Page 298 - Revista da Armada
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giado Mar



                                   e           os M  -nhe-ros










            João de Barros  Pelo cap. -frag.  Cristóvão M or eira
                   flO pode fazer-se uma história da lilCnltura portuguesa,
                   por abreviada  que seja. sem J,dar de  João de  Barros
                   - o autor das «Décadas da  Asia,,_  Nascido cm  14%.
            N provavelmente  cm  Viseu.  seu  pai  recomendou-o.  11
            hora da  morte. 11  D. JOfl0 de Menezes. cam;lTci ro-mor do prín-
            cipe  D.  Jo,10, que h,lvi" de ser o rei  D.  10;\0  111 : c isso explica
            que  tenha  sido  cri ,Ido  c  educado  no  Paço.  c  feito  moço  de
            guard<l-roupil  do príncipe. que lhe animou os primeiros passos
            na litcraluT;I, c a escrita da S\I;I primeira obra. «Crónica do I mpc-
            radorClarimundo», um longo romance dCC'lVabria Que JOliodc
             Barros apresentou  ao rei  D.  Manuel  L c  este o cxprtou  a conti-
            nuar. escrevendo  li história dos nossos feitos na  India. Subido
            D. JOllO ao trono. nflO tardou a ser nomeudo governador do cas-
            telo de Sáo Jorge da Mina, cargo que se presume tenha exercido
            entre 1522 e  1525, ano em que ascendeu a m,lis alto posto, o de
            tesou reiro da Casa da índia. onde se acumulavam os rendimen-
            tos aduaneiros das especiarias importadas do Oriente, Em 1535,
             tendo-lhe o  rei eoneedido. em p,lrceria com Ai res da Cunha e
             Fern,io  Álvares  de  And rade.  a  c,lpi tania do Maran hflo.  fieou
            Joflo de Barros ii beira da ruina. quando na eosta do Brasil nau-
             fragou a armada que para o efeito se organizara. E as dificulda-
             des em que ficou. agravava-ils n[Lo só a generosidade de auxiliar
             as familias daqueles que na expedição tinham sossobraço, mas
             Iõlmbém a  honradez que nriO eonsentia que na Casa da India se
             enriquecesse ilpesar de feitor deI:! durante 35 anos. E as dividas
             d<L  malograda empres<L do MaranhfLo só ,lO resignar de tal cargo.
             cm 1567. pôde JoflO de Barros vê-Ias perdoadas pelo rei  D.  Se-
                                                                (Gravllra do SUI'iço dI' DoclUl1emaçâo (lo ~ Diário dI' NOIicifl!i.).
             bastiiio.  E  três anos depois aconteceria a morte do historiador.
             ocorrida a 20 de Outubro de  1570 na quinta de S,io  Lourenço,   da na cadência grave e solene de um mestre da oratória. com que
             próximo de Pombal. para onde se retirara. Sepultado na ermida   constrói uma história que <<trabalha mais no substancial do que
             de  Santo  António.  próximo  de  Vermoil.  seria  trasladado em   no ampliar as miudezas que cnfadam c  nfiO  deleitam». <:  assim
             16lOpara;t igreja paroquial de Alcobaça.    _      inaugura um  novo estilo na  hislOriografia  portuguesa.  E  certo
               Ao longo de todos esses anos de ,!fazeres da Casa ~a I~dia.   que as  Décadas espelham a concepção de uma Ilistória que se
             nimbados pelas já referidas dificuldades e desgostos, fOI Joao de   quer exemplar de virtudes. cm que se usa a rcgra de nfio mcntir.
             Barros construindo a sua obril literária. Aos livros da juvcntude.   mas sem abandonar uma outra regra. a de n[Loconlar ludooque
             onde avulta como pri ncipal a  .. Ropicapnefma»  (1531-32)  (um   é  verdade.  p,lTa  ciliLr  o  preceito ciceriano que  a  propósito de
             colóquio crÍlico que lembra Gil  Vicente. e que 50 anos depois   João de Barros referem António José Sawivil c Ósca r Lopes. na
             seria posto  no Index,pela inquisição), sucedem-se: dOis, .. Pane-  sua «História da  Literillura Portuguesa».  Mas sc salientam cssa
             gíricos». o de  D.  Jo;io  III  (1533) e o da infanta D.  Mana: um,l   deliberada omiSSiio que o escritor faz. a não ser cm casos dema·
             .. Cartilha para aprender a ler» (1539). para faci litar ils crianças   siado conhecidos. dos actos menos gloriosos das pilhagens e pi~
             das escolas a entrada no grego e no latim: a «Gramática de  Lin·   ratarias dos portugueses. fazem igualmente notar o aspecto po-
             gua  Portuguesa» (1540). seguida dc um .. Diálogo cm louvor de   sitivoe modcrno da obra de Barros: a sua conccpçiioecuménica
             nossa linguagem» e de um «Diálogo da viciosa vergonha». amo   da História. «concebida à escala do planeta» -  concepção que
             bos travados entre Barros e  um seu filho.  Mas de todo o legado   lhe permitiu «aperceber-se, ao mesmo tempo que da unidade do
             de Jo,io de Barros avulta a .. Ásia». obra mcstra da historiografia   mundo, da diversidade das civilizações. da relatividade da civili·
             pOrlugueS<L, da qual o primeiro conjunto de dez livros, a primei-  zaçiio europeia c da H;lativ<I pcquenez da Europa».
             ra década, foi  impressa cm  1552: a segunda data de  1553. a ter-  As .. Décadas da Asia». páginas épicas que a Camões servi-
             ceira de 1563 e a quarta de  1615. bem depois da morte do eseri-  ram  de  inspiração, são uma  obra  voltada  para a  exaltação da
             tor. sendo o texto complctado por Jo[Lo Baptista Lavanha, então   nossa expans,io marítim ...  Não fallavam por isso escolhas possí-
             eronis t a~mor do reino.  Mas ainda cm  vid,l  era famoso o  nome   veis para esta antologia: c entre tantas ficamo-nos pelas passa-
             de João de Barros: com suas Décildas. que Afonsode Ulhoa tra-  gens de três capítulos do livro quarto da Década primei r,!: aque-
             duziu para o  italiano, atravessara fronteiras: conta Manuel Se-  lesem que Joftode Barros descreve como V,iSCO d .. Gama largou
             verim de Faria que o p,IP<L  Pio IV mandara colocar no V;ltic:mo,   de  Lisboa. e  pela rota do Clbo foi  em demanda do caminho da
             ao lado do busto de Ptolomeu. outro do escritor português.   índia. c como dois anos depois ao Tejo regressou: e  pelo meio
                Nas .. Décadas d,!  Ásia». que abrangem os ecnto e vinte anos   metemos  as  páginas cm  que.se  relata  a  escala  de  Melinde,  c
             que  vão das primeiras 1l<lVcgações do infante  D.  Henrique .. té   como dali partiu o Gama. e fi  India pelo mar chegou. e vendo-se
             à morte de Nuno da Cunha cm  1536, João de  Barros torna-se   diante dela lhe pareceu. c  fi  sua gente. «que tinham acabado o
             na  pros ..  o exemplo que Camões rcpresenta cm seu ve rso:  com   fim  dos seus trabalhos» -  como se outros muitos,  penosos c
             o grande vate rivaliza n,l riqueza sugestiva da expressão, molda-  grandes, não estivessem para v;r.
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