Page 25 - Revista da Armada
P. 25
REVISTA DA ARMADA | 574
a Nossa Senhora da Nazaré, nomeadamente em Belém do Pará, A Marinha Portuguesa é o ramo naval das Forças Armadas
que é, inclusivamente, a maior manifestação da fé católica na que se integra na administração direta do Estado através do
América do Sul. Numa iniciativa conjunta da Câmara Municipal da Ministério da Defesa Nacional. Do ponto de vista histórico e
Nazaré e do Governo do Estado do Pará, encontra-se em curso, comprovado pela documentação, é a mais antiga Marinha do
junto da UNESCO, a candidatura do culto da Virgem da Nazaré mundo. Formalmente, cumpriu 705 anos em 2022, muito embora
a Património Imaterial da Humanidade, que a 14 de novembro a sua génese e feitos remontem à fundação da nacionalidade.
de 2018 foi apresentado ao Papa Francisco, em Roma, tendo De acordo com o estipulado no artigo n.º 40 da respetiva Lei
merecido o melhor acolhimento do Santo Padre. Paralelamente Orgânica, a Marinha Portuguesa tem brasão de armas, bandeiras
à visita de algumas rainhas devotas no século XVI, também o heráldicas, divisa e hino, além de dia festivo para consagração da
padre jesuíta S. Francisco Xavier (1506-1552), conhecido como sua memória histórica. Complementarmente, conta com outros
o “Apóstolo do Oriente”, terá cumprido a sua peregrinação ao símbolos igualmente relevantes, como a divisa consignada às
Santuário da Nazaré, antes de partir para Goa em 1541. unidades navais, o grito de guerra, a marcha, o patrono, a Cruz
A história da imagem da Virgem da Nazaré foi pela primeira vez de Cristo e o seu ex-libris. Reconhecidos pelos portugueses, os
publicada em 1609 pelo cronista-mor do reino, Frei Bernardo símbolos da Marinha Portuguesa são elementos cruciais para a
de Brito (1569-1617), na obra Monarchia Lusytana. Venerada coesão e espírito de corpo entre os militares, militarizados e civis
há séculos, o culto de Nossa Senhora da Nazaré é uma das mais que nela servem.
antigas manifestações de devoção mariana em Portugal. Ligado
de forma indissociável ao milagre da Nazaré, que evitou a morte BRASÃO DE ARMAS
prematura do primeiro almirante português, e durante séculos Consagrados no respetivo normativo herál-
conferiu proteção às atividades marítimas dos portugueses, dico, a cor e o metal da Marinha Portuguesa
a Virgem Maria é a padroeira da Marinha Portuguesa. Sendo são, respetivamente, o azul e a prata. O azul
a Ave Maris Stella padroeira dos navegantes e dos homens do simboliza o zelo, a lealdade e a boa reputa-
mar, nas comunidades piscatórias e póvoas marítimas da costa ção, e a prata expressa a integridade, a firme-
portuguesa a devoção popular consagrou, ao longo dos séculos za e a obediência. Integrado no Regulamento
e sob várias designações – e.g. Nossa Senhora da Nazaré, Nossa de Heráldica da Armada, o brasão de armas
Senhora dos Navegantes, Nossa Senhora da Guia, Nossa Senhora foi aprovado pela Portaria n.º 722/72, de 14
do Mar, Nossa Senhora do Cabo ou Santa Maria da Pedra de Mua, de dezembro, do Ministro da Marinha, Vice-
Nossa Senhora das Candeias, Nossa Senhora da Boa Viagem, -almirante Pereira Crespo (1911-1980).
Nossa Senhora da Esperança ou da Boa Esperança, etc. – diversos De azul com um golfinho de prata. É desta forma prosaica que
rituais em sua homenagem e ofertas votivas. De índole piedosa, a é feita a leitura heráldica do escudo da Marinha Portuguesa, que
oferta votiva é conhecida como ex-voto suscepto (voto realizado), encimado pelo coronel naval confere corpo ao respetivo brasão
abreviadamente ex-voto, denominação atribuída à dádiva que o de armas. Sobreposto ao conjunto surge um primeiro listel com o
fiel oferece à entidade sagrada, simbolizando a consagração, a grito de guerra “São Jorge” e sotoposto um segundo com a divisa
renovação ou o agradecimento pela promessa atendida. Na sua “Talant de Bien Faire”, ambos de prata.
essência, os ex-votos são obras de arte de cariz popular.
GRITO DE GUERRA
“São Jorge” era o grito de guerra que começou a ser usado
Muito embora se encontre pelos portugueses no reinado de D. João I (1357-1433). Além de
integrada na estrutura da invocar a proteção daquele santo nos combates, a alteração teve
Autoridade Marítima Nacional, o propósito de os distinguir dos castelhanos, na medida em que
em 2013, aquando da ordenação até então todos os reis cristãos na península Ibérica tinham como
do brasão de armas da Capitania grito de guerra comum – “Santiago” – patrono da luta contra
do Porto da Nazaré, o Gabinete os sarracenos. Não obstante, no século XVI os portugueses já
de Heráldica Naval incorporou haviam retomado o grito de guerra primevo. Pela forte conotação
no respetivo escudo os principais simbólica com o sentimento de independência nacional, “São
elementos alusivos ao milagre que Jorge” seria o grito de guerra adotado pela heráldica da Marinha
salvou D. Fuas Roupinho, que por Portuguesa, aquando da sua criação em 1972.
afinidade também se encontram no escudo do Comando
Local da Polícia Marítima da Nazaré. DIVISAS
A divisa da Marinha Portuguesa é, desde 1894, o célebre
Descrição heráldica – Escudo de ouro com rosa de azul
com centro e sépalas de prata, posta em chefe com duas “Talant de Bien Faire”, lema do Infante D. Henrique (1394-1460)
âncoras de vermelho nos flancos. Ponta de negro carregada e seu patrono. Por iniciativa do rei D. Carlos I (1863-1908), a 5 de
com um massacre de veado de prata. julho de 1894, por ocasião das comemorações dos 500 anos do
nascimento do Infante D. Henrique, o Conselho do Almirantado
Simbologia – O campo de ouro simboliza a fé, a firmeza e mandava publicar em Ordem da Armada:
o poder. A rosa alude à Rosa Mística, sinónimo da Virgem, «Considerando do maior interesse moral que a marinha
que providencialmente salvou o primeiro almirante da de guerra portugueza tenha sempre ante os olhos uma
Marinha Portuguesa. A ponta de negro representa a falésia legenda breve e incisiva, que lhe estimule os brios e avive
onde o milagre impediu D. Fuas Roupinho de se precipitar as recordações de um passado glorioso, impondo-se pela
quando perseguia o veado, figurado no respetivo massacre sua alta significação histórica ao respeito de nacionais
de prata. Além de atributo do almirantado e símbolo de e estrangeiros; Reconhecendo-se que nenhuma outra
constância, firmeza e segurança, as âncoras sublinham a corresponde a esse carácter sugestivo e tradicional melhor
ligação ao mar e à Autoridade Marítima Nacional. do que a divisa adoptada pelo Infante D. Henrique, iniciador
da nossa brilhante epopêa; Sua Majestade El-Rei, desejando
JUNHO 2022 25