Page 114 - Revista da Armada
P. 114

PONTO AO MEIO-DIA





                                 Cartografia Marítima


                              Um Imperativo Público





                cartografia marítima é decisiva desnecessário incrementar os esforços menor custo e risco, se obter a infor-
                no progresso de Portugal, por- de investigação para fins cartográficos; mação, disponibilizar os produtos e
          Aque precede qualquer outro por outro lado, porque as cartas maríti- dispor das capacidades que uma multi-
          tipo de utilização permanente e ren- mas (náuticas, sedimentológicas, bati- plicidade de utilizadores necessita para
          tável dos oceanos. Ontem, como na métricas, de apoio às pescas, para na- actuar nas áreas do desenvolvimento e
          actualidade, ao determinar os custos e vegação de recreio, etc.) são vendidas a da segurança nacional. Por isso, fre-
          os riscos da utilização do mar, interfere um preço marginal, quando compara- quentemente é uma tarefa confiada em
          em actividades essenciais ao desen- do com os custos da sua produção, grande parte aos serviços hidrográficos
          volvimento; ao condicionar o desem- consideram essa actividade ruinosa das Marinhas de Guerra, entidades
          penho dos navios da Armada, afecta a para o Estado, pelo que pode ser pro- com responsabilidades naquelas duas
          capacidade de realizar as operações gressivamente confiada a entidades áreas. Todavia, apenas com investimen-
          necessárias à manutenção da segu- privadas com interesses específicos no to adequado poderão cumprir as tare-
          rança.                            mar.                               fas que lhes competem no capítulo da
            Na perspectiva do desenvolvimento,  Relativamente ao esforço de investi- cartografia marítima.
          a cartografia marítima, por ter relevân- gação, importa esclarecer que a tecnolo-  O actual Director do Instituto Hidro-
          cia na exploração de recursos, nas obras gia evolui constantemente, novos peri- gráfico tem reiterado o cometimento a
          costeiras e portuárias, na gestão do li- gos são encontrados frequentemente e este Instituto do projecto de extensão
          toral e na segurança da navegação: con- os requisitos de utilização do mar são da Plataforma Continental, à luz do
          tribui para a rentabilidade das activida- cada vez maiores. Por isso, a cartografia Direito Internacional, como a mais
          des piscatórias e mineralíferas; influen- marítima obsolesce em poucos anos e importante tarefa cartográfica nesta
          cia a localização das indústrias que, deixa de servir as necessidades dos transição de século. A sua execução
          preocupadas com o competitividade seus utilizadores. Nenhum país, nem obriga à reconversão e ao reequipa-
          global, procuram acessos fáceis e rápi- mesmo os mais ricos e poderosos e mento urgente dos dois navios hidro-
          dos aos mercados de importação e com reduzidas costas marítimas, con- gráficos da classe “D. Carlos I”. O inves-
          exportação; facilita a expansão do turis- seguiu ainda concluir ou sequer abran- timento necessário, sendo desprezível
          mo associado à navegação de recreio e à dar o ritmo das investigações hidro- quando comparado com os custos de
          indústria dos cruzeiros; e reduz a pro- -oceanográficas com finalidades car- manutenção anual das estradas e das
          babilidade de ocorrência de acidentes tográficas, apesar do extraordinário ferrovias nacionais, proporcionará
          que coloquem em perigo os navios, as aumento de rendimento dos trabalhos benefícios do maior significado para
          tripulações, as cargas e, consequente- de mar e dos estudos de gabinete.  um pequeno país, periférico em termos
          mente, os ecossistemas marinhos.    Quanto aos custos importa referir de transportes terrestres, mas central,
            No campo da segurança, a Armada que o valor de uma carta náutica não por localizado na encruzilhada das
          necessita de estar apta para realizar ac- se pode reflectir no seu preço. Como principais rotas marítimas mundiais.
          ções militares de diversos tipos, para bem público deve ser acessível aos  Por isso, por mais difícil ou com-
          além de tarefas de busca e salvamento, mais diferentes utilizadores. Este as- plexa que seja a situação de Portugal,
          de fiscalização das pescas, e de protec- pecto é significativo porque, quando as por prementes que sejam outras activi-
          ção ambiental. Em todas estas acções a actividades cartográficas são privadas, dades, não empregar, em tempo, os
          informação cartográfica é essencial pa- apenas permitem a satisfação de neces- recursos indispensáveis àquela tarefa,
          ra: a utilização de rotas mais curtas e sidades económicas específicas de equivale a hipotecar irremediavel-
          seguras; a movimentação dos navios a curto prazo, e nunca se alcança um mente o futuro. Conduz a deixar a ou-
          maiores velocidades; a patrulha de mínimo de coordenação entre os pro- tros a iniciativa e a primazia de esco-
          áreas com menos meios; as operações motores de diferentes estudos. Em lha. Infelizmente, no passado repeti-
          de limpeza de minas; as acções anti- consequência, a cobertura cartográfica mos este erro demasiadas vezes e
          -aéreas, anti-superfície e anti-submari- reduz-se drasticamente e os benefícios encontramo-nos na iminência da sua
          nas; e o apoio à movimentação estra- de acesso a essa informação são anula- reincidência, quando se perspectiva a
          tégica de meios para teatros de ope- dos.                            redefinição dos limites de jurisdição
          rações diversificados e distantes.  A experiência verificada em diversos marítima dos Estados ribeirinhos.
            Como o país atingiu um nível razoá- países comprova claramente que a
          vel de conhecimento do mar, há opi- realização da cartografia marítima com           António Silva Ribeiro
          niões que, por um lado, consideram meios públicos é a única forma de, ao                          CFR



         4 ABRIL 2001 • REVISTA DA ARMADA
   109   110   111   112   113   114   115   116   117   118   119