Page 232 - Revista da Armada
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com a Rússia. A invasão da Geórgia pelos  de projecção estratégica e de capacidade  para a política externa e assim para o Po-
         russos, no Verão do ano passado, levou a  de sustentação, que não tem.  der Nacional.
         um «congelamento» das relações.      A Europa tem cerca de 1,3 milhões de   Para o Ministro dos Negócios Estrangei-
           Há algumas semanas, em Bruxelas, os mi-  militares, mas apenas consegue colocar 80  ros, Dr. Luís Amado, e para o Ministro da
         nistros dos Negócios Estrangeiros da NATO  mil em operações. Não sendo projectáveis,  Defesa Nacional, Dr. Nuno Severiano Tei-
         decidiram retomar o Conselho NATO-Rús-  não existem. Mesmo a NRF, cuja capacidade  xeira, para além de um «recentrar» no eixo
         sia, mas, entretanto, Moscovo anunciou um  operacional plena foi anunciada em Novem-  Atlântico e no Mediterrâneo, a NATO deve-
         programa de modernização das suas Forças  bro de 2006, em Riga, tinha apenas 26% das  rá dar maior importância à sua relação com
         Armadas, tendo o presidente Dimitri Med-  forças terrestres em finais de 2008.  o Atlântico Sul, onde Portugal pode ter um
         vedev justificado esta iniciativa com, en-  A NATO actua apenas como instrumen-  papel importante pelas suas relações histó-
         tre outras razões, o contínuo alargamento  to militar, sendo as valências civis desem-  ricas com o Brasil e África.
         da NATO.                           penhadas por outras organizações. Porém,   Portugal encara a NATO como um palco
           Talvez a terceira grande prioridade da  coloca-se a questão se a NATO deve ou  privilegiado no contexto da política externa
         NATO seja definir o espaço geográfico de  não desenvolver capacidades civis, em es-  portuguesa e como um veículo para incre-
         actuação. Nas últimas cimeiras – Praga  pecial se pretender intervir em ambiente  mentar a sua posição na cena internacional.
         (2002), Istambul (2004), Riga (2006) e Bu-  não permissivo.           A posição geográfica portuguesa continua
         careste (2008) – a Aliança tem vindo, ten-  Um quarto tema importante para a agen-  a ser determinante, o que nos permite go-
         dencialmente, a afastar-se de uma agenda  da do novo conceito estratégico deverá ser  zar de um estatuto, de certa forma espe-
         de segurança eurocêntrica e a direccionar-  o próprio processo de transformação da  cial, pela ligação que faz entre os dois la-
         -se, cada vez mais, para uma agenda de  NATO e as constantes mudanças na distri-  dos do Atlântico. Essa realidade aconteceu
         segurança global. Embora a perspectiva  buição do poder e no tipo de forças. À For-  no passado e continuará a acontecer, com
         global seja a que, certamente, mais se ade-  ça de Reacção da NATO (NRF) continua a  tendência para ser fortalecida se a NATO se
         qua aos interesses de todos                                                      alargar ainda mais para Leste
         os aliados, não conta com                                                        ou para Sul.
         consenso, já evidenciado                                                           A solução para a defesa
         pela posição franco-alemã.                                                       europeia deverá passar pela
         A segurança de hoje não                                                          NATO e pela UE. O reforço
         está apenas ligada à defesa                                                      do pilar europeu da NATO
         territorial mas sim, cada vez,                                                   parece merecer o apoio de
         mais ligada ao combate a no-                                                     Portugal. Importa pois defen-
         vas ameaças transnacionais,                                                      der os cenários que melhor
         deslocalizadas, na maioria                                                       salvaguardem os interesses
         das vezes fora das fronteiras                                                    nacionais.
