Page 69 - Revista da Armada
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BENQUERENÇA
BENQUERENÇA
Terra de Marinheiros
a Marinha ouve-se falar da Benque- Gil, que viria a ser responsável pela minha Benqueridos à Marinha.
rença com alguma frequência, por vinda para a Marinha, bem como a de mui- Alguns só cumpriram o serviço militar
Nserem muitos os marinheiros que lá tos outros rapazes da Benquerença. obrigatório (que durante a guerra do Ultra-
têm as suas raízes. Poucos saberão que se Todos estávamos plenamente convenci- mar, na Marinha, era de quatro anos para os
trata de uma aldeia do interior, situa da num dos da impossibilidade de conseguirmos a recrutados e de seis para os que entrassem
fértil vale que faz parte integrante da Cova da almejada melhoria de vida através da pas- como voluntários) outros já deixaram o ac-
Beira, entalada entre as serras da Santa Mar- torícia ou agricultura praticadas naquelas tivo, mas são ainda bastantes os que se en-
ta, a Sul, e da Opa, a Norte, cujos horizontes paragens, pelo que era inabalável a nossa contram ao serviço.
são fechados a Este, pela serra da Malcata e a vontade de partir logo que tivéssemos idade Poucos vivem na aldeia, mas nenhum a
Oeste pela majestosa serra da Estrela. e forças suficientes para nos aventurarmos na esqueceu, sendo muitos os que lá se deslo-
Embora se trate de uma aldeia com monta- procura de diferente meio de vida. Os ma- cam com alguma frequência, no Verão, pelo
nhas no horizonte e bem no Natal e também em Maio,
interior é hoje considerada a para assistirem à romaria da
que mais pessoal forneceu N. Sr.ª da Quebrada.
à Marinha, fenómeno que Continuando a não ser
muita curiosidade tem le- servida por vias de comu-
vantado e que aqui se procu- nicação relevantes (o que
ra ajudar a compreender. sempre condicionou o seu
A razão de ser desta reali- desenvolvimento) hoje, é já
dade tem origem na neces- fácil demandá-la. Indo pela
sidade que os Benqueridos A23, pode-se sair em Caste-
sentiram de procurar condi- lo Branco Norte, seguindo
ções de vida melhores que para Espanha/Penamacor
aquelas que tinham os seus pela EN 233 Depois de Pe-
pais, no que não foram úni- namacor, à saída da aldeia
cos. As terras da Benqueren- de Meimoa, cor-
ça até têm aptidão agrícola, ta-se à esquerda.
mas a agricultura de subsis- Outra hipótese é
tência que praticavam não continuar na A23
permitia sair da triste vida que viviam. Sempre e, após a Covi-
houve uma grande divisão da propriedade. lhã, sair para Sa-
Todos os casais cultivavam algum bocadinho bugal/Caria. De-
de terra, que lhe pertencia ou alugavam, onde pois de atravessar
faziam a horta mas, para sobreviverem, pre- Caria (uma ponte
cisavam que os agricultores com maior acti- à entrada e outra
vidade lhes dessem trabalho, o que aconte- à saída) vira-se à
cia apenas sazonalmente, sendo os ganhos esquerda (Nas-
sempre insuficientes. Foi essa insatisfação que cente) passando
potenciou a lídima aspiração a uma vida me- por Monte do
lhor. Assim, principalmente nos anos sessen- Bispo/(Três Po-
ta e setenta, muitos foram os jovens nados e vos)Escarigo.
criados na Benquerença que emigraram ou Os seus habi-
simplesmente migraram para o litoral. rinheiros nossos conterrâneos constituía m tantes, afáveis como sempre, são cada vez
A Marinha atraiu um número extraordina- um apelativo exemplo e a demanda do li- em menor número e maioritariamente ido-
riamente elevado de pessoas. Porquê? toral era legal e não implicava os avultados sos, mas continua a haver alguns sinais de
A Benquerença “descobriu” a Marinha há pagamentos aos facilitadores da emigração. vitalidade, como sejam a escola, posto mé-
já muitos anos. Ainda o articulista era criança Depois, o apoio inicial de alguém que nos dico, farmácia, centro de assistência social,
quando conheceu uma senhora a quem cha- aconselhasse, desse guarida, orientasse ou um balcão bancário, um posto de venda de
mavam a Palmira do marinheiro. Este, um Fo- auxiliasse na obtenção do posto de traba- combustíveis, vários estabelecimentos co-
gueiro (especialidade que foi substituída pela lho pretendido era muito importante. A par merciais, entre os quais oito cafés/snack-ba-
de Condutores de Máquinas) era um homem do apoio conseguido junto de familiares ou res, um deles numa aprazível zona de lazer
que raramente via na aldeia. Regressou anos simples filhos da terra, a prestimosa disponi- denominada O MOINHO, junto a um açude
mais tarde, já velho e doente. Havia também bilidade dos marinheiros Benqueridos mais no rio Meimoa.
um tal Sr. Tenente Luzio, que mais tarde, já antigos para nos ajudarem com os seus con- Foi desta maravilhosa aldeia que saí-
na Marinha, vim a saber ter-se reformado selhos, informações e recomendações certei- ram os muitos oficiais, sargentos e praças
como Segundo-tenente SG (classe que deu ras, terá sido o factor decisivo na opção pela que serviram ou servem Portugal na Mari-
lugar à de OT) cuja ascensão na carreira ele Marinha de tão elevado número de jovens nha com muita honra e dedicação, trazen-
próprio considerou extraordinária ao prever da Benquerença. do no coração a BENQUERENÇA NOSSA
que mais nenhum Benquerido chegaria ao Há várias teorias sobre a origem do nome QUERIDA…
seu posto. Mas estes não eram os únicos ma- de Benquerença, mas todas têm por base o Z
rinheiros da minha terra, na minha menini- lendário bom relacionamento entre as suas A. Almeida Machado
ce. Outros havia que só mais tarde conheci, gentes, o que, sendo verdade, pode ajudar CFR SEL RES
entre os quais o extraordinário João Cerdeira a compreender este extraordinário afluxo de Fotos: Nabisk
REVISTA DA ARMADA U FEVEREIRO 2009 31