Page 417 - Revista da Armada
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A Marinha na raia de Espanha
Notas das memórias
de um artista plástico
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igou-me a mestre Alberto de Sousa uma grande estimava·o. Ali permanecia largas temporadas, sobretu·
amizade, quer como professor quer como amigo. do pelo S. João, na feira anual da capital alentejana. Uma
L Desde muito novo que o acompanhei nas suas pe- .tarde, em casa de Luís Sangreman Proença, irmão do es·
regrinações a Evora, onde eu então residia, calcorriando critor Raul Proença, entre peças de arte de que a mansão
a seu lado o pavimento irregular das calçadas à portugue- está repleta, deliciou-nos com a descrição, cheio de pito·
sa da velha urbe alentejana. Sempre um dito de espírito, resco, da sua vivência como enviado especial da .. Ilustra-
sempre uma chamada de atenção para este ou aquele por- ção Portuguesa» e do jornal .. O Século», junto das tropas
menor, um portal manuelino ou grossa silharia de edifí- que, em defesa da República, combatiam no norte do país
cio, quedava-se enlevado visand(K)S de vários ângulos. as incursões monárquicas, comandadas pelo digno e ilus-
Sentava-se no banco .. de pinxar». como lhe chamava, e tre militar que foi Henrique de Paiva Couceiro. O direc-
lá ia eu com o púcaro de esmalte em busca de água, para tor daquelas publicaçôes, Silva Graça, desejava que lhe
me deliciar, pouco depois, perante as manchas magnífi- enviasse do teatro de operações .. croquis» dos aconteci·
cas, que imortalizavam ruelas estreitas, alpenduradas flo- mentos. Estavam então na moda os grandes artistas
ridas ou arcadas monumentais, luminosas de sol sob um George Scot e Fortunino Matania que, como enviados
céu azul. Finíssimo de trato, ficava encantado sempre que das grandes publicações gráficas estrangeiras, publica-
descobria alguma figura típica de alentejano no seu antigo vam apontamentos cheios de vigor, movimento e precisão
trajar de surrobeco, de pelico e safões, com largo chapei· a ilustrar textos de noticiário.
rão e manta ou alforge lustrado. E era eu que fazia a con· LÁ fui, dizia Alberto de Sousa, para Salreu, na raia
certação com o tipo, algo surpreso e desconfiado por ti:ni· com a Galiza. Fazia um frio de rachar e chovia torrencial-
dez própria do rural , para que lhe tirassem o retrato. mente, com neve a cobrir a serra. Procurei juntar-me à co-
A cidade inteira conhecia o insigne mestre e grance luna de Marinha que operava junto à fronteira e era co-
artista, glória da pintura portuguesa contemporânea, e mandada pelo conhecido e nordvel oficial da Armada
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Em Sofreu. a coluna d~ Marinha dirigindo-s~ paTa as primf'ira linhas o mf'Slrf'cornt ltiro - Mt'SIrrSomb,.. da coluna df' Marinha (<<Croquis»
df' combalt (.Croquis~ df' Afbt'no df' Sousa. publicado na Ifustnlfe df' Albt'rlo df' Sousa. pubfkado na Ilustrepo Portug~, n." 679IFf'II.
Portug_. n."Ó79fFf'II. 19/9). 1919).
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