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Em 1951 foi professor catedrático do  Presidiu à Comissão para a moderni-  Segundo o Dr. Pedro Abellana, profes-
         Instituto Superior de Agronomia, transitando  zação do ensino da Matemática nos liceus  sor da Universidade de Madrid, foi o
         por convite para a Faculdade de Ciências.  portugueses, onde promoveu e orientou  maior matemático de todos os tempos
           Foi director do Centro de Estudos  “experiências-piloto” decisivas naquela  nascido na Península Ibérica, faltando-lhe
         Matemáticos de Lisboa durante cerca de 20  modernização, a nível secundário. Muitas  apenas a consagração formal no mundo
         anos, desenvolvendo aí uma acção notável  dessas experiências tiveram grande  científico, especialmente no seu próprio
         na formação de investigadores. Desde 21  impacte a nível internacional, tendo sido a  país.
         de Abril de 1966 foi sócio efectivo da Aca-  origem de projectos semelhantes em vários
         demia de Ciências de Lisboa, tendo tam-  países. Foi o introdutor do método heurísti-
         bém sido membro da Comissão Portuguesa  co (indução matemática) nos programas do   Jorge Manuel Moreira Silva
         de União Matemática Internacional.  3º ciclo liceal. Faleceu em 1972.                               1TEN


         Notas:                               (11) Na verdade, tratava-se, já, de um problema  se fosse demasiado humilde (e era, de facto!) para
           (1) Nos trabalhos que publicou em Coimbra  muito antigo. Não é de excluir a hipótese da  se aventurar em campos inexplorados.
         denominava-se Petrus Nonius Salaciens  menção ao Príncipe se enquadrar nas habituais  (19) Escrito em Castelhano, língua que Nunes
           (2) Apesar das suas origens judaicas, Pedro  cortesias entre um autor e o seu mecenas ou nas  dominava (vivera em Espanha e era casado com
         Nunes nunca foi perseguido, pois sempre gozou  diligências para dar um maior peso e uma maior  uma espanhola) por entender ser a língua mais
         das simpatias e favores da Corte (ainda hoje se  legitimidade à obra.  comum na Península Ibérica e por aspirar a uma
         especula sobre os motivos de tais simpatias). As  (12) Designação atribuída por Snellius em 1624.  maior divulgação da obra.
         tenças que lhe foram atribuídas ao longo da vida  (13) Este experimentado navegador e fundador  (20) Apresente-se, a título de curiosidade, um
         foram sempre generosas e permitiram-lhe levar  das primeiras colónias portuguesas no Brasil fez a  exemplo da notação utilizada por Pedro Nunes (já
         uma existência bastante desafogada.  experiência, ao sair do Rio da Prata para Lisboa,  em grande parte generalizada na época), que atribuía
           (3) E para além das matemáticas, Pedro Nunes  de seguir continuamente um rumo para Leste, con-  à variável x o símbolo co (cousa), ao seu quadrado o
         também se viria a dedicar à Geografia, à Física, à  vencido de que, ao descrever um arco de círculo  símbolo ce (censo), ao seu cubo o símbolo cu (cubo)
         Cosmologia e... À Poesia!          máximo (como julgava ser a linha de rumo) per-  e à soma o operador p (plus). Quem, numa primeira
           (4) Pedro Nunes é, precisamente, um dos que  pendicular ao meridiano de partida, acabaria por  análise, consegue ler em 12.cu.p.18.ce.p.27.co algo
         marcam essa transição, pois referia-se à Astrologia  interceptar o Equador. Acabou, no entanto, por  como 12x3+18x2+27x?
