Page 81 - Revista da Armada
P. 81
bendo influxos de um meio e de uma educação"que moldariam Pátria 011 da Marinha. Para o almirante Almeida d'Eça lapsos
definitivamenle o seu carácter. dessa natureza feriam-no duramente, causando-lhe mágoa e
Con."ivendo com familiares de elevado nl."el cullural, bre."e sofrimento.
se interessou pelos estudos, nos quais progrediu rapidamente, As múltiplas facelas do seu esp(rito não faltaria certamente um
lendo frequentado o Academia Politlcnica do Porto, onde com- subtil semido de humor, que aliás era bem conhecido de quantos
pletou o curso preparalário para a Marinha. com ele pri."aram.
A sua jll."enlude foi naturalmente influenciada pela Ipaca em A um aspirante que, ao dirigir-se ao seu lugar, tomou de subi-
que ."i."ell. De espirilO aberto aos nobres ideais, não poderia ficar to lIma posição que menos respeiul'oIa O ."crticalismo, o almirante
j,lseluf."eI ao mo."imel1lo patriÓlico, generoso t! renovador, que Almeida d'Eça observa em ."oz fllli/ame: "Um militar nunca se
florescia na Nação Portuguesa, nem Ião-pouco deixar de vibrar agacha».
peranle o anseio de dignificação das relaç6es t!ntre os homens e Conta-se também que, já de avançada idade, caminhava pela
en/re as naç&s. que então toma."a ."ulIO na comunidade inlema- Rua do Arsenal, apoiado d sua bengala, quando uma varina
cional. apressada, bamboleando-se nas suas chinelas e salpicando-o de
Tambim o surlO de intelectualidade que caracterizou eue pe- peixe, lhe teria notado que "a rua era de lodos,.. Responde pron-
ríodo influenciaria neceuariamenle um espirita já de si exlrema- tamente o almiranle: «Se I de todos, também é minha!» E cri-se
mente recepti."o às expressões belas do pensamento. que a sua bengala leria contribu(do para desfazer o precário equi-
Em /7 de Outubro de 1870. com /8 anos de idade, assentou {{brio da canastra que ela le."a",a tl cabeça ...
praça na Armada, como aspirante extraordinário; em 7 de Setem- Quem ti."esse percorrido os olhos pela bibliott!ca do almirante
bro de 1929 ascendia ti mais alta hierarquia militar, com a promo- Almeida d' Eça ficaria por certo impressionado com a variedade
ção ao posto de vice-a/mirante. Fora uma ."ida inteira ."O/ada ti dos assuntos que foram objecto da SI/a curiosidade inteleclual.
Marinha, a qual ser."iu dedicada e apaixonalltemente. Em No- Predominando embora os trabalhos de Direito e Hislória, re-
w!mbro de /929, pouco tempo decorrido depois de se afastar do conhecendo-se desde logo uma preferéncia pelos clássicos, esta-
ser."iço acti."o, falece.u o almirante Almeida d' Eça - cumprindo- vam ali representadas obras que cobriam uma ."asta gama das
-se aliás uma SI/a profecia. A Marinha era, na ."erdade. parte Ciéncias, das Letras e das Artes, escritas em ."árias línguas, entre
integrame da sua vida. as quais o latim e o grego, que domina'olO, numa ampla represen-
Os primeiros anos de oficial são passados na vida de bordo, tação do pensamento humano.
ha."endo embarcado em unidades de diversos tipos e feito várias Passa."a longas horas entre os seus li."ros, seus amigos fiéis,
comiss&s no Ultramar. Entre os na."ios em que prestou serviço debruçando-se em profundo estudo e meditação, quase se alhean-
figuram a corveta D. João I, a fragata D. Fernando, a barca Mar- do do queà sua "'0110 decorria.
tinho de Melo, a canhoneira Rio Minho, a corveta couraçada Adquiriu assim uma ."astÚSima cultura que, a par de um espi-
Vasco da Gama, o ."aporQuelimane, a corveta Mindelo, etc. Vi- rita fulgurante, lhe abriu naturalmente caminho para lugares ci-
I'eu assim intensamenle todo o enfllsiasmo que caracterizou a meiros nos sectores intelecwais do Pafs, bem como posições de
transição da vela para o ."apor, destaque na ."ida pública.
