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REVISTA DA ARMADA | 521
VIGIA DA HISTÓRIA 94
AQUISIÇÃO DE NAVIOS
NO ESTRANGEIRO
A construção naval portuguesa rara- lhos de enxárcia, novos e bons, e deveriam
mente, se é mesmo que alguma vez assim trazer igualmente duas andainas completas
aconteceu, foi suficiente para as neces de velas, uma em uso e outra de sobressa-
sidades nacionais, mormente aquando lente; para além disso, cada galeão deveria
do regular funcionamento das Carreiras trazer também quatro âncoras e as respec-
da Índia e do Brasil, sendo prática habi- tivas quatro amarras.
tual o recurso à aquisição de navios no A recepção final dos navios teria de ser
estrangeiro. obrigatoriamente realizada em Lisboa,
Tais navios geralmente mantinham asso- sendo que os encargos da deslocação cor-
ciado ao respectivo nome indicação rela- reriam por parte do vendedor.
tiva aos locais de aquisição ou de cons- Estas escassas linhas, daquilo a que se
trução e é assim que, ao longo do tempo, chamariam especificações técnicas, eram
nos deparamos com navios com nomes, completadas com algumas, igualmente
ou por vezes alcunhas, como S. Pedro de poucas, instruções financeiras, sendo uma
Hamburgo, Stª Maria de Dantzig, Galega, a de que o preço deveria ser o mais baixo
Burgalesa, Francesa, os Biscainhos, etc… possível e a outra a de que o pagamento
À luz do que sucede nos dias de hoje, deveria ser efectuado no mais dilatado
mesmo quando o navio é construído em período de tempo possível.
Portugal, em que o processo de aquisi- Para além da compra dos navios, o
ção, para além de bastante complicado, é documento em causa estabelecia ainda
extremamente moroso e envolve imensa que deveriam ser compradas 50 peças de
gente das mais diversas profissões e quali- artilharia de 10 libras de bala ou, não as
ficações, a aquisição de navios em tempos havendo disponíveis, de balas de calibre 8;
mais recuados poderseá classificar como para além disso, deveria adquirir também
quase instantânea. 1000 mosquetes e 5 mil balas redondas de
Na verdade, as instruções dadas ao capi- calibres 10 e 16.
tão Domingos Gil da Fonseca, no séc. XVII, Não foi possível apurar se a missão come-
provavelmente na década de 30, para que tida a Domingos Gil da Fonseca terá sido
procedesse em Espanha à aquisição de coroada de êxito; não me admiraria, con-
navios, por tão simples e expeditas são um tudo, que assim tivesse acontecido, dada
claro exemplo do que atrás se afirmou. a simplicidade e clareza das instruções que
No documento, que não se encontra lhe haviam sido transmitidas.
datado, estabeleciase que o capitão Fon-
seca se deveria dirigir, com toda a brevi-
dade, para Madrid onde trataria de obter Cmdt. E. Gomes
o recibo das letras de 8000 cruzados, bem
como as autorizações para a compra de
artilharia e armamento, seguindo imedia-
Pormenor de quadro de José Pedroso e artilhados, de melhor construção e for- N.R. O autor não adota o novo acordo ortográfico
tamente para S. Sebastien, onde deveria
procurar dois ou três galeões, mais prestes
mas, e de 500 a 600 toneladas portugue-
sas de arqueação.
Estabeleciase também que os tais
galeões, a comprar, deveriam vir total-
28 AGOSTO 2017 mente aparelhados de cabos, com apare- Fonte: Gavetas da Torre do Tombo XX – 15 – 75