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REVISTA DA ARMADA | 540
SAÚDE PARA TODOS 65
DOENÇA DE MÉNIÈRE
Descrita em 1861 pela primeira vez, pelo francês Prosper Ménière, a doença de Ménière caracteriza-se por episódios recorrentes de
vertigem, acufenos (zumbidos), hipoacusia (perda auditiva) e desconforto no ouvido (sensação de pressão auricular). As crises apa-
recem normalmente de forma súbita e podem durar de alguns minutos a várias horas. É considerada uma doença crónica do ouvido
interno e não tem, atualmente, cura .
EPIDEMIOLOGIA terão uma crise pois estas podem ser precedidas de uma aura, ou
seja, surgem previamente à crise alguns sintomas (variáveis con-
A doença de Ménière afeta cerca de 0,3-0.5% da população e pode forme o doente, mas constantes num mesmo sujeito).
surgir em qualquer idade, apesar de ser mais frequente em adultos Nas fases mais tardias da doença, a hipoacusia torna-se perma-
entre 40 - 60 anos de idade. Atinge ambos os sexos, com discreto nente, os acufenos tornam-se mais fortes e o desequilíbrio pode
predomínio no sexo feminino. Indivíduos de raça caucasiana são os interferir com a própria marcha. Estes sintomas são mais problemá-
mais afetados e cerca de 10% dos casos têm predominância familiar. ticos em locais com baixa luminosidade, com a fadiga ou quando
CAUSA existem estímulos visuais muito intensos.
A causa desta doença ainda não é totalmente compreendida. Acre- DIAGNÓSTICO
dita-se que estejam envolvidos no seu aparecimento quer fatores O diagnóstico desta doença é de exclusão. Baseia-se na clínica
genéticos, quer fatores autoimunes, quer fatores que o doente apresenta, no exame objetivo realizado durante a
ambientais (tais como infeções virais, trauma- consulta médica, bem como na documentação da
tismos, consumo de álcool). Sabe-se que na perda auditiva por audimetria. Pode haver
doença de Ménière existe um aumento anor- necessidade de recorrer a outros exames
mal do volume de endolinfa, daí que esta complementares de diagnóstico (os mais
doença seja também designada por hidrop- frequentes são análises sanguíneas e res-
sia endolinfática. A endolinfa é o líquido trans- sonância magnética com contraste).
parente contido no labirinto membranoso do TRATAMENTO
ouvido interno que é responsável pelas noções
de movimento do corpo e manutenção do equi- Até ao momento não existe cura para a
líbrio. Ora, se existe um excesso de endolinfa doença de Ménière. Contudo, existem tra-
isto resulta num aumento da pressão dentro DR tamentos disponíveis que ajudam a lidar
do labirinto, com consequente distensão das suas com os sintomas e a reduzir a frequência
paredes. Pensa-se que, por este motivo, os sinais auditivos e a gravidade de cada crise aguda. Inicial-
enviados do ouvido para o cérebro se tornem imprecisos e, como mente é crucial haver alteração do estilo de vida, reduzindo o stress,
resultado, surjam os sintomas da doença. aumentando as horas de sono, praticando exercício físico regular e
APRESENTAÇÃO CLÍNICA fazendo uma dieta equilibrada com redução do consumo de álcool,
cafeína e sal. A terapia medicamentosa em situações de crise passa
A doença de Ménière é uma doença crónica na qual se podem por anti-eméticos, anti-histamínicos e ansiolíticos. No intervalo das
distinguir duas fases: as crises e os intervalos livres entre estas. As crises podem ser prescritos diuréticos, corticoides orais ou a beta-
primeiras correspondem a episódios vertiginosos de instalação histina. Quando a doença obriga os doentes a fazer alterações à sua
súbita, acompanhados de acufenos, hipoacusia e sensação de pres- vida diária, a sua saúde mental pode estar afetada, tornando-se o
são auricular. Geralmente só um dos ouvidos é que é afetado, pelo acompanhamento psicológico recomendado. Estas medidas per-
menos nos episódios iniciais. Ao longo do tempo, os dois ouvidos mitem o controlo da doença em mais de 60% dos casos. Aos res-
podem ficar afetados (cerca de 30% dos casos). Podem haver outros tantes doentes pode ser oferecida terapia de reabilitação vestibular
sintomas acompanhantes, tais como náuseas, vómitos, hipersensi- (programa de exercícios para reduzir os sintomas de desequilíbrio e
bilidade aos sons, mal-estar, ansiedade, cefaleia, visão turva, suo- tontura), terapia com dispositivo Meniett (um aparelho que aplica
res frios, palpitações, tremores. As crises podem ser extremamente uma pressão positiva no ouvido médio para melhorar o intercâm-
incapacitantes, interferindo com as atividades normais da vida diá- bio de fluidos no labirinto) ou medidas mais invasivas como injeções
ria. Uma crise aguda pode durar de 20 minutos a 24 horas e no final intratimpânicas de corticoides (anti-inflamatórios) ou gentamicina
de cada ataque segue-se sempre um período de fadiga extrema que (labirintectomia química). Casos graves podem necessitar de cirur-
obriga a longas horas de sono reparador. Estas crises podem repetir- gia para descomprimir o labirinto membranoso, remover o labirinto
-se várias vezes por semana ou com intervalos espaçados de meses (labirintectomia) ou para secionar o nervo vestibular (neurectomia
ou anos. Os intervalos caracterizam-se por ausência de vertigens e vestibular). Doentes com perda permanente da audição são candi-
por uma estabilização das outras queixas. datos a utilizar próteses auditivas.
Não se conhece o motivo pelos quais as crises são despoletadas
contudo os sintomas tendem a ser desencadeados por situações Ana Cristina Pratas
como o stress, excesso de trabalho, fadiga, variações de pressão e 1TEN MN
excesso de sal. Os doentes conseguem muitas vezes pressentir que www.facebook.com/participanosaudeparatodos
MAIO 2019 31