Page 382 - Revista da Armada
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MARTIM AFONSO DE SOUSA
O patrono do novo curso
O patrono do novo curso
da Escola Naval (1998)
da Escola Naval (1998)
artim Afonso de Sousa nasceu em sul, construindo uma pequena fortaleza no A 12 de Maio de 1534 seguiu para a Índia,
Vila Viçosa, no ano de 1500. Era Rio de Janeiro e entrando pelo rio da Prata, comandando uma frota de cinco navios. Foi
Mfilho de Dona Brites de Albuquer- onde deixaram colocados dois padrões por- nomeado Capitão-mor, pelo Governador
que e de Lopo de Sousa, fidalgo da casa do tugueses. No regresso dessa longa viagem, e Nuno da Cunha e, de imediato, foi encar-
Duque de Bragança (D. Jaime) e membro do ainda antes de tomar o caminho de Lisboa, regado de atacar e subjugar Damão, uma
conselho de D. Manuel. Com a idade de Martim Afonso de Sousa lançou as bases para praça de onde partiam constantes acções
dezasseis anos, passou a acompanhar o prín- a fundação e desenvolvimento da capitania contra Baçaim, que estava ocupada pelos
cipe herdeiro da coroa, e quando o Duque de S. Vicente, distribuindo terras e encargos portugueses. A forma como resolveu este
pretendeu oferecer-lhe o cargo de alcaide de por alguns dos homens que o acompa- problema valeu-lhe grande consideração da
Bragança, procurando recuperá-lo para o seu nhavam. Mas, enquanto procurava recuperar parte do rei de Cambaia, que acertou pazes
serviço, declinou todos os benefícios que os navios avariados naquela acolhedora com os portugueses e solicitou auxílio para
dele recebia, preferindo ficar junto do futuro enseada, enviou seu irmão com duas carave- umas suas campanhas militares no interior,
rei D. João III. Na corte real fervilhava um las, para que regressasse a Portugal com notí- prestando-se a deixar construir uma fortaleza
ambiente em que os conhecimentos em Diu, o que era uma aspiração por-
matemáticos, astronómicos e geográfi- tuguesa desde o princípio do século.
cos eram cultivados pela mais alta Mas resolvidas que foram estas questões,
nobreza portuguesa. O Doutor Pedro no ano que se seguiu, o rei de Calecut
Nunes fora encarregado da formação rompeu a paz com o de Cochim e pre-
dos príncipes, mas à sua volta reunia-se tendeu invadir os seus territórios. Os por-
uma tertúlia cultural muito mais vasta, tugueses consideravam este ultimo um
englobando jovens fidalgos de diversas aliado de grande importância, com
origens, que cultivavam o novo saber re- quem tinham feito paz e amizade nos
nascentista e viviam deslumbrados pelas tempos da primeira viagem de Vasco da
recentes viagens marítimas portuguesas, Gama, não podendo deixar de o ajudar.
aprendendo tudo o que se relacionava Foi Martim Afonso de Sousa que, de no-
com o mar e com a navegação. Martim vo, se fez ao mar dirigindo-se para o sul.
Afonso de Sousa foi um destes estudio- A sua acção foi, de facto, decisiva e
sos formados pelo grande mestre mate- oportuna, e a campanha que desenvol-
mático português e os conhecimentos veu na costa do Malabar saldou-se por
que obteve virão a ser muito impor- uma devastadora vitória sobre o samorim
tantes para as navegações que vão pre- de Calecut, para além de ter conseguido
encher uma grande parte da sua vida. destruir a esquadra de Patenamar, um
Pelo final dos anos vinte, a Europa temível pirata daqueles mares.
vivia a tensão provocada pela rivalidade Voltou para Portugal em 1539, mas os
política entre Francisco I, rei de França, feitos que fizera na Índia aconselhavam
e Carlos V, imperador da Alemanha, o seu nome para Governador daquelas
que herdara também toda a Espanha paragens, e el-Rei fê-lo regressar ao ori-
com as suas “Índias Ocidentais”. Nesta ente em 1541. Desempenhou o cargo
fase do conflito, D. João III favoreceu o durante três anos, sendo notória a sua
partido do Imperador e isso fez com os habilidade política, manifestada na
navios franceses começassem a apare- Livro de Lisuarte de Abreu, 1558. forma como soube lidar com os potenta-
cer na costa brasileira, em preparos de dos do Indostão e como resolveu alguns
guerra e disputando o comércio português. cias para o rei. Foram essas duas caravelas dos mais graves problemas económicos que
Martim Afonso de Sousa partiu para essas que se depararam com os franceses estabele- se colocavam aos interesses régios, naquelas
paragens a 3 de Dezembro de 1530, como cidos em Pernambuco, preparando-se para paragens. Quando foi substituído por D. João
capitão-mor de uma esquadra de cinco distender a sua acção para o interior do ter- de Castro, em 1545 – segundo as suas
navios, cuja missão principal era expulsar e ritório, a partir de uma pequena fortaleza que próprias palavras -, “entregou a Índia muito
castigar os franceses, mas que deveria pro- já tinham construído. Os navios inimigos pacífica, e a gente de el-Rei nosso senhor e
ceder, também, ao reconhecimento geográfi- foram tomados com toda a carga que trans- suas armadas mui acreditadas”.
co de toda a costa, explorar a entrada de portavam e a anterior posição portuguesa, Nessa altura voltou para Lisboa, ingressando
alguns rios mais importantes e tentar estabele- junto da actual cidade de Olinda, foi recon- no Conselho de Estado e ocupando o cargo
cer núcleos populacionais que pudessem vir quistada, provendo-se a sua segurança contra durante o resto do reinado de D. João III,
a ser pontos de partida para uma futura colo- futuros percalços. Martim Afonso de Sousa durante a regência de Dona Catarina e, a par-
nização. Logo depois de terem avistado terra chegou a Lisboa em Agosto de 1533, e a mis- tir de 1568, já com D. Sebastião. Faleceu por
brasileira, depararam-se com vários navios são militar-naval, que cumprira da melhor alturas de 1570.
franceses que conseguiram derrotar, apreen- forma, pode considerar-se como o ponto de
dendo-lhes toda a carga, artilharia e pólvora. viragem decisivo para uma nova posição de J. Semedo de Matos
Depois seguiram no reconhecimento para Portugal em terras brasileiras. CTEN FZ
20 DEZEMBRO 98 • REVISTA DA ARMADA