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VIGIA DA HISTÓRIA 			

VISÃO ESTRATÉGICA

No início do séc. XVII o poderio mili-      ra, sem qualquer possibilidade de evitar
     tar e comercial dos portugueses, na    a sua perda. Pelas suas características o
Índia, estava fortemente abalado em es-     local era conhecido entre os portugue-
pecial devido à acção dos ingleses e dos    ses como “O Poço de Surrate“.
holandeses que ali se haviam instalado e
posto em causa tal poderio.                   Propunha então o autor anónimo que
                                            se enviassem duas naus velhas, carrega-
   Era então sentida a impossibilidade de   das de pedras, que conduzidas por pilo-
militarmente se conseguir a expulsão,       tos práticos da zona fossem afundadas
quer de uns quer dos outros, não só por-    no canal de acesso, impedindo assim a
que tanto os holandeses como os ingle-      entrada dos navios ingleses que, por isso,
ses dispunham de forças significativas na   se veriam obrigados a carregar no exte-
zona, mas também pela falta de recursos     rior, recorrendo a lanchas, e a uma dis-
económicos, por parte dos portugueses,      tância tal de terra que permitiria o seu
para reunir meios e efectivos necessários   ataque pela armada de remo portugue-
para o efeito.                              sa, sem que esta ficasse ao alcance da ar-
                                            tilharia inglesa em terra.
   Consciente dessa situação, alguém cujo
nome não ficou registado terá exposto ao      Vendo todo o seu comércio considera-
Vice-Rei, em 1620 ou 1621, a adopção de     velmente reduzido, seria uma questão de
outras medidas, de “indústria e manha”,     pouco tempo, assim o julgava o autor des-
que, segundo esse autor, reduziria e anu-   conhecido, até que os ingleses abando-
laria o poder que aquelas duas potências    nassem igualmente a zona.
já dispunham no Oriente.
                                              Não foi possível conhecer se o projec-
   A proposta relativamente aos holan-      to, enviado pelo Vice-Rei, em carta data-
deses consistia em que o governo da Ín-     da de 11 de Fevereiro de 1622, chegou a
dia estabelecesse relações comerciais       ser analisado e, se o foi, qual o despacho
com o Rei da Pérsia, facultando-lhe, em     régio que sobre ele recaiu, o que se sabe
troca de sedas, a canela e a pimenta que    é que nenhuma das propostas chegou a
necessitasse, comércio esse que então       ser concretizada.
estava proibido, por forma a que satis-
feitas as suas necessidades daqueles            Curiosamente, em 1898, a Marinha
produtos, os pudessem exportar para a       dos EUA adoptou uma prática semelhan-
Rússia, a Turquia e outras nações que,      te ao pretender bloquear a entrada do
até então, eram abastecidas pelos ho-       porto de Havana, pelo afundamento do
landeses, levando a que estes, privados     USS Merrimac, impedindo assim a saída
da sua actividade principal, se veriam      dos navios espanhóis.
compelidos a abandonar a Índia.
                                                                            Com. E. Gomes
   Já quanto aos ingleses, que tinham
toda a sua actividade comercial basea-      N.R. O autor não adota o novo acordo ortográfico
da em Surrate, a resolução do problema
passava por uma abordagem diferen-          Fonte
te aproveitando as características físicas  Documentos Remetidos da Índia vol. 16, carta de 11 de
desse lugar.                                Fevereiro de 1622.

   Surrate, onde os ingleses já dispu-
nham de uma feitoria, situa-se no fun-
do de uma baía, cujo acesso é garantido
por um estreito canal e em cujo interior,
devido à existência de baixos, se torna
muito difícil manobrar, características
essas que desaconselhavam vivamente
um ataque naval dos navios portugue-
ses, os quais ficariam claramente à mer-
cê da artilharia inglesa instalada em ter-

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