         (na sua componente divinatória) como “crendice  navegar ao longo do paralelo de partida, paralela-  (21) Que foi pioneiro na análise científica do con-
         vã e já quasi rejeitada que emite juízos sobre a  mente ao Equador e sem se aproximar deste.  teúdo da obra de Pedro Nunes.
         vida e a fortuna”. No entanto, um episódio carica-  (14) Em 1566, na obra De Arte Atque Ratione  (22) Restauração (1640) e Fundação da Naciona-
         to atribui-lhe, em 1568, uma advertência à  Navigandi, uma actualização, impressa em latim,  lidade (1143)
         regente, D. Catarina, de que os astros estariam em  do Tratado de Certas Dúvidas da Navegação, corri-  (23) Da comissão fazem parte três distintos
         posição desfavorável para o momento da  giria este aspecto, afirmando que estas rotas se  Oficiais de Marinha: CMG Estácio dos Reis, CFR FZ
         coroação de D. Sebastião, pelo que vaticinava  aproximam dos Pólos, sem, contudo, os atingir,  Semedo de Matos e CTEN Costa Canas!
         várias desventuras para o seu reinado. Na ver-  dando um número infinito de voltas em torno deles.
         dade, talvez tal vaticínio se devesse exclusiva-  (15) Da leitura da obra de Pedro Nunes, fica-
         mente ao facto de Pedro Nunes conhecer bem o  nos a ideia de, já na Antiguidade, Ptolomeu se ter  Agradecimentos:
         carácter intempestivo do seu antigo discípulo ou,  apercebido de que nem sempre as linhas de rumo  Ao Sr. Comandante Costa Canas, pelos esclareci-
         então, apenas à avançada idade do Cosmógrafo.  descreviam arcos de círculo máximo, o que é con-  mentos técnicos prestados durante a redacção deste
           (5) Pedro Nunes foi várias vezes confundido  troverso e talvez seja sugerido pelo facto do  artigo.
         com outros dois Doutores homónimos seus con-  Cosmógrafo pretender revestir as suas afirmações
         temporâneos: o Doutor Pedro Nunes, vedor da  da autoridade de um sábio da Antiguidade
         Fazenda Real na Índia em 1522 e reitor da  Clássica, como era apanágio dos intelectuais do  Bibliografia:
         Universidade de Lisboa em 1536, e o Doutor  Renascimento. Agora, uma coisa é certa: foi Pedro  • COSTA, A. Fontoura da, A Marinharia dos
         Pedro Nunes, inquisidor em Lisboa em 1565.  Nunes o primeiro a descrevê-las matematicamente  Descobrimentos, 3ª edição, Agência Geral do
           (6) Uma das suas poucas publicações em Portu-  e a encontrar uma forma de as traçar na carta.  Ultramar, Lisboa, 1960
         guês, juntamente com o  Tratado de Certas  Também encontrou um método de traçar a derrota  • COSTA, A. Fontoura da, Pedro Nunes (1502-
         Dúvidas da Navegação e com o Tratado em  ortodrómica (segundo um arco de círculo máximo,  1578), Agência Geral das Colónias, Lisboa, 1938
         Defensam da Carta de Marear, editadas no mesmo  portanto, a distância mais curta a percorrer entre  • COSTA, A. Fontoura da, “Quarto Centenário
         ano – 1537. Á medida que foi ganhando noto-  dois pontos sobre a superfície terrestre), assim  da Publicação do ‘Tratado da Sphera’ de Pedro
         riedade, Nunes passou a preocupar-se mais com a  como uma regra prática para a seguir, através da  Nunes”, Petrus Nonius, Lisboa, 1938, vol. I, fasc.
         divulgação internacional dos seus trabalhos,  relação da latitude do lugar com o rumo do troço  4, p.p. 337-356
         redigindo-os na língua franca internacional da  a percorrer.            • COUTINHO, D. F. M. de, “Notícia Crítica
         época – o Latim.                     (16) As cartas de navegação da época represen-  das Várias edições das Obras Matemáticas de
           (7) A aula (e o cargo associado) manteve-se até  tavam a Terra como se esta fosse cilíndrica, apre-  Pedro Nunes”, Anais do Clube Militar Naval, vol.
