Page 343 - Revista da Armada
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Estado da Marinha, louva o capitão-de- Brasil era a única hipótese de preservar Fevreiro do ano seguinte é determinado
mar-e-guerra pelo fiel e digno oferecimento a Corôa e o próprio Reino de Portugal que a Academia principie a actividade e exer-
que fez a Sua Alteza Real devendo o mesmo das ambições napoleónicas, facto que cícios no Rio de Janeiro.
Conselho declarar-lhe que o mesmo Augus- levou a que toda a movimentação tives- Em apenas um ano a Academia dos
to Senhor não aceitando o oferecimento por se sido planeada com antecedência. As- Guardas-Marinhas está a funcionar do
motivos de mais justa consideração conser- sim, o capitão-de-mar-e-guerra Dantas outro lado do Atlântico e só parte dos
vará sempre na lembrança uma tão digna e Pereira toma as medidas necessárias para seus efectivos regressará, em 1825, a Por-
louvável acção. Existiam porém portugue- que a Academia dos Guardas-Marinhas tugal. Ela constitue a verdadeira raíz da
ses que, intitulando-se adeptos do libe- seja transferida na sua totalidade – alu- Escola Naval do Brasil, a qual pode assim
ralismo, agiam unicamente em função nos, lentes e parte do material escolar, orgulhar-se de ser anterior à data da in-
dos seus interesses pessoais, procuran- incluindo a respectiva Biblioteca - ten- dependência do seu próprio país.
do a protecção de potências estrangeiras. do embarcado na nau “Conde D. Henri- Foi notável a acção de Dantas Pereira
Dantas Pereira foi, é e será sempre um que” que larga do Tejo a 29 de Novem- durante os doze anos que permaneceu
leal defensor do seu País e do seu Rei. bro de 1807, integrada numa frota de 36 no Brasil. Logo em 1808 apresenta uns
É de 1804 o seu primeiro trabalho pu- velas escoltada por seis naus inglesas. Apontamentos concernentes à regulação de
blicado – uma tradução do “Cálculo das De salientar que o Director da Acade- huma nova Academia destinada ao ensino das
Pensões Vitalícias” Mathemáticas em geral
por Saint-Cyran – a e das Artes e Sciencias
que se seguem as “Ta- Náuticas em particular,
boas que contém os vindo portanto a equi-
Logarithmos dos Nu- valer em certo modo
meros Naturaes des- às Reais Academias de
de 1 até 43.200” e em Marinha e dos Guardas-
1807 a “Memória que Serviço de Documentação da Marinha do Brasil Marinhas estabelecidas
trata de humas novas na cidade de Lisboa e à
taboas mattemáticas Faculdade de Mathemá-
e dos usos que ellas tica da Universidade de
podem ter tanto nas Coimbra. Este docu-
applicações de scien- mento, que foi redi-
cia em geral como na gido no Quartel da
navegação alta em Rua do Ourives no
particular” Constata- Rio de Janeiro e tem
-se serem todos es- a data de 9 de Junho
tes trabalhos do âm- de 1808, pode ser con-
bito da Matemática e siderado o primeiro
só mais tarde, depois projecto do Regula-
do regresso do Brasil, mento da Escola Na-
Dantas Pereira se de- val do Brasil
dicará a estudos de A profícua activida-
outras temáticas. MOSTEIRO DE SÃO BENTO. de de Dantas Pereira
As nuvens negras Academia Real dos Guardas-Marinhas de 1808 a 1832 e de 1833 a 1839. fez-se também sen-
da guerra adensam-se tir em outras áreas.
sobre Portugal. Em Novembro de 1806 mia dos Guardas-Marinhas além de ter Como atrás citado, a ele se deve a reco-
Napoleão decreta o Bloqueio Continental providenciado o embarque de material lha a bordo da nau “Conde D. Henrique”
que o Príncipe Regente não aceita. Após didáctico e instrumental da Academia da Biblioteca da Academia dos Guardas-
a Paz de Tilsitt, acordo franco-russo cele- também conseguiu que fosse recolhido -Marinhas e do acervo da Sociedade Real
brado em Junho de 1807, as tropas france- a bordo parte do acervo pertencente ao Marítima. A Biblioteca conhecida pelo
sas estão disponíveis para se deslocarem Observatório da Marinha e ao da Socie- “Depósitos de Escritos”, criada em Lis-
rumo a Ocidente. dade Real Marítima. boa em 1802, após recolha de todos os es-
Em Julho, Dantas Pereira é nomeado A 17 de Janeiro de 1808 a “Conde D. critos marítimos que existiam de autores
Director da Academia dos Guardas- Henrique” larga ferro no Rio de Janeiro portugueses, quer impressos quer ma-
-Marinhas, a instituição responsável pela e logo Dantas Pereira, que em Março é nuscritos, constituíu a Biblioteca para uso
formação dos futuros oficiais da Marinha promovido a Chefe de Divisão, procura dos Guardas-Marinhas no Brasil a qual deu
de Guerra Portuguesa e que em 1845 dará que a sua Academia disponha na cida- origem, em 1810, à Biblioteca do Rio de
origem à actual Escola Naval. de de convenientes infraestruturas. Este Janeiro – a primeira biblioteca pública do
Os acontecimentos sucedem-se com ra- objectivo é atingido com brevidade, con- país. No que se refere à Sociedade Real
pidez. Em 22 de Outubro é assinada uma forme Aviso de 5 de Maio desse ano cujo Marítima, Dantas Pereira recolheu mais
convenção com o Ministro dos Negócios texto se transcreve: Tendo assomado a fatal de mil cartas e planos e conjuntamente
Estrangeiros de Inglaterra no sentido de epocha em que o Reino de Portugal foi envol- com outros espólios foi instituído, em
uma força naval inglesa comboiar a es- vido na geral catastrophe que tinha soffrido Abril de 1808, no Rio de Janeiro o Arqui-
quadra portuguesa que transferisse a Fa- quasi toda a Europa, o Comandante então da vo Militar, anexo à Repartição de Guerra
mília Real, o Governo e algumas das suas Companhia dos Guardas-Marinhas José Ma- mas dependente igualmente da Armada
instituições para o Rio de Janeiro e a 27 ria Dantas Pereira acompanhando a Côrte, foi e da Fazenda. Em 1810 preocupado com
do mesmo mês é celebrado, pela França e por Aviso d’esta data estabelecer no Rio de Ja- o aperfeiçoamento profissional da ofi-
pela Espanha, o Tratado de Fontaineble- neiro esta Academia no Hospício do Mosteiro cialidade cria a Sociedade Naval e forma
au pelo qual o território português seria de S. Bento, servindo-se dos instrumentos, uma biblioteca profissional que cobrisse toda
dividido em três partes e ocupado pelos livros, modelos, machinas, cartas e planos a gama de conhecimentos indispensáveis ao
países signatários desse Tratado. com os quaes estava montada esta Academia oficial da Marinha desde os oficiais subalter-
A ida dos órgãos do Estado para o em Lisboa. Igualmente por Aviso de 25 de nos até aos oficiais generais. Assim, Dantas
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