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O reequipamento
                            O reequipamento



                                      da Marinha
                                       da Marinha





             ortugal desenvolve há cerca de 10  A crise do Golfo, a necessidade de Por-  expressões de poder – capacidades – com
             anos um grande esforço para adaptar  tugal participar na força multinacional de  tipo, dimensão e composição específicos,
         Pas Forças Armadas aos desafios do  oposição ao Iraque, na força de bloqueio  viabiliza a tomada de decisões quanto à
         pós Guerra Fria. Esta complexa reforma  à Sérvia, de preparar a evacuação dos ci-  natureza e à sequência das acções desti-
         caracteriza-se por uma profunda renova-  dadãos nacionais de Angola, de intervir no  nadas a organizar, a edificar e a empregar
         ção dos conceitos estratégicos de defesa e  conflito da Guiné-Bissau, mediando as ne-  os meios que dão corpo ao sistema de
         militar, das missões, do sistema de forças  gociações de paz, evacuando civis e pres-  força naval. Este estudo preconiza, no
         e do dispositivo. Desta forma, encerrar-se-  tando apoio humanitário, e de contribuir  curto prazo, a entrada ao serviço: de
         -à definitivamente o ciclo iniciado nos  para a imposição e consolidação da paz  navios patrulha costeiros destinados à
         anos 50 para fazer face às necessidades  em Timor-Leste, têm desvalorizado aque-  fiscalização da nossa longa fronteira marí-
         de actuação no ultramar. No que à Mari-  las opiniões. Com efeito, a paz no mundo  tima; de novos submarinos, que são deter-
         nha diz respeito, a independência das co-  depende, em primeiro lugar, da capaci-  minantes no desempenho militar do sis-
         lónias alterou os requisitos de emprego da  dade diplomática para resolver pacifica-  tema de força naval; e de um navio poli-
         força naval, pelo que, a partir de 1975,  mente as disputas de interesses em «fora»  valente logístico, essencial para a mobili-
         assumiram importância primacial as actua-  acreditados e legítimos, como são, por  dade dos fuzileiros e das forças terrestres.
         ções no âmbito da Aliança Atlântica e as  exemplo, a ONU e a OSCE. Quando a ac-  Em seguida, aquele estudo prevê: a substi-
         tarefas de interesse público (fiscalização,  ção diplomática não proporciona soluções  tuição progressiva das corvetas das classes
         investigação marítima, salvaguarda da  aceitáveis e dessas disputas resultam per-  “João Coutinho” e “Baptista de Andrade”,
         vida humana no mar, assinalamento marí-  turbações graves da segurança nacional  e dos patrulhas da classe “Cacine” por pa-
         timo e preservação ambiental). Este apa-  ou internacional, torna-se necessário em-  trulhas oceânicos, cuja actuação preferen-
         rente desvio das tarefas militares (espe-  penhar forças militares. Contudo, para que  cial será a fiscalização da ZEE e a salva-
         cialmente projecção de força e presença  os conflitos armados não se internacionali-  guarda da vida humana no mar; a aqui-
         naval), que tinham caracterizado de for-  zem, esses empenhamentos decorrem,  sição de 3 helicópteros destinados a com-
         ma tão evidente a actuação da Armada no  normalmente, de decisões consensuais e  pletar a lotação, em meios aéreos orgâni-
         período de 1961-75, facilitou, em meados  as forças empregues têm um vincado ca-  cos, das fragatas da classe “Vasco da Ga-
         dos anos 80, o estabelecimento da polé-  rácter multinacional. Nestes casos e, sem-  ma”, factor decisivo para a multiplicidade
         mica sobre a oportunidade da aquisição  pre que possível, Portugal intervém na ma-  de missões atribuíveis a estes navios; o
         das fragatas da classe “Vasco da Gama”.  nutenção da paz no mundo, não só por-  reequipamento do Batalhão Ligeiro de
         O fim do conflito Leste-Oeste e a eclosão  que é do seu interesse que ela se mante-  Desembarque dos Fuzileiros, de forma a
