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REVISTA DA ARMADA | 521
ACADEMIA DE MARINHA
WENCESLAU DE MORAES
m 27 de junho foi apresentada no auditório rais, sempre com os sentimentos do exílio e da sau-
Eda Academia de Marinha a comunicação dade presentes na sua alma e no seu coração,
“Wenceslau de Moraes”, pelo Prof. Doutor sentimentos tão particulares do seu povo.
Daniel Pires. Um português que procurou manter um
O orador iniciou a sua apresentação contacto diplomático quer com os seus
especificando alguns traços biográficos conterrâneos, quer com os japoneses,
de Wenceslau de Moraes. Recordou-o mas terminou os seus dias sozinho em
enquanto oficial da Armada, tendo Tokushima.
servido a bordo de diversos navios, Wenceslau de Moraes foi autor de
havendo registo da sua passagem um legado sobre assuntos ligados ao
por Cabo Verde, Luanda e, por diver- Oriente, em especial ao Japão, desta-
sas vezes, Moçambique. cando-se as obras: Traços do Extremo
Em 1887, partiu para Macau, onde Oriente; Cartas do Japão; O Culto do
se estabeleceu, tendo desempe- Chá; A Vida Japonesa; Relance da
nhado as funções de Imediato da História do Japão; Serões no Japão e
Capitania do Porto de Macau e pro- Relance da Alma Japonesa.
fessor no liceu de Macau. Em 1889 via- Em conclusão, o Professor Daniel
jou até ao Japão, país que o encantou e Pires salientou na sua apresentação
onde regressou várias vezes nos anos que que “Wenceslau de Moraes foi um dina-
se seguiram no exercício das suas funções. mizador do relacionamento entre o Japão
Em 1896, Wenceslau de Moraes instalou- e Portugal, quer na qualidade de cônsul –
-se definitivamente no Japão, na sequência cargo que exerceu durante cerca de 15 anos –,
da sua nomeação para cônsul de Portugal em quer como escritor. A ele se deveram iniciativas
Kobe, onde viveu 33 anos, até ao seu falecimento como a presença de industriais portugueses na feira
em 1929. A par da sua atividade diplomática intensa internacional de Osaka, em 1903, onde estiveram paten-
estudou a civilização japonesa para melhor compreender o que via tes, pela primeira vez na história das relações luso-nipónicas, pro-
e experimentava. Moraes tornou-se a grande fonte de informação dutos nacionais como o azeite, a cortiça e os vinhos portugueses”.
portuguesa sobre o Oriente, partilhando com os leitores portugue- Moraes foi “um intérprete português privilegiado e entusiástico
ses experiências íntimas do quotidiano japonês. da cultura japonesa, introduzindo-a, de forma ponderada e com sig-
As obras de Wenceslau de Moraes são de extrema importância a nificativo sentido estético, em Portugal, (…) que, na sua busca do
nível cultural e reflexo do pensamento português no mundo e sobre belo, do intemporal e da essência humana, tudo fez para se depurar
o mundo. Encontra-se em cada palavra sua o cruzamento de ideias através dos ensinamentos da civilização do país que contemplava as
e de História, de imaginário e realidade. suas afinidades eletivas: o Japão”.
Torna-se difícil compreender o que Moraes encontrou numa civi- O orador frisou que “o povo de Tokushima reconheceu a sua
lização tão diferente da sua, que fez mudar os seus padrões cultu- dimensão universalista, adotando-o no seu quotidiano: os seus
textos são estudados pelos alunos da escola primária, a sua
memória está preservada no museu que lhe foi erigido e o seu
espírito é longamente evocado, numa sentida cerimónia que tem
lugar, anualmente, a 1 de julho, o dia em que faleceu. Wenceslau
de Moraes não está imortalizado apenas naquela cidade: Kobe
levantou-lhe uma estátua e a Biblioteca Nacional de Tóquio, o
Museu Municipal de Kobe e a Universidade de Quioto possuem
um espólio considerável seu – cartas, fotografias, objetos pessoais
e edições japonesas raras”.
Terminou, citando Wenceslau de Moraes, que evocou os momen-
tos de exaltação vivenciados neste país da seguinte forma:
«Cheguei ao Japão. Amei-o em transportes de delírio; bebi-o como
se bebe um néctar.»
Colaboração da ACADEMIA DE MARINHA
AGOSTO 2017 23