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REVISTA DA ARMADA | 574

           Muito  justamente,  é  o  patrono  da  Escola  Naval  e  do  NRP   guarnições,  extravasou  a  estrema  institucional  e  ascendeu  de
          Sagres, assim como figura de proa do seu principal navio-escola   per se a símbolo de Portugal. É a unidade mais condecorada da
          e ex-libris. Por conseguinte, muito embora não exista qualquer   Marinha Portuguesa e o único navio que ostenta condecorações
          diploma legal ou determinação superior expressa nesse sentido,   estrangeiras  no  respetivo  estandarte  nacional.  Em  virtude  de
          o Infante D. Henrique é o patrono da Marinha Portuguesa.   exaltar o nosso passado glorioso de nação marítima e percursora
                                                              da  globalização,  o  NRP  Sagres  ocupa  um  lugar  particular  no
                                                              imaginário  dos  portugueses.  Trata-se,  em  suma,  de  um  navio
                                                              intemporal que está muito para além da nossa singela existência,
                                                              um navio que é uma lenda viva e alimenta o nosso imaginário
                                                              coletivo, um navio que pelo seu simbolismo a todos transcende
                                                              enquanto portugueses.









         Foto SMOR Almeida de Carvalho











          CRUZ DE CRISTO
                           A Cruz de Cristo era o símbolo da Ordem
                         Militar  homónima,  fundada  em  1317  por
                         D.  Dinis  (1261-1325).  Herdeira  dos  bens
                         da  Ordem  dos  Templários,  formalmente
                         abolida pelo Papa Clemente V (1305-1314)
                         em  1312,  prosseguiu  o  combate  contra  os
                         mouros.  Através  da  bula  Ad ea exquibus,
                         a  14  de  março  de  1319  o  Papa  João  XXII
          (1316-1334)  instituía  formalmente  a  Ordem  dos  Cavaleiros  de
          Nosso Senhor Jesus Cristo, vulgo Ordem de Cristo, atribuindo-lhe
          a regra de S. Bento. Um século mais tarde, a 25 de maio de 1420,                                       Foto CFR António Gonçalves
          o Infante D. Henrique era nomeado seu «regedor e governador»,
          com o propósito de ampliar a sua influência política e religiosa,
          e, ao mesmo tempo, viabilizar as viagens de descobrimento e a
          expansão marítima protagonizada por Portugal. Em resultado da
          sua reiterada utilização nas velas dos navios portugueses durante   Pela  reiterada  e  incondicional  ação  ao  serviço  de  Portugal
          séculos, assim como na fuselagem da aviação naval (1914-1952),   e  dos  portugueses  desde  os  primórdios  da  nacionalidade,  a
          retomada nos atuais helicópteros orgânicos em 1993, a Cruz de   Marinha  Portuguesa  revelou-se  historicamente  determinante,
          Cristo  é  manifestamente  um  símbolo  da  Marinha  Portuguesa,   socialmente estruturante e culturalmente relevante, legado que
          constituindo o principal elemento distintivo do NRP Sagres e seu   inspira todos os que nela têm a honra e o privilégio de servir.
          ex-libris. Tal como sucedia no anterior, a Cruz de Cristo também
          está patente no atual logotipo da Marinha Portuguesa.  «Nós  somos,  na  verdade,  os  da  Marinha.  Aqueles  que  têm
                                                              o privilégio  de passar  noites infernais sob  tormentas, sem um
          EX-LIBRIS                                           queixume  e, sobretudo,  sem  que  ninguém pense  que pode ser
           A ascensão do NRP Sagres a ex-libris da Marinha Portuguesa   pago em moedas tão imaterial sacrifício. Aqueles que dia-a-dia
          constituiu um processo paulatino e insofismável, não existindo   aprendem  a lealmente  lutar com mares  e  ventos; que  podem,
          nenhuma outra Marinha no mundo que disponha de um navio   em toda a sua magnitude, sentir a dureza e fragilidade da vida;
          que  congregue  em  si  tamanho  simbolismo  nacional.    O  nome   que preferem ao conforto o risco, a miséria ao luxo, a honra ao
          encerra  na  sua  raiz  etimológica  uma  forte  conotação  com  o   dinheiro. Nada nos devem os senhores da terra. Gozamos destes
          caráter  sagrado  daquele  mítico  local,  em  virtude  de  os  restos   estranhos prazeres que a eles são vedados, agradecidos à nossa
                                                              boa estrela que nos fez marinheiros.»
          mortais de São Vicente aí próximo terem repousado, antes de
          D. Afonso Henriques os mandar trasladar para Lisboa, em 1173.                         CTEN Sarmento Rodrigues
           Em 2022, o navio cumpre 85 anos e seis décadas ao serviço
          de Portugal. Enquanto cadetes, todos os oficiais presentemente
          no  ativo  efetuaram,  pelo  menos,  uma  viagem  a  bordo  deste
          lendário navio. Graças à perseverança dos mais altos decisores da                        António Gonçalves
          Marinha Portuguesa, aliada à abnegação e entrega das respetivas                                    CFR


                                                                                                    JUNHO 2022  27
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