Page 27 - Revista da Armada
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VIGIA DA HISTÓRIA                            REVISTA DA ARMADA | 487

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GENTE DE VALOR – 1

  Há pessoas que, por mais valorosas         te, num braço, o marinheiro do leme,
que tenham sido as suas acções, para         que fugiu para o castelo da proa, tendo
além do reconhecimento que, por vezes,       seguidamente morto o capitão que en-
na altura lhes é feito, raramente são de-    tretanto se levantara, bem como o outro
pois recordadas.                             marinheiro que saíra da coberta em so-
                                             corro dos seus compatriotas.
  O britânico Guilherme Williams, de
quem somente foi possível conhecer os 5        Tanto o marinheiro ferido como os mo-
últimos anos da sua vida, é, em meu en-      ços procuraram refúgio na coberta, onde
tender, um desses casos.                     o piloto os conseguiu encerrar.

  Antes de prestar serviço na Armada           Durante 3 dias e 3 noites, sem comer
Real, Williams era o contramestre e pi-      nem dormir, o piloto governou sozinho
loto do bergantim inglês Hope, ou como       o navio em direcção a Portugal, ao fim
nalguns registos portugueses surge, Es-      desse tempo resolveu pôr o navio de
perança, tendo entrado no Porto, vindo       capa e descansou.
da Terra Nova com carga de bacalhau, no
dia 21 de Outubro de 1795, sendo bem           Conseguiu depois convencer o marinhei-
possível que o mesmo já tivesse ocorrido     ro ferido a trazer os moços para o convés
no ano anterior.                             onde, sempre sob ameaça de pistolas e de
                                             uma catana, que tirara ao capitão francês,
  Após ter carregado, com fruta, vinho       os obrigou a manobrar o navio.
e algodão, o Hope largou do Porto, em
5 de Dezembro, com destino a Guernsey          No dia 4 de Janeiro de 1796, ao largo de
e Dartmouth.                                 Viana do Castelo, uma lancha ida de terra
                                             transferiu para bordo do Hope 5 homens
  No dia 18 desse mês, quando se encon-      que, na madrugada do dia 5, fizeram en-
trava na latitude de 47o e 13’, foi o navio  trar naquele porto o navio represado, ten-
apresado por uma fragata francesa, a Tri-    do, nesse mesmo dia, Williams requerido
bune, que seguia acompanhada pelas fra-      que o navio lhe fosse entregue como boa
gatas Republicaine e Meduse e o bergan-      presa. (cont).
tim Impatient.
                                                                             Com. E. Gomes
  Dado o reduzido número de tripulan-
tes do navio inglês, somente 6 homens, é     N.R. O autor não adota o novo acordo ortográfico
quase certo que não terá havido qualquer
resistência ao aprisionamento.               Fontes
                                             Correio Mercan l e Económico de Portugal – Outubro de
  À exceção do piloto Williams, todos        1795.
os tripulantes do Hope foram transferi-      Arquivo Histórico Ultramarino Maços do reino cx. 266
dos para a fragata francesa, enquanto no     pasta 1.
Hope embarcou uma guarnição de presa
constituída por um capitão, dois mari-
nheiros e 3 moços de idades entre os 16
e os 18 anos, guarnição essa cuja finali-
dade era a de conduzir o navio apresado
para um porto francês. Verificando que
os franceses não sabiam manobrar ade-
quadamente, planeou o piloto, se para
isso surgisse a oportunidade, conduzir o
navio para um porto amigo. Tal oportuni-
dade surgiu quando, no dia 26 de Dezem-
bro, pelas 13h00, o piloto se encontrou
somente acompanhado, no tombadilho,
pelo capitão de presa e pelo marinheiro
do leme, tendo então pegado num ma-
chado e dado uma forte pancada no capi-
tão, derrubando-o, e ferindo gravemen-

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