Page 313 - Revista da Armada
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reabilitação dos caminhos-de-ferro em An-
         gola. Os indianos procuram controlar o li-
         toral africano do Índico. Os brasileiros pro-
         curam assumir-se como potência regional
         do Atlântico Sul desenvolvendo uma forte
         aproximação a Angola.
           Os países estrategicamente mais bem po-
         sicionados em África falam português. Uns
         porque se encontram no controlo das linhas
         de navegação (Cabo Verde, STP), outros são
         ricos em recursos naturais e petróleo (Angola   A bela marginal do porto de Luanda. A cidade está quase irreconhecível com o elevado número de obras
         e potencialmente STP), outros poderão vir a   em curso.
         ser ricos graças ao petróleo (Guiné) e outros  ao Golfo da Guiné (mais de 2200 milhas =   Há, também, muitos outros países, nomea-
         ainda têm um grande potencial como pres-  3 vezes a distância Lisboa – Ponta Delgada).  damente europeus, que gostariam de se re-
         tadores de serviços aos países vizinhos, no  Ter navios implica conhecimentos náuticos,  lacionar com África, mas precisam de quem
         turismo e na exploração do mar (Moçambi-  conhecer o mar, ter portos capazes, ter siste-  lhe proporcione o necessário relacionamen-
         que). Angola e Moçambique lideram mesmo  mas de gestão logística, etc, etc. Esta é uma  to. Portugal pode ser o promotor desta apro-
         a lista de países africanos com maior índice  área em que Portugal detém conhecimento e  ximação desde que daí resultem benefícios
         de crescimento económico, sendo Ango-  experiência e, por isso, poderia ser um exce-  tripartidos, que podem passar pela partici-
         la o sétimo país a nível mundial. Portugal  lente projecto para Angola desenvolver com  pação nos projectos.
         tem com todos eles uma relação fraterna  a colaboração de Portugal. Equivalentes ne-  Embora se possa pensar que os chineses,
         de respeito que perdura e que se manifes-  cessidades têm os restantes países africanos  americanos, brasileiros, indianos, já estejam
         ta na “fala”.                      de língua portuguesa.              a dominar as principais áreas estratégicas em
           A fórmula para Portugal desenvolver uma   Portugal deve ser capaz de obter da União  África, a verdade é que o continente é enor-
         nova grande estratégia nacional é muito sim-  Europeia o patrocínio para as acções de co-  me e não faltam oportunidades. Pode mes-
         ples, se ajudarmos a promover a segurança  operação e para projectos estratégicos em  mo dizer-se que há oportunidades à escala
         passa a ser possível a mobilidade e o de-  África. A UE tem todo o interesse geopolíti-  de Portugal, é preciso é identificá-las e esta-
         senvolvimento. Quem ajudar nesta fase cria  co e geoeconómico no desenvolvimento de  belecer uma aproximação estratégica para a
         os laços de confiança que facilitarão novos  África e deve saber reconhecer a excepcio-  sua transformação em mais-valias para Por-
         projectos de cariz cultural, social e económi-  nal competência de Portugal neste domínio.  tugal e para o parceiro autóctone.
         co. A esta estratégia, que inicialmente visa a  Portugal precisa portanto de uma diploma-
         criação de bem-estar e segurança, deverá ser  cia hábil e de uma engenharia competente   CONSIDERAÇÕES FINAIS
         dada extrema importância à vertente econó-  e visionária.
         mica, que é a que permite o retorno visível   Além do apoio da UE, a melhor parceria   África é assim um novo grande desafio
         do empenhamento.                   que Portugal pode concretizar é, naturalmen-  para Portugal. É importante que se faça uma
           Portugal tem documentação estruturante  te, com o Brasil. A sua vontade de afirmação  reflexão nacional sobre a importância que
         para a política de cooperação portuguesa e  num contexto mundial precisa do apoio e da  África pode vir a ter no nosso futuro.
