Page 366 - Revista da Armada
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Voz da Abi~ :a
CARTAS AO DIRECTOR tolices, mas náo pode deixar de ter percebendo a manobra. ferrou com o
cavalheirismo e generosidade. Nuno no «livro», Mais tarde foi cha-
Não desejaria que se pense que mado ao imediato, que lhe perguntou
Dos nossos leitores e amigos
pretendo corrigir o comandante Cris- a razão da sua falta. Um tanto atra-
recebemos a seguinte correspon-
tóvão Moreira, e se o parece, disso palhado.oNunoexplicou:
dência:
me desculpo, mas penso que lhe es- - Senhor imediato, como não
Do cap.-m.-g. RF Basilio Alber- tou a dar uma notfcia que desconhe- sei nada de inglês, andei toda a noite
to de Sousa Pinto, Foz do Douro, cia e que gostará de saber. à procura do cais ...
uma carta da qual extraímos:
- Pois bem - sentenciou o ime-
( .. .) Acabo de receber o número o diato -, visto isso, e para te não vol-
de Setembro, e só para mostrar o tares a perder, não sais mais de bor-
gosto que teria em colaborar na Re- Do sarg.-aj. T RA Soares PI- do enquanto estiveres em Inglaterra.
vista se tivesse alguma coisa que va- Passados dois dias houve um
menta, Vila Franca de Xira, uma
lesse a pena mandar, mando hoje só grande baile em terra e a guarnição
carta em que exprime, de uma forma
uma pequena nota para tentar fazer do «Tejo» foi convidada para ele -
poética e romântica, toda a grande
justiça a alguém que julgo merecê-Ia. oficiais, sargentos e praças. Escusa-
saudade da sua vida de 37 anos de
No último período do artigo que Marinha. do será dizer que só ficou a bordo o
se refere a Eduardo Noronha, diz o pessoal de serviço ... eocão!
comandante Cristóvão Moreira ao ci- Como é tradicional na Navy, a
tar duas passagens do livro «José do o meia-noite soou o hino inglês e o bai-
Telhado em África», do referido au- le acabou. Com uma to/erancia de
tor, que «são páginas em que o autor Do sarg.-chefe H Marques Gue- poucos minutos, para apanharmos
junta à história a fantasia, e onde a des, Lisboa, uma carta evocando a embarcação das DO.ao noras, que
lenda de generoso cavalheirismo do episódios vividos numa viagem a In- era a última, todos correram para o
bandoleiro se estende aos marinhei- glaterra, fazendo parte da força na- cais. Todos ... menos eu e dois cama-
ros ... " val que levou àquele país, em visita radas que gentilmente fomos acom-
E se não fosse mesmo «fanta- oficial, o Presidente da República, panhar a casa as três raparigas com
sia" ou «lenda .. ?! marechal Craveiro Lopes, no ano df quem tínhamos andado no baile.
Há muitos anos já, no inferior de 1955. _ Depois de as termos deixado é
Angola, mais ou menos na latitude O Presidente e respectivo séqui- que nos lembrámos do caso do Nuno
de Luanda e não muito longe das ca- to iam embarcados na aviso de ' .• e do que lhe tinha aêontecido! Então
taratas do Duque de Bragança - se classe .. Bartolomeu Dias», o qual tentámos que a embarcação fizesse
estes locais ainda conservam estes era escoltado pelos contratorpedei- um favorzinho e, numa viagem extra,
nomes! - havia uma povoação que ros «Tejo», .. Lima .. e .. Vouga'" nos levasse a bordo. Pois sim, não
pelo nome naoperca -chamava-se Entre as várias coisas que conta, houve gestos que comovessem o
Chiçal- aonde encontrei o túmulo destacamos o seguinte: patrão, que acabou pordesembarcar
do José do Telhado. Como é sabido, quando há licen- para que nós odeixássemos em paz.
Era uma capelinha muito bem fei- ças, os primeiros a sair de bordo são Como estava frio resolvemos dar
ta e conservada, isolada no mato, e os enjoados e os ... apaixonados. No uma volta pelas ruas desertas, cir-
com uma lápide dizendo quem ali re- caso vertente, o primeiro a desem- cundantes ao cais. A certa altura,
pousava, e afirmando que a capeli- barcar do «Tejo» foi um segundo· surgiu ao longe um vulto que em lar-
nha tinha sido construída pelos bran- -grumete-o Nuno. gas passadas se dirigia a nós, gritan-
cos e pretos da região em homena- A última embarcação de regres- do em inglês: «sai/ors ... please ... »
gem ao corajoso. honrado e bondoso so das licenças era às aa.ao horas. Quando já estava próximo de
Josêdo Telhado! O Nuno não apareceu. Mas, no dia nós, reconhecen.Jo a nossa farda,
Já não me lembro ao certo dos seguinte, quando a embarcação fOI chamou: Hei, marujos, esperem ar ...
lermos da homenagem, mas sei que buscar o pão, manhã cedo, trouxe Quem havia de nos sair na rifa?!
denotavam claramente que durante também o Nuno. O patrão, querendo O nosso imediato! Ficámos varados
os muitos anos em que viveu em An- safar-lhe a rascada, em lugar de e já estávamos a prever o mesmo
gola, o cavalheirismo e a generosi- atracar no portaló, onde se encontra- castigo do Nuno, ou pior ... Disse- I
dade do bandoleiro não eram lenda va o sargento de dia, tentou faz{J-lo mos-lhe que nem valia a pena tentar
nem fantasia! na escada de quebra-costas, jun,to . a embarcação, porque já nem estava '
De resto, quem mereceu ganhar da qual, por azar do Nuno, estava o ninguém a bordo. Em todo O caso, e
a Torre e Espada pode fazer muitas oficial de serviço. Claro que esle, por sugestão do imediato, embarcá-
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