Page 114 - Revista da Armada
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Gago Coutinho e Sacadura Cabral quando estudavam a travessia Lisboa-Rio de Janeiro.
A 1: Travessia Aérea
do Atlântico Sul
Em 1922 não se voava como hoje; e para medirmos inventar um método de navegação astronómica
bem o alcance do feito de Sacadura Cabral e de que garantisse o conhecimento da posição do avião
Gago Coutinho é preciso que nos situemos nessa quando e sempre que se desejasse. Ora tal método
época. A seguir à guerra de 1914-1918, a aviação não existia ao tempo e era por isso que as travessias
experimentou o seu primeiro surto de desenvolvi- oceânicas tinham carácter temerário ou suicida
mento. Iniciou-se então uma autêntica corrida quando não apoiadas por navios. E tanto assim é
para derrubar records existentes. Os primeiros que, no voo americano que se referiu, bastou aos
pilotos portugueses aprenderam a voar em França pilotos terem navegado 170 milhas sobre nevoeiro
durante a guerra e entre eles encontrava-se Saca- para acusarem um desvio da rota de 45 mil·has. Por
dura Cabral. Em 1919, numa «caranguejola» horrí- isso, Sacadura Cabral perguntara então a Gago
vel, presa por arames, Alcock e Brown atravessam Coutinho se não seria possível adaptar à navegação
o Atlântico Norte da Terra Nova para a Irlanda. aérea um método semelhante ao praticado pelos
É uma audácia colossal! Pouco depois, os ameri- navios no mar. No seu pensamento germinava já
canos Read, Stonee e Hinton vêm da Terra Nova essa ideia ousada de ligar pelo ar Portugal ao
aos Açores e dos Açores a Lisboa, voando com o Brasil. E o tempo urgia se pretendessem evitar uma
apoio de setenta navios espalhados ao longo da antecipação por parte de outrem.
rota. Gago CO!-'tinho e Sacadura Cabral, então em Em Novembro de 1919 Leio Portela e Sousa Maia
Lisboa, presenciaram o feito. Sem menosprezar ligam Paris a Lisboa. Era o maior raíd português
o valor e coragem dos americanos, punham , no até então. Mas em terra, desde que não haja nevoeiro
entanto, reticências quanto aos méritos do processo nem tempestade, a navegação é fácil. Basta seguir
de orientação que colocava, afinal, o avião na depen- os rios, estradas, caminhos de ferro e povoações.
dência dos navios. De facto, a dificuldade das No mar, porém, a coisa' é diferente... .
travessias marítimas residia, fundamentalmente, Em Maio de 1920 compram-se dois hidroaviões em
na solução do problema da orientação. Para um Inglaterra e Sacadura Cabral traz um deles. Entre-
oceano sem marcas nem ilhas seria necessário tanto, a pedido do amigo, já Gago Coutinho andava
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