Page 5 - Revista da Armada
P. 5
REVISTA DA ARMADA | 489
Importa acrescentar que a UE (mais vocacionada do que a NATO arame farpado e canhões de água); instalação de cidadelas (i.e.
para missões de apoio ao state building, de natureza predominan- áreas seguras e isoladas) para refúgio da tripulação em caso de
temente não militar) foi alargando de forma significativa o âmbito ataque; e, finalmente, embarque de equipas de segurança priva-
das suas missões, num esforço coerente de atacar as causas do das ou, mesmo, de militares.
problema. A Somalia Unit – além de responsável pelas missões
EUTM Somalia (que visa o treino de forças de segurança) e EUCAP Todos estes esforços culminaram numa redução acentuadíssi-
Nestor (que visa a edificação de capacidades de segurança maríti- ma do número de atos de pirataria a partir de 2012 (inclusive),
ma) – tem investido avultadas somas na promoção do desenvolvi- conforme se pode atestar no gráfico que ilustra este artigo. Sem
mento da Somália. menosprezar os outros contributos, é evidente que a atuação das
marinhas se está a revelar essencial na contenção dos efeitos da
Quanto a Portugal, desde 2009 que tem contribuído, todos os desestruturação do Estado somali, assegurando a continuação da
anos, para o combate à pirataria marítima no Oceano Índico, através ajuda humanitária à população e a manutenção do regular fluxo
do envio de uma fragata com destacamentos de helicópteros e de do tráfego marítimo. Isso mostra a capacidade das marinhas para
fuzileiros embarcados, a que acresce a atribuição, por diversas ve- influenciar o que acontece em terra e a sua utilidade na preserva-
zes, de aviões de patrulha marítima P3P da Força Aérea Portuguesa. ção e na promoção do bem-estar global.
Não obstante o esforço internacional encetado a partir de 2008, Contudo, nunca é de mais acentuar que a pirataria nesta região
o número de atos de pirataria não caiu de forma imediata, pois do globo só será controlada com alguma sustentação quando a
os piratas refinaram as suas formas de atuação, passando a usar Somália, com a ajuda da comunidade internacional, conseguir al-
navios-mãe (que podiam ser navios mercantes ou de pesca pre- guma estabilidade política e institucional, uma arquitetura de se-
viamente sequestrados), que transportavam as suas embarcações gurança minimamente eficaz e uma economia capaz de mitigar a
de assalto (skiffs) até muitas centenas de milhas da costa soma- exclusão social, a pobreza e a fome. Como é que isso pode ser con-
li. Isso permitiu-lhes expandir a sua área de atuação até pratica- seguido? É matéria que me proponho abordar na próxima edição
mente todo o Oceano Índico, dificultando a intervenção das forças da Revista da Armada.
navais. No entanto, os esforços desenvolvidos em vários domínios
acabaram por dar resultados bastante frutuosos. Comandos portugueses
Em primeiro lugar, as várias forças presentes na área foram au- No quadro do comando da força-tarefa da Aliança Atlântica Stan-
mentando a sua eficiência, através da melhoria gradual da coor- ding NATO Maritime Group 1, exercido pelo nosso país entre janei-
denação entre si e da adoção de regras de empenhamento mais ro de 2009 e janeiro de 2010 – o então Contra-almirante Pereira da
robustas, que passaram a permitir o ataque às bases logísticas dos Cunha conduziu a operação ALLIED PROTECTOR entre março e junho
piratas na costa somali, de forma a destruir as suas embarcações. de 2009 (sendo a fragata Corte-Real o navio-almirante) e a operação
OCEAN SHIELD entre novembro de 2009 e janeiro de 2010 (com a
Em segundo lugar, a comunidade internacional foi – de forma fragata Álvares Cabral como navio-almirante).
lenta, mas progressiva – mitigando a maior limitação do combate
à pirataria, que tem sido a incapacidade para julgar os suspeitos de No âmbito da União Europeia, a força naval encarregue da missão
pirataria. Embora ainda haja fragilidades nesta matéria, já se con- ATALANTA (denominada EUNAVFOR) já teve comando português por
seguiram acordos de âmbito judicial, visando facilitar o julgamen- duas vezes. Entre abril e agosto de 2011, o comandante da força foi
to dos piratas detidos em tribunais estabelecidos para o efeito no o então Comodoro Silvestre Correia, que esteve embarcado no na-
Quénia, nas Seicheles, nas Maurícias e na Tanzânia. vio-almirante Vasco da Gama. Dois anos depois, entre abril e agosto
de 2013, o comando da EUNAVFOR pertenceu ao então Comodo-
Finalmente, a navegação mercante também foi adotando medi- ro Novo Palma, com a fragata Álvares Cabral como navio-almirante.
das de proteção própria, que dificultam a concretização e o suces-
so dos ataques piratas, nomeadamente: navegação em comboio; Sardinha Monteiro
adoção de velocidades mais elevadas; manutenção de comunica- CFR
ções permanentes com as autoridades de controlo da navegação;
recurso a dispositivos de resistência ao assalto (como barreiras de
Fuzileiros portugueses tomam de assalto uma embarcação pirata
OUTUBRO 2014 5