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REVISTA DA ARMADA | 501 78 Foto SMOR L Almeida de Carvalho
VIGIA DA HISTÓRIA
VEDETA H
É bem possível que a grande maioria atirado à água. Entre os que tal procedi-
dos que actualmente servem na Marinha mento tiveram encontrava-se um cabo si-
nunca tenham conhecido, ou sequer ouvi- naleiro que, só após ter saltado de bordo,
do falar, a vedeta H, do Serviço Portuário se terá apercebido que a sua proficiência
de Transportes, que no século passado, na disciplina de natação não era das mais
penso que já no fim da sua vida útil, fazia adequadas, levando até que se encontras-
a ligação do Grupo nº 2 de Escolas da Ar- se bastante atrapalhado com a situação.
mada com a Doca da Marinha. Julgo não Foi então que avistou um grumete seu co-
estar enganado mas estou em crer que nhecido que seguia agarrado a uma bóia,
essa carreira só era efectuada aos sába- que da vedeta lhe haviam atirado, e ao
dos, pelo menos foi nesses dias, por umas qual ordenou “Larga a bóia, que eu sou
duas vezes, que a utilizei. mais antigo”(2).
No tempo em que nela naveguei, já lá Com. E. Gomes
vão mais de 50 anos, já a vedeta era clas-
sificada como “Calhordas”(1), apesar de P.S. – É bem possível que a estória que me
aparentar um respeitável ar de “velha se- foi contada não tenha ocorrido mesmo as-
nhora”, é certo que com algumas mazelas, sim, ou até mesmo que não tenha chegado a
quase todas fruto da sua longa idade. ocorrer; convirá no entanto o eventual leitor
que, seja qual for o caso, foi uma agradável
O trajecto para Lisboa, que como al- e bem disposta maneira de ajudar a superar
guém que agora não recordo referia, não o longo trajecto.
poderia ser medido pelo relógio, mas sim
pela folha do calendário, tal era a sua du- N.R. O autor não adota o novo acordo ortográfico.
ração normal; recordo-me que numa das Notas
vezes a distância entre o terminal dos (1) Antigamente, na gíria naval, designava-se por Calhor-
barcos da CP e a Doca da Marinha foi per-
corrida em quase meia hora. É por demais das qualquer embarcação velha e muito lenta.
evidente que tão longos períodos possi- A(2) expressão continua a ser utilizada sempre que al-
bilitavam um vasto leque de actividades,
desde o retemperador descanso, à leitura guém recorre à antiguidade como forma de obter algo
e, como é natural, numa qualquer reunião que em nada está com ela relacionada, e de ela me
mesmo que acidental de homens do mar, lembrei quando, vai para pouco tempo atrás, em Évo-
ao escárnio e mal dizer. ra, a ouvi dizer a um pai dirigindo-se a um filho.
Foi no decurso de uma dessas viagens
que por um camarada, muito mais antigo,
me foi contado um episódio ocorrido com
a vedeta H, que deu origem a uma expres-
são que rapidamente entrou na gíria na-
val, episódio esse que, não pretendendo
lucrar algo com ele, o “vendo” pelo exacto
preço por que o comprei.
Dizia-me o camarada em causa, e nada
me fez supor que não fosse verdade o que
relatava, que no decurso de uma dessas
carreiras, quando a vedeta já se encontra-
va relativamente perto do cais do Grupo
nº 2, se terá declarado um incêndio a bor-
do, o qual originou um certo pânico entre
os passageiros, havendo inclusive alguns
que, pela proximidade de terra, se terão
30 NOVEMBRO 2015