         1779. Por essa altura foi criada a Academia Real  sentando todos os paralelos com o mesmo compri-  LIV, Lisboa, 1923
         da Marinha que, embora sem passagem formal do  mento. Desta forma, eram introduzidas graves dis-  • CRATO, Nuno, “Pedro Nunes, Mercator e
         “serviço” acabou por englobar as funções que  torções pois, além das deformações do aspecto  Escher”, Expresso (Revista), Lisboa, 13 de Feve-
         eram da responsabilidade do Cosmógrafo-mor.  físico da Terra, também se deformavam as linhas  reiro de 1999
           (8) Fontoura da Costa aponta Pedro Nunes  de rumo. Estas eram apresentadas partindo, como  • LEITÃO, Prof. Dr. Henrique, A Quadratura do
         como uma das três grandes figuras do séc. XVI, ao  vários raios, de várias posições na carta para os  Círculo: Pedro Nunes na Historiografia dos
         lado de Camões e do historiador João de Barros,  diferentes destinos a que os navegantes pre-  Descobrimentos Portugueses, I Seminário
         os três testemunhas do apogeu do Império, os três  tendessem chegar, o que, sobreposto à grade das  Internacional de História da Náutica, Escola
         com obras editadas ainda em vida e os três afortu-  latitudes e longitudes, resultava numa quadrícula  Naval, 22 de Janeiro de 2002
         nadamente desaparecidos antes da perda da inde-  no mínimo confusa.     • MAOR, Eli, Trigonometric Delights, Princeton
         pendência nacional.                  (17) E, no entanto, no seu Roteiro do Mar Roxo,  University Press, Princeton, 1998
           (9) Conhecido como “o Euclides da Companhia  D. João de Castro, que examinou, na prática,  • MOTA, A. Teixeira da, Os Regimentos do
         de Jesus”, foi um dos obreiros da reforma do  várias teorias do seu mestre, partilha da sua severi-  Cosmógrafo-mor de 1559 e 1592 e as Origens do
         Calendário patrocinada por Gregório XIII, em  dade em relação à suposta falta de rigor de alguns  Ensino Náutico em Portugal, Junta de Investigação
         1582.                              pilotos. Mais tarde, porém, acabaria por admitir  do Ultramar, Lisboa, 1969
           (10) O surgimento desse ensino foi tardio e ini-  que técnicas como as do cálculo da latitude pelas  • QUEIRÓ, João Filipe, A Matemática em
         cialmente associado, de um modo empírico, à  observações extrameridianas do Sol não eram sufi-  Portugal Antes de 1775, Departamento de
         Náutica, tendo como principais fontes as universi-  cientemente práticas para uso corrente.  Matemática - Universidade de Coimbra, 1996
         dades de Salamanca e Toledo. Só com Pedro  (18) Na sua álgebra, o Matemático não consi-  • TEIXEIRA, Francisco Gomes, História das
         Nunes viria a ser introduzida uma fase teórica que  dera o 0 como um número (embora pressinta a sua  Matemáticas em Portugal, Academia das Ciências
         integrava os conceitos empíricos existentes  necessidade) e não admite a existência de  de Lisboa-Biblioteca de Altos Estudos, Lisboa,
         (alguns deles geniais, como os que foram apresen-  números negativos. Também “esbarrou” na noção  1934
         tados no Esmeraldo de Situ Orbis de Duarte  de contínuo dos Números Reais, contornando esse  • VENTURA, Manuel Sousa, Vida e Obra de
         Pacheco Pereira ou no Livro da Marinharia de  problema por via geométrica (sempre!). Fica sem-  Pedro Nunes, 1ª edição, Lisboa, Biblioteca Breve
         João de Lisboa).                   pre, porém, no limiar dos novos conceitos, como  (Instituto de Cultura e Língua Portuguesa), 1985
                                                                                      REVISTA DA ARMADA • MARÇO 2002  21
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