         dos conflitos regionais na década de 90, a  nha, mas também porque as alianças em  permitir o seu emprego operacional em
         que os aliados têm feito face com grande  que o país participa exigem coesão e soli-  teatros de superior nível de ameaça; e a
         espectacularidade, tirando partido do  dariedade entre os parceiros. Por  tudo  substituição das fragatas da classe “João
         poder de fogo dos meios navais de super-  isto, é evidente que as necessidades es-  Belo” por navios modernos, viabilizando
         fície, contribuiu para que, em Portugal, se  tratégicas de Portugal requerem da Ma-  assim a constituição do núcleo de 6
         abrisse campo às discussões sobre a utili-  rinha um conjunto de capacidades, que  escoltadores de superfície, número míni-
         dade de novos submarinos para substitui-  não fica satisfeito apenas com navios de  mo para o desempenho das funções de
         rem a classe “Albacora”.           superfície ou com submarinos. Na reali-  exercício de soberania e de preservação
           As opiniões discordantes são, fundamen-  dade,  deve dispor de um sistema de força  da ordem internacional. Para além destes
         talmente, de dois tipos: umas resultam da  naval coerente e equilibrado nas suas  programas estão planeados outros de
         dicotomia entre os pensamentos estraté-  principais capacidades combatentes:  menor dimensão, relativos às capacidades:
         gico terrestre e naval, que dá origem às  comando e controlo;  oceânica de superfí-  de comando e controlo; da componente
         tradicionais polémicas sobre as prioridades  cie com meios aéreos orgânicos; submari-  fixa; do sistema de autoridade marítima;
         do reequipamento da Marinha, com base,  na; guerra de minas; e anfíbia. Só desta  de combate à poluição; de assinalamento
         ora na inexistência de ameaças e de inimi-  forma se poderão constituir  as alternativas  marítimo; e de hidro-oceanografia.
         gos que ataquem pelo mar, ora no clima  de força mais adequadas para lidar com  Os programas previstos importam em
         de controlo/redução de armamentos e de  situações futuras imprevisíveis, tanto do  cerca de 700 milhões de contos, parte dos
         cooperação mundial, ora nos benefícios da  ponto de vista humanitário, como político  quais necessitam de ser suportados pelo
         integração na Aliança Atlântica e na UEO  ou militar.                 Orçamento do Estado num espaço de
         e, sempre, no alto custo dos meios navais;  Em matéria de defesa não se pode im-  tempo relativamente curto (10 anos), por
         outras, porque se esquecem que a evolu-  provisar, nem perder de vista que apenas  duas ordens de razões: a primeira, em vir-
         ção da sociedade assenta em disputas de  as capacidades combatentes permitem  tude de quase todos os meios existentes
         interesses, por vezes levadas ao extremo da  desempenhos positivos em situações de  terem sido aumentados ao efectivo em
         guerra, meio último de fazer prevalecer a  paz, crise ou conflito. Por isso, é preciso  meados da década de 60, encontrando-se
         vontade de um Estado, conferem  primazia  desenvolver de forma continuada as ac-  em fim de vida útil; a segunda, porque a
         às políticas de desenvolvimento e bem-  ções que visam o fortalecimento e o em-  missão da Marinha exige meios tecnologi-
         -estar sobre a política de segurança, e pre-  prego da força naval. Neste contexto,  camente actualizados, o que se traduz em
         conizam cortes orçamentais na Defesa,  assume relevância o estudo “Contributos  elevados custos de aquisição e de susten-
         com a consequente redução dos meios  para o planeamento de forças da Marinha”  tação. Não há uma alternativa credível a
         humanos e materiais da Marinha.    que, ao traduzir objectivos políticos em  meios com esta característica. Com efeito,

         6 DEZEMBRO 2000 • REVISTA DA ARMADA
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