Do apmlllo e da dedicação com q/le ,çer."iu duraflle esse pe- Vemos, pois, o almirante Almeida d' Eça ser eleito por unani-
ríodo de aCli."idade no mar, são testemlmho os lou."ores que me- midade para sócio efectivo da Academia das Ciências e lomar lu-
receu. tal como foram igualmeme distinguidos trabalhos da gar na Sociedade de Geografia, a que durante longos anos presi-
maior projecção, entre os quais um estudo referente ti "reorgani- diu com destacado brilho.
zação do peuool e do material da Marinha de Guerra», em que Tomou assento na Câmara dos Deputados, foi comissário ré-
mais tarde é chamado a tomar parte, mercê da sua inteligência e gio em di."ersas instâncias e represenlou o Pais numerosas ."ezes,
valor profusional. nomeadamente em quest&s de Direito e de Pesca.
Foi. no entanto, como lente da Escola Naval, ti qual concorre A sua figura venerada proju.ta-se assim para além da Mari-
em 1885 para leccionar, en/re outras cadeiras, Direito Internacio- nha, a quem trouxeacrescemado prestigio.
nal Público Marítimo e Hislória Marllima, que o espirilo do almi- O almirante Almeida d'Eça foi ainda um chefe de faml/ia
rante Almeida d' Eça encontra a plenitude dasua expressão. exemplar, t! também um perfeito amigo.
Na ."erdade, o acrisolado amor pátrio, a de."oção por tudo Se a sua presença infUlldia respeito, não é menos certo que .,,0-
quamo ti Marinha se figa."a, o permanente anseio pelo primado ta."a aos seus uma dedicação e uma ternura que mio conheciam
do direito e da justiça, ideais da sua mocidade alicerçados pela limites.
."ida que abraçara e ser."idos por uma resplandecente cullura, Na sua casa reuniam-se pau!IItes e amigos - quantos deles
constilulram uma fonte que naturalmente a/imenta."a as suas li- ilustrt!s _ procurando o prazer do seu con."(.,,io e a magia da sua
ç&s magistrais, em que ti limpidez do pensamento e ti perfeição . maneira de con."ersar, 011, em momentos difíceis, a ponderação
da forma se jlmta."a o poder persuasivo das con."icções profun- doseuconselho.
",,- Gera."a-se às sua ."olta um ambienle de in."ulgar calor
( ... ) São bem conhecidos alguns episódios do sua longa car- humano!
reira de professore) , pela maneira incompará."eI, tão caracterís- Nesse espirito de eleição, Ião ricamente dotado, existia uma
tica da sua personalidade, com que nlQrca."a no espirita dos alu- profunda sensibilidade, uma delicadeza de sentimentos e, sobre-
nos momentos mais altos da .",·da portuguesa, faundo-os ."ibrar tudo, uma fonte inesgolá."e1 de bondade.
de intensa emoção, quer emanada de sentida tristeza, quer de in-
contida alegria. ..Eu creio no Bem, na Justiça e no Direito. porque creio e amo
No in(cio do ano lecti."o de 1917, ao faura chamada dos aspi- a Deus» - frase sua, bem conhecida, de que julgo transparecer
ranles, qllebra ele próprio o silêncio que se seguiu ao nome de a sua Vida e a sua Obra.
Elói da Mota Freitas, para responder em ."oz como."ida e com a
grande dignidade que lhe era peculiar: .. Morto em combale no
campo da honra e do dever a bordo do caça-minas Auguslo de
Castilho».
Em Junho de 1922 rompiam as sal."as que assinala."am o bom
termo da traveuia gloriosa de Socadura Cabral e Gago Coulinho.
Ao aluno que esta."a a ser imerrogado pt!rgunta quem eram .,os
primeiros portugueses da actualidade,.. E à resposta necessaria-
mente certa comt!nta o mestre com um sorriso feliz de plena ale-
gria: .. Disse muito bem, eslOu satisfeito, pode retirar-se».
Não são, porém, tão conhecidos-excepto para a sua familia
-os brados de indignação que por ."ezes se Iheou."iam em longas
noites de lrabalho, sinal inequl."oco de que um dos seus alunos M. do Vale,
teria cometido alguma inexaclidão em matéria de História da dQfm.
~ QUQfenlQ ~ quatro Qnos, afguru d~pois d~ lU pQSSQdo à RU~fVQ
(para o qu~ foi publicado dur~lo ~Jp«iaf) . ••••••••••••••••••••••••••••••
7