         tradicionais da Europa e que
         exigem uma resposta integra-
         da, na qual o vector militar é                                                   CONSIDERAÇÕES
         apenas parte da solução.                                                         FINAIS
           Assim, é fundamental                                                             Muito ficou por dizer. Cer-
         identificar o espaço geográ-                                                      to é que, independentemente
         fico de intervenção e o tipo                                                      das opções futuras, o passado
         de operações em que a Aliança se deve  faltar o propósito claro. Espera-se um im-  e as capacidades da NATO já demonstra-
         empenhar. Quanto à geografia, as opiniões  portante debate interno entre os aliados,  ram que a Aliança, a bem do mundo, sabe
         variam entre uma NATO global capaz de  enquadrado pelas questões geográficas e  adaptar-se aos novos tempos e é, provavel-
         conduzir operações, especialmente de se-  pela tipologia das operações.   mente, a única organização capaz de mobi-
         gurança, onde necessário, ou uma Aliança   Um quinto tópico a considerar deverá ser  lizar vontades, capacidades e mecanismos
         regional, de defesa colectiva, preocupada  a relação NATO - UE. Dos 27 Estados da  de resposta ao novo ambiente estratégico
         com as ameaças junto à fronteira. Em re-  UE, 21 pertencem à NATO. Os valores e os  internacional. Uma direcção política firme
         lação à tipologia das operações, é preciso  interesses estratégicos são partilhados, pelo  e uma estrutura militar integrada e dinâmi-
         decidir se a Aliança só deve actuar como  que se espera que os europeus assumam  ca serão importantes para a sua adaptação
         instrumento militar e em todo o espectro do  uma maior partilha de responsabilidades  aos novos tempos.
         conflito, ou só em parte do espectro e com  pela sua segurança.          Portugal deposita no mar, de novo, gran-
         valências civis, ou não. Os defensores de                             de esperança. Também chama por nós o
         uma NATO global (atacar o mal na origem),                             “oceano moreno”. Na NATO, que é uma
         enfatizam que só uma Aliança Global pode  IMPLICAÇÕES PARA PORTUGAL   Aliança marítima, sentimo-nos bem. Estas
         fazer face aos desafios globais do presente   Desde a década de 90 que Portugal par-  ideias muito simples escondem um oceano
         e que esta já tem parcerias fora da comu-  ticipa nas principais missões da Aliança  de oportunidades que Portugal deverá saber
         nidade transatlântica, como a Euro Atlantic  Atlântica. Em 1991 com as missões aero-  conjugar e explorar.
         Partnership Council, o diálogo com o Medi-  navais no Adriático, depois na Bósnia-Her-  Neste contexto, aos portugueses é pre-
         terrâneo, a iniciativa de Istambul, e já conta  zegovina, no Kosovo, na Albânia, na Ma-  ciso explicar a importância de uma nova
         nas suas operações com a Austrália, o Ja-  cedónia, no Afeganistão, na missão Active  NATO, que não visa apenas a defesa militar
         pão e a Coreia do Sul. A nova Arquitectura  Endeavour no Mediterrâneo, no Iraque, no  dos aliados mas sim a defesa de um mundo
         passaria assim pela criação de uma Global  Sudão e, no ano passado, na missão de  globalizado, em que o que acontece num
         Partnership Council, com países que par-  patrulhamento aéreo no Báltico. No total,  canto do mundo tem implicações globais,
         tilhassem os mesmos valores e interesses.  mais de sete mil e quinhentos militares fo-  que podem alterar radicalmente o estilo de
         Esta situação implicaria a alteração do art.º  ram empregues em Forças Nacionais Des-  vida a que nos habituámos, como a história
         10.º do Tratado de Washington, que permi-  tacadas. O desempenho e a atitude destes  recente nos acaba de mostrar.
         te a entrada para a Aliança apenas a países  militares tem deixado uma imagem muito                   Z
         europeus. Além disso, para este tipo de ac-  positiva de Portugal no contexto interna-  Armando J. Dias Correia
         tuação, a Aliança necessita de capacidade  cional, o que é um importante contributo                  CFR

         14  JULHO 2009 U REVISTA DA ARMADA
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