Page 314 - Revista da Armada
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ÚLTIMA AQUISIÇÃO DO MUSEU DE MARINHA


                 Uma Bela Agulha de Marear
                 Uma Bela Agulha de Marear




                                                                               XVIII fora, tanto mais que entraram na
                                                                               prática da navegação dois instrumentos,
                                                                               que se devem ao génio inglês -- aqueles de
                                                                               dupla reflexão, dos quais o mais conheci-
                                                                               do é o sextante, e o cronómetro – os quais,
                                                                                                           2
                                                                               no nosso país nunca se fabricaram .
                                                                                 E, no prolongamento do nosso raciocí-
                                                                               nio, concluímos que, pelas razões apon-
                                                                               tadas, D. Rodrigo de Sousa Coutinho,
                                                                               sendo Ministro da Marinha, desde 1795,
                                                                               tinha criado a Sociedade Real Marítima,
                                                                               a qual, entre outros propósitos, se desti-
                                                                               nava a incentivar a produção de cartas
                                                                               náuticas (uma actividade em que tínha-
                                                                               mos sido mestres incontestáveis) e instru-
                                                                               mentos de navegação. Assim, tendo em
                                                                               vista estes objectivos, D. Rodrigo tomou
                                                                               as seguintes decisões:
                                                                                 a) Enviar, no ano de 1798, dois apren-
                                                                               dizes, para Londres, para aprenderem a
                                                                               arte na firma Jesse Ramsden que era, na
                                                                               época, uma das mais importantes na ma-
                                                                               nufactura dos chamados instrumentos
                                                                               de matemática. Seus nomes eram Gaspar
                                                                               José Marques e José Maria Pedroso . 3
                                                                                 b) Contratar, em Londres, um especia-
                                                                               lista no fabrico de instrumentos de mate-
                                                                               mática, de origem alemã de nome Jacob
                                                                                          4
                                                                               Bernard Haas .
                                                                                 Estas medidas foram, sem dúvida, ex-
                                                                               cepcionais, mas não tiveram resultados
                                                                               práticos aceitáveis.
              odos nós sabemos como foram im-  de marear a todos os mais instrumentos   Marques ainda teve oficina, em Lisboa,
              portantes as navegações portugue-  pertencentes à navegação. Mais tarde,  a partir dos anos 20, mas pouco mais fez
         Tsas, para a descoberta do Mundo.  num outro alvará, este de 1706, o mes-  do que reparar instrumentos.
         De facto, a partir, e do século XV, os nos-  mo D. Pedro, agora rei, concedia a José   No que respeita a Jacob Bernard Haas,
         sos pilotos e cartógrafos, melhoram os  da Costa Miranda uma mercê pelo facto  a Marinha atribui-lhe, em 1800, instala-
         métodos de navegação, produziram car-  deste haver en-
         tas náuticas e fabricaram os instrumentos  sinado a sua arte
         náuticos, sem os quais não seria possível  a dois indivídu-
         chegar aos quatro cantos do Mundo.  os e continuava,
           Assim, durante três séculos, os instru-  dizendo, que o
         mentos de navegação foram fabricados  referido José da
         no nosso país e até, por vezes, adaptados  Costa Miranda
         para serem usados a bordo, como aconte-  era o único sujei-
         ceu com o astrolábio náutico, concebido a  to que, no Reino,
         partir do seu congénere planisférico, usa-  sabia fazer car-
         do pelos cosmógrafos da época.     tas de marear e
           Há cerca de 20 anos, escrevemos um  mais instrumen-
         texto , no qual pretendemos mostrar que,  tos para a nave-
             1
         ao entrar no século XVIII, a situação se ti-  gação.
         nha alterado significativamente. De fac-  Deduzimos
         to, por um alvará, ainda do século ante-  que esta situa-
         rior, datado de 1676, o futuro D. Pedro II,  ção, tão degra-
         concedia, a António Miranda, uma mercê  dada no que
         com a condição de este ensinar dois dis-  respeita à ma-
         cípulos, sendo um seu filho e outro sobri-  nufactura de
         nho de João Goês. E, isto acontecia pela  instrumentos de
         simples razão de António Miranda ser o  navegação, se ti-
         único mestre que existia no Reino, exami-  vesse  prolonga-
         nado na arte de fazer astrolábios, agulhas  do pelo século

         24  SETEMBRO/OUTUBRO 2008 U REVISTA DA ARMADA
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