Page 125 - Revista da Armada
P. 125
bilidade do seu assento no avião, os saltos da tur-
' bulência, os balanços irregulares em todas as
direcções, como resolver o problema de fixar o
plano do horizonte. O nível! O nível de bolha de ar!
Experiências. Oficina. Novas experiências. Resul-
tados aceitáveis. Para tais viagens não eram neces-
sários muitos rigores, mas cálculos rápidos e ex-
peditos.
Sacadura Cabral é o devotado piloto, entusiasta,
atirado prà frente, a quem o sereno e metódico
aperfeiçoamento do nível e terceiro espelho auxiliar
no sextante fazem já pensar em qualquer coisa que
dê brado. E essa qualquer coisa concretiza-se.
É ele quem propõe, de súbito, ao seu camarada
mais velho: «Ó comandante, está disposto a ir
comigo, pelo ar, até ao Brasil?» O que terá ocorrido
na cabeça já um tanto encanecida do capitão-de-
-mar-e-guerra Gago Coutinho nem ele próprio o sa-
beria dizer com muito rigor. Trocar a solidão dos
matos pela solidão dos ares; observações e cálculos;
riscos, sem dúvida; mas ele era só; fora quase DEDICATÓRIA
sempre só. E de poucas falas. Por isso a resposta
também foi lacónica, mas sem hesitações de tibieza:
«Combinado!» da Revista da Armada
Não cremos, nem por suspeitas, que alguma vez
tenha ocorrido ao velho comandante fazer a viagem 50 anos passaram!
para conquistar a fama e a glória. Não estava no Acode agora,
seu feitio. E se as recepções foram, para ele e para Aos de então, na memória,
o camarada de voo, as de verdadeiros heróis pelo O feito lusitano,
extraordinário cometimento, as do mais justo apreço
Que nos cobriu de glória!
de todo o mundo pela dupla característica de aventura
audaciosa e demonstração de capacidade técnica
e científica; é enternecedor saber a resposta daquele Heróicos marinheiros!
homem simples ao entusiasmo de Sacadura quando, Vós,
à vista das terras do Brasil, os nervos libertos de Que fostes os primeiros,
tantas horas de ansiedade, de angústia e de incer- A cruzar
teza, dava largas ao seu alívio, ao seu contenta- A rota ignota,
mento : «Pois é, mas agora é que vão ser elas!» Traçada sobre o mar,
«Porquê?», perguntou o companheiro. «Ora, por E que levastes ao pais irmão,
causa dos discursos!» A alma duma raça, .
E foi simples também a sua resposta ao matemático A par do coração;
Santos Andreia quando lhe agradecia as felicita- Vós,
ções: «O feito não foi tão alto como se pretende. Perante quem contemplamos,
Quando à parte astronómica, desde já não nos Coragem, decisão,
admira ir pelo ar onde se queira, fazendo a nave- A Ciência, .
gação à moda dos navios.» Era assim Gago Cou- O ideal,
tinho! Tudo o que traduzistes em gesta ,genial,
Um dia depois de completar noventa anos morre Aqui vos recordamos,
este homem admirável, sendo vestido, como desejo HERÓIS DA PÁTRIA AMADA!
seu, com o fato de caqui das grandes caminhadas E exultando,
de geógrafo. Só não levou para a jornada eterna Em nome de toda a nossa ARMADA,
a bússola, o podómetro, a mira, o caderno de apon- VOS consagramos juntos,
tamentos e o lápis. É que ele tinha aberto o ca- GLÓRIA DE PORTUGAL!
minho para a navegação nos espaços. Honra
a GAGO COUTINHO e SACADURA CABRAL!
S, Machado
15