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REVISTA DA ARMADA | 546

               O empenhamento mais emblemáƟ co desta fase
              ocorreu nos Balcãs, com o envolvimento na con-
              tenção da crise resultante do desmembramento
              da ex-Jugoslávia. Esse empenhamento consubs-
              tanciou-se através da StabilizaƟ on Force (SFOR),
              que  Ɵ nha por missão pôr  fi m  às  hosƟ lidades,
              consolidar a paz e contribuir para um ambiente
              seguro no território da Bósnia-Herzegovina.
               Esse envolvimento na ex-Jugoslávia teve tam-
              bém uma componente naval, com a consecução
              da operação  SHARP GUARD, de imposição da
              paz, de embargo total à Sérvia e Montenegro, e
              de embargo parcial (equipamento militar e arma-
              mento) aos restantes países da ex-Jugoslávia.

              NATO 3.0 (2001 A 2014)
               Entretanto, o ataque de 11 de setembro de
              2001 nos EUA assinalou a transição para a NATO
              3.0, com o envolvimento na longa guerra contra
              o terrorismo. Na sequência desse atentado terrorista, a NATO invo-  tabilidade no fl anco sul da Aliança. Isso correspondeu à transição da
              cou, pela primeira e única vez na sua história, o arƟ go 5.° do Tratado   NATO empenhada para uma NATO preparada ou – voltando à gíria
              de Washington, que estabelece que um ataque contra um aliado é   informáƟ ca – da NATO 3.0 para a NATO 4.0, com a defesa coleƟ va
              um ataque contra todos.                             a regressar ao centro das preocupações da Aliança. Uma das medi-
               Isso levou a NATO, logo no fi nal de 2001, a envolver-se diretamente   das mais reveladoras deste novo período é a dos “quatro trintas”,
              no Afeganistão, que era um santuário para a Al Qaeda, responsável   que preconiza que a NATO tenha, até 2020, 30 navios de guerra, 30
              pelo referido ataque terrorista. Esse envolvimento consubstanciou-  batalhões mecanizados de infantaria e 30 esquadrões de aviões de
              -se na InternaƟ onal Security Assistance Force (ISAF) (força que viria   combate disponíveis para operações , com uma pronƟ dão de 30 dias.
              a ser desaƟ vada apenas no fi nal de 2014, dando lugar à Resolute   Os empenhamentos mais representaƟ vos desta fase têm-se enqua-
              Support Mission). Este foi o empenhamento mais marcante deste   drado nas designadas medidas de tranquilização (assurance measu-
              período, que pode ser designado como o da  NATO empenhada,   res, em língua inglesa), implementadas com o objeƟ vo de demons-
              devido ao envolvimento, não só no Afeganistão, mas também no Ira-  trar a coesão da Aliança e de tranquilizar os Aliados mais expostos à
              que (NATO Training Mission – Iraq), no mar Mediterrâneo (operação   postura asserƟ va da Rússia.
              ACTIVE ENDEAVOUR) e no oceano Índico (operações anƟ -pirataria).   No domínio maríƟ mo, tem-se assisƟ do a uma tentaƟ va de revigo-
               Em termos de fi liação, consolidou-se nesta fase o alargamento a   ração das forças navais permanentes, cujo empenhamento em ope-
              leste, com a adesão de Bulgária, Eslováquia, Eslovénia, Estónia, Letó-  rações de longa duração e de baixa intensidade (como a operação
              nia, Lituânia e Roménia, em 2004, a que se seguiram a Albânia e a   ACTIVE ENDEAVOUR e as operações anƟ pirataria) comprometeu a
              Croácia, em 2009.                                   sua capacidade de reação imediata e de emprego em cenários de
               No ambiente maríƟ mo, esta fase também fi cou marcada por diver-  alta intensidade.
              sas operações ditas “reais”, que se iniciaram em fi nais de 2001 com a
              operação DIRECT ENDEAVOUR no mar Mediterrâneo, prontamente   CONSIDERAÇÕES FINAIS
              renomeada como ACTIVE ENDEAVOUR. Essa operação visou contro-  Estas quatro fases disƟ ntas da história da Aliança AtlânƟ ca atestam
              lar as principais rotas oceânicas no senƟ do de prevenir atentados ter-  bem a capacidade de adaptação da organização, que se foi trans-
              roristas, tráfi co de armamento e proliferação de armas de destruição   formando em função das evoluções geopolíƟ cas, resisƟ ndo sempre
              maciça no ambiente maríƟ mo. Importa referir que esta foi a única   aos problemas por que foi passando, como a crise do Suez em 1956
              operação naval lançada pela NATO ao abrigo do já referido arƟ go 5.°   (em que os EUA desautorizaram a França e o Reino Unido), a crise
              do seu tratado fundador.                            de Chipre de 1963-64 (que levou a extremar posições entre a Grécia
               Este período foi ainda caracterizado, no domínio maríƟ mo, pela   e a Turquia), a saída da França da estrutura militar em 1966 ou as
              decisão da NATO no senƟ do de (em resposta a um pedido da ONU)   divergências em relação à Guerra do Iraque em 2003. Não obstante
              se envolver em operações anƟ -pirataria na área do Corno de África   essas discordâncias, a realidade é que a NATO se foi reinventando,
              e da bacia da Somália, a parƟ r de 2008 – envolvimento que se pro-  conseguindo uma longevidade que não é comum em organizações
              longou até 2016.                                    de defesa coleƟ va. EfeƟ vamente, um estudo de 2010 do think-tank
                                                                  norte-americano Brookings InsƟ tuƟ on idenƟ fi cou 63 alianças mili-
              NATO 4.0 (2014 ATÉ HOJE)                            tares de relevo nos úlƟ mos 5 séculos. Em média, tais organizações
               O ano de 2014 assinalou a entrada numa nova fase, devido a três   apenas duraram cerca de 15 anos, sendo que apenas 10 delas aƟ ngi-
              factos relevantes e interligados. Em primeiro lugar, a ocupação da   ram mais de 40 anos. Neste quadro, o facto da NATO ter conseguido
              Crimeia pela Rússia, no primeiro trimestre desse ano, que não pode   chegar aos 70 anos consƟ tui uma evidência da sua resiliência e da sua
              ser dissociada da ocupação da Abecásia e da OsséƟ a do Sul, na   capacidade para se adaptar às circunstâncias, que fazem dela a mais
              Geórgia, em 2008. Em segundo lugar, o compromisso assumido na   bem-sucedida aliança políƟ co-militar da História, agregando mais de
              Cimeira de Gales, em setembro de 2014, no senƟ do de os aliados   900 milhões de pessoas, de 29 nações (desde a adesão do Montene-
              aumentarem o invesƟ mento na defesa para 2% do PIB, no prazo de   gro em 2017), responsáveis por cerca de metade do PIB mundial e
              10 anos. E, fi nalmente, o termo da missão da ISAF no Afeganistão,   aproximadamente 55% do invesƟ mento global em defesa.
              em 31 de dezembro de 2014, que assinalou a mudança de foco da
              Aliança AtlânƟ ca das operações para a pronƟ dão, visando responder,                      Sardinha Monteiro
              não só ao expansionismo Russo, como também ao aumento da ins-                                      CMG


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