante
           pela artilharia desta;  estando pela  popa   continuava  firmemente  aferrada  pelos   algum tempo às  presas. apesar de seve-
           e  com  os  canhões  principais  voltados   mastros.                 ramente  critica.do  por  seu  innão  que
            para  cla.  poderia afundá-la  facilmente.   A coberto dos arremessos dos rema*   considerava  tal  actividade  indignA  dum
           ao menor sinal de resistência; não estan-  dores. um numeroso grupo de "mouros»,   Governador.  Pela sua  parte,  dirigiu-se
           do  atracada  à  nau.  não  tinha  a  recear   annados de lanças e espadas, e protegi-  aquele  directamente  para  Chaul  onde
           quaisquer  arremessos  de  projécteis  da   dos  com escudos.  entrou  pela  proa  da   D.  Duarte  de  Meneses  se  lhe  juntou
           sua  parte. E a noite decorreu tranquila,   galé e  foi  investir os nossos que conti-  alguns dias  mais tarde.  Como era fácil
           num silêncio só quebrado pelo marulhar   nuavam abrigados debaixo do toldo. sem   de prever, nessa altura já era do domínio
           da  ondulação  contra  os  costados  dos   saber  que  fazer.  completamente  des-  público a fonna vergonhosa como Fran-
           navios.                            moralizados.  Após um  breve  combate,   cisco de Noronha se comportara quando
              Anconteceu  porém  que,  um  pouco   todos os portugueses foram obrigados a   do avistamento da nau de Cambaia que
           antes dos primeiros alvores.  a  nau  que   saltar para a água. onde pereceram afa-  levava  a  reboque  a  galé  tomada  a  seu
           fora descaindo lentamente para cima da   gados  ou  foram  acabados  à  lançada.   innão. Perante a indignação dos fidalgos
           galé.  acabou  por  ficar encostada a ela.   Souberam  então  os  _mouros».  por   em  relação a um  procedimento que de-
            Não pareceu aos vigias que isso tivesse   intennédio  dos  remadores.  que aquela   sonrava o  País e a Nobreza.  D.  Duarte
           importãncia  de  maior  e  nada  fizeram   galé fazia  parte de uma grande annada   de Meneses mandou prender D. Frnncis*
           nem  disseram.  Mas os  .. mouros_,  pen-  com que o  governador da ÍIldia  regres-  co.  Porém.  como  era  hábito  na  índia,
           sando que aquela poderia bem ser a sua   sava  de  Ormuz.  Sem  mais  delongas.   algumas semanas depois. perdoou-lhe e
           última noite, mantinham-se bem desper-  lomaram-na a  reboque e  voltaram para   mandou-o  pôr em  liberdade.
           tos. atentos a tudo quanto se passava à   trás na intenção de se irem acolher a Diu.   Será oportuno chamar a atenção para
           sua  volta.  Quando  viram que a  galé  se   Já nas proximidades desta cidade, foi   o  facto  de  que  o  costume,  então  em
           encontrava encostada à nau e que os seus   a nau alcançada por Outra galé portugue-  vigor.  de os capitães  só actuarem com
           mastros. oscilando com o balanço. quase   sa. capitaneada por Francisco de Noro-  o  acordo expresso dos  outros  fidalgos,
           tocavam na borda desta. compreenderam   nha que f'"ra  irmão de Bastião de Noro-  e muitas vezes até dos próprios soldados.
           que  Alá  lhes  estava  oferecendo  uma   nha.  Reconheceu  aquele  perfeitamente   diluía consideravelmente a responsabili-
           oportunidade  única  para  se  salvarem.   que a  galé que a  nau  levava  a  reboque   dade do comando. sobretudo quando as
           E. pela calada. annaram-se rapidamente   era a de seu  innão mas nada  fez.  para a   coisas corriam  mal.
           e.  sem  fazerem  rufdo.  amarraram com   recuperar.  A  razão disso foi  que pouco
           fortes cabos os mastros da galé à borda   antes linha capturado uma "nau de Meca_
           da  nau.                           e levava a galé tão carregada com o des-
              Sonolentos,  os  nossos  vigias  não   pojo que não havia espaço suficiente para
           deram  por nada.  Só quando começou a   manobrar os canhÔCs.  Quando manifes*
           clarear é  que sentiram que havia  qual-  tau  a  intenção  de  ir  recuperar  a  outra
           quer coisa de estranho no balanço do seu   galé.  foi  de tal  modo contrariado  pelos
           navio. Olharam para cima e perceberam   fidalgos  e  soldados  que  iam  consigo,
           então o que se passara.  Dado o alanne.   receosos  de  terem  de  alijar  parte  do
           acordaram os portugueses estremunha-  saque que tinham  a  bordo,  que acabou
           dos. mas antes que tivessem [ido tempo   por desistir.  Comprometeram-se então
           para pegar nas annas, já cara sobre eles   todos eles a nada dizer do acontecido e
           uma  saraivada de pedras.  nechas e zar-  a seguir viagem como se nada tivessem
                                                                                               Satumj"o Monteiro.
           gunhos (espécie de dardos) que os -mou-  vislo. Chegada a galé a Chaul, venderam
                                                                                                            CMG
           ros_ lhes lançavam de cima em profusão.   aí os despojos da nau que haviam captu-
           fazendo  grande  algazarra.       rado  e  dividiram  entre  si  o  dinheiro
              Completamente desnorteados, solda-  obtido,  de  acordo  com  as  regras  em   Bib/ir,grajia:  .D~scohrimetHo ~ CQlrqlflsta r/fl
           dos  e  marinheiros  fugiram  instintiva-  vigor.                    I"dia ~IQ$ Panugueser>o de F~nulo l.apts J~ Cas-
                                                                                l(1Irh~Ja: .DiroJas_ de lodo de &rros: .ÚMas
           mente para debaixo do  toldo que havih   Quanto à  nau  de Cambaia, que não   da  Indif/_  d~ Gaspar CarrlÍa.
           à  ré  da  galé,  onde  se  encontravam  o   ganhou  para  o  susto  quando  avistou  a
           capitão e os outros fidalgos. indo muitos   segunda  galé  portuguesa.  chegou  sem
           deles já bastante  feridos .  E  ali  ficaram   mais sobressaltos a  Diu. onde ofereceu   ••••••••••••••••••

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