         tem demonstrado em termos práticos o seu  afirmação da Língua Portuguesa e dos países   De certo que o Oceano, agora Moreno,
         empenho. Parece não haver, no entanto, uma  luso-falantes.            chamará por nós, já que somos, citando
         Estratégia Integral, ao mais alto nível do Es-  Portugal também pode rentabilizar as suas  Ratzel, um país cujo povo tem “sentido de
         tado, que direccione os vários sectores do  boas relações transatlânticas com os EUA,  espaço” e, tal como no passado, o país do
         Estado na consecução dos objectivos nacio-  ajudando-os na sua inevitável penetração  Infante debate-se com o dilema de se en-
         nais em África. O espírito visionário de Sá da  em África. Em qualquer circunstância só  contrar na periferia da Europa em frente de
         Bandeira e a competência prática do grande  valerá a parceria se houver benefícios para  uma imensidão de mar. Há que olhar de
         estrategista Fontes Pereira de Melo têm de re-  Portugal, para os EUA e para África. É funda-  novo para o mar, olhar para sul e fixar o ho-
         nascer na elite política portuguesa.  mental que Portugal não se envolva em pro-  rizonte, aí estão novas oportunidades. Nes-
           Os projectos de cooperação técnico-mi-  jectos que coloquem em causa o capital de  ta corrida, somos europeus, mas não somos
         litar que se iniciaram na década de 80 e de  confiança que conquistou junto dos PALOP.  os últimos da Europa, mas sim os primeiros
         forma planeada nos anos 90 dão hoje resul-  Devemos estudar os outros competidores e  para a corrida do Atlântico Sul.
         tados. Há um enorme capital de confiança  perceber, por exemplo, a má estratégia que   Portugal, onde a terra acaba e o mar co-
         entre Portugal e os PALOP, que deve ser pre-  a França tem vindo a operacionalizar nos  meça, sempre foi um cais de partida para o
         servado e reforçado. Na mente da nova gera-  últimos anos.            Mar Oceano. A viagem que durante cinco
         ção de portugueses, África é de novo sinóni-  Os EUA não têm actualmente capacida-  séculos encetámos pelos mares, além do
         mo de oportunidades. Sinal disso mesmo é o  de para assegurarem a segurança dos ocea-  mar, e, depois, como bandeirantes, através
         facto de, em pouco tempo, Angola ter passa-  nos e protegerem as linhas de navegação.  das selvas e sertões, tornou-nos cidadãos do
         do a acolher mais de 60.000 portugueses que  Falta-lhes a ambicionada “Marinha dos mil  mundo, vagabundos de um sonho universal.
         estão a aproveitar essas oportunidades.  navios” do Almirante Mullen. Desta forma,  Basta, tão só, que não se perca o pragma-
           Oportunidades não faltam, mas é necessá-  precisam do apoio de uma rede de países  tismo da aventura e o realismo do sonho.
         rio enquadrá-las ao mais alto nível do Estado.  que assegurem os “mil navios”. Esta neces-  O que levou e continua a levar os Homens
         O tratamento destas oportunidades deve ser  sidade sentida pelos EUA, se bem aprovei-  aos Descobrimentos é, como diz o Professor
         feito de forma metodológica usando o méto-  tada, pode constituir-se como uma grande  Maltez, essa ideia eterna de ser o Homem
         do de gestão da acção estratégica de modo a  oportunidade para Portugal.  a fazer a História e não a História a fazer o
         enquadrar os vários sectores do Estado. Por   Os chineses têm um enorme capital huma-  Homem, mesmo sem saber que História vai
         exemplo, no 1º Simpósio das Marinhas de  no e financeiro e estão muito interessados na  fazendo.
         Língua Portuguesa ouvimos a delegação de  CPLP. Embora os chineses estejam já forte-  Assim, o que falta a Portugal é querer
         Angola dizer que tem como objectivo, para  mente implantados e tenham em Macau um  de novo!
         os próximos 15 anos, adquirir mais de uma  óptimo espaço de diálogo com África e com                  Z
         dezena de navios oceânicos para contribuí-  os PLP, Portugal ainda tem espaço de mano-  Armando J. Dias Correia
         rem para a segurança marítima de Angola até  bra para participar em projectos.                       CFR
                                                                              REVISTA DA ARMADA U SETEMBRO/OUTUBRO 